Quando  estamos aprendendo a conhecer sobre o rock progressivo, assim como  aprendemos o be-a-bá, ouvimos falar sempre de cinco bandas básicas: Pink  Floyd, Yes, King Crimson, ELP e Genesis. Cada uma possuía  características distintas entre si, mas, porém, a sonoridade levou-os a  serem reconhecidos como os principais divulgadores deste estilo de som.  Claro, Van Der Graaf Generator, Gentle Giant, Soft Machine, Gong,  Tangerine Dream, entre outros, também foram importantes para o  progressivo, mas o quinteto acima foi o que conseguiu conquistar mais  fãs ao redor do mundo.
E  tratando-se apenas do Genesis, é impossível negar que esse nome ficou  claro à sociedade graças às fantasias de Peter Gabriel (voz, flautas), o  estilo inconfundível de Steve Hackett (guitarras, violões de seis  cordas), o talento de Tony Banks (teclados, violões de doze cordas) e a  cozinha poderosa de Mike Rutherford (baixo, violões de doze cordas) e  Phil Collins (bateria, voz), que lançaram os fabulosos álbuns Nursery Cryme (1971), Foxtrot (1972), Live (1973), Selling England by the Pound (1973) e The Lamb Lies Down on Broadway (1974). Com a saída de Gabriel em 1975, o Genesis teve sua fase quarteto, lançando os ótimos A Trick of the Tail (1976) e Wind & Wuthering (1977), bem como o ao vivo Seconds Out  (também de 1977); e, sem Hackett, então eles eram três lotando estádios  com hits como "Invisible Touch", "I Can't Dance", "Mama" e "Home by the  Sea", sempre capitaneados pelos vocais de Phil Collins e acompanhados  por Dayel Stuermer (guitarras) e Chester Thompson (bateria).
Porém, antes de Collins ser o mega-milionário de hoje e símbolo do auge comercial geneseniano, a banda era uma college band de destaque no cenário britânico, com uma sonoridade bem diferente daquela que os tornou conhecidos.
A  gênese do Genesis começa na escola de Charterhouse. Lá, ainda no ano de  1963, Peter e Tony ingressaram para cursar o segundo grau (ensino  médio). Em 1964 chegava à escola Mike, e em 1965, Anthony Philips  (guitarras, violões de seis e doze cordas). Como toda gurizada  adolescente, o som rolava direto nas casas e garagens da região e,  assim, surgiu a Anon, formada por Anthony, Mike, Rob Tyrrel (bateria),  Richard McPhail (voz) e Rivers Job (baixo), e a Garden Wall, com  Gabriel, Tony e Chris Stewart (bateria). Em 1966, Job e McPhail saíram  da escola, deixando a Anon somente como trio, o que culminou com o  encerramento da banda. Anthony passou a integrar a Garden Wall, a qual  já vinha fazendo algumas apresentações mais impactantes pela região,  sendo que em uma delas, com Job tocando baixo, Gabriel atirou pétalas de  rosas ao público.
Vale  ressaltar que todos os garotos provinham de lares típicos da burguesia  britânica, com hábitos bem diferentes dos demais, sendo que Tony estudou  piano clássico desde pequeno. Com o fim da Anon, Mike e Anthony  começaram a pensar em um novo projeto, com o qual contavam com a  colaboração de Tony. Porém faltava vocalista, e daí Gabriel apareceu na  jogada, graças à insistência de Tony. Muitos reviews que li falam sobre  Gabriel ter entrado na banda como baterista, mas segundo o box Archive 1967-75 (1998), ele realmente foi convidado para ser o vocalista. 
Banda  formada, hora de juntar grana e começar a gravar. Várias composições  surgiram, entre elas as raras "Listen on 5", "Don't Wash Your Back",  "Patricia" e "Try a Little Sadness". Assim, gravaram uma fita que chegou  às mãos de Jonathan King, o qual era um conhecido dos tempos da  Charterhouse e que trabalhava para o presidente da Decca Records (a  mesma dos Stones). King ajudou os garotos no processo de desenvolvimento  das canções, influenciando bastante, principalmente na inclusão de  orquestrações e no trabalho das linhas vocais, já que King adorava o Bee  Gees (da época, diga-se de passagem). 

Assim,  conseguiram um contrato com a Decca, lançando seu primeiro compacto,  com "The Silent Sun" e "That's Me", no dia 22 de fevereiro de 1968. Um  fato no mínimo curioso ocorreu no momento da assinatura dos papéis. Como  eram menores, foi necessário a autorização dos pais para a realização  de tal assinatura. Porém, o contrato proposto pela Decca era de quatro  anos, o que levou os pais de Gabriel, Tony, Anthony e Mike à loucura, já  que eles queriam ver seus filhos formados e não músicos. Mesmo assim,  toparam assinar um contrato de um ano com direito a renovação para mais  um. Stewart foi o batera da sessão de gravação deste compacto,  comprovando que Gabriel realmente era só o vocal. O nome Genesis também  foi obra de King, já que ele queria mostrar ao público que algo novo  estava entrando no mercado.

Em  10 de maio de 1968 lançam seu segundo compacto, com "A Winter's Tale" e  "One Eyed Hound", mas, com a fraca divulgação, ambos não venderam nada.  A essas alturas, Tony estava cursando Física na Universidade de Essex e  Gabriel estava estudando para passar no teste da Escola de Cinema de  Londres. Porém, a gana por tocar de Mike e Anthony os convenceram a  ficar mais um tempo, além do fato de King ter aberto as portas da Decca  para a produção do primeiro LP, o qual começou a ser gravado em julho de  1968, já contando com o novo baterista, John Silver. Porém, durante a  mixagem do álbum, descobriu-se que existia um outro Genesis nos Estados  Unidos. Mike e Gabriel pensaram em Revelation, mas também já existia.  Então, lançaram o álbum como From Genesis to Revelation, o qual trazia no encarte a justificativa: "agora somos um grupo sem nome, mas temos um disco e queremos distribuí-los a vocês, com ou sem nome". Bons tempos aqueles em que as bandas tentavam se comunicar com os fãs.

Temos  um álbum muito diferente do que viríamos a conhecer nos posteriores,  com uma temática religiosa  fortemente empregada, contando com letras  muito místicas, as quais falavam sobre a aurora do homem e de sua  evolução, sempre através do ponto de vista bíblico. De cara, a faixa  "Where the Sour Turns to Sweet" traz o piano e a voz de Gabriel  acompanhados por estalos de dedos e violões. A canção segue com piano e  violões construindo a base para o desenrolar da letra, contando ainda  com participações de cordas, coral feito pela banda e intervenções de  metais. 
"In  the Beginning" começa com uma barulheira, seguida pelo baixo e bateria  no melhor estilo Animals. Os violões acompanham o vocal de Gabriel em  uma das canções mais agitadas e legais do álbum. Na sequência, os pianos  introduzem a bela "Fireside Song", a qual segue com o acompanhamento de  cordas e violões. "The Serpent" traz em sua introdução parte do tema  que apareceria posteriormente em "Twilight Alehouse" (bônus do LP Nursery Cryme),  e segue a linha das canções anteriores, contando com muitos violões,  teclados, coral e intervenções de guitarra.  "Am I Very Wrong?" e "In  the Wilderness" encerram o lado A mantendo o clima leve do álbum, com a  participação do piano, dos violões e orquestrações.
O  lado B começa com "The Conqueror", na mesma linha do lado A. Destaque  para as vocalizações e também para o mellotron. A curta "In Hiding",  somente com violões, teclados e vocais, além de intervenções  orquestrais, dá sequência ao álbum junto a "One Day", cheia de cordas,  metais e violões. O piano introduzindo "Window" traz mais uma bela  canção, com os metais e os violões acompanhando a letra, a qual já conta  com as vocalizações que iriam aparecer nos futuros álbuns da banda. "In  Limbo" mantém a linha de "The Conqueror", porém com um final bem  diferente das demais canções do disco, com Anthony mandando ver na  guitarra, enquanto "Silent Sun", a única contando com Chris Stewart na  bateria, retoma as baladas com orquestras e violões. Finalmente, "A  Place to Call My Own" encerra o álbum com os vocais sobre a linha de  piano, terminando com passagens orquestrais esse bom álbum de estréia.
From Genesis to Revelation  foi lançado com uma capa preta com o título em letra tipografica gótica  escrita em dourado. Desta forma, era catalogado em lojas de música nas  seções religiosas, sendo muito difícil de ser encontrado, com as suas  vendas iniciais alcançando somente 600 cópias. Aqui no Brasil o disco  não foi lançado em sua versão original, mas existem no mínimo dois  relançamentos, "In the Beginning" e "Where the Sour Turns to Sweet" que,  além das treze faixas originais, trazem diversas outras composições da  fase inicial da banda.
Mesmo  com o fracasso comercial a banda já estava contagiada, e decidiram  seguir carreira, com Tony largando os estudos para se dedicar  exclusivamente à música. Silver partiu dessa para uma melhor, retornando  aos estudos e sendo substituído pelo batera John Mayhew, o qual entrou  na banda graças ao periódico Melody Maker. Além disso, McPhail reapareceu nas redondezas, e decidiu empresariar o grupo.
Em  março de 1970 começava a surgir uma das grandes gravadoras do cenário  inglês, a Charisma Records, a qual possuía como chefão o carismático  Tony Stratton Smith. Através de amigos, o assistente pessoal de Smith,  John Anthony, que foi responsável pela contratação do Van Der Graaf  Generator pela gravadora, resolveu conferir o trabalho dos garotos e se  encantou. A Decca tentou em vão negociar mais um contrato de renovação,  mas já era tarde. Assim como os Beatles e o embrião do King Crimson, o  Giles, Giles & Fripp, a Decca via uma potência de vendas ir por água  abaixo.

Rapidamente a banda entrou em estúdio e em julho de 1970 era lançado o álbum Trespass,  que já mostrava que o Genesis estava realmente preocupado com o que  iria chegar ao público, trazendo um trabalho com faixas mais longas e  arranjos bem mais elaborados. O disco abre com a bela "Looking for  Someone", com Gabriel cantando muito. Cada instrumento é apresentado  devagar, começando pelos teclados e baixo, culminando com a bateria  quebrando tudo. O ritmo lento da canção, com Anthony fazendo suas  intervenções, dá espaço para uma sessão instrumental bem viajante, onde a  guitarra e o teclado duelam ferozmente, com a cozinha mandando ver. A  flauta de Gabriel se faz presente, deixando a canção novamente lenta. A  letra é retomada, porém dando uma nova cara para a música, que segue  mostrando toda o aprendizado da banda, com vários duelos de teclado e  bateria e a constante presença da flauta. 
O  LP segue com "White Mountain", onde os teclados dão espaço para os  violões dedilhados de doze e seis cordas entoarem uma linda melodia, que  segue somente pelos violões, que fazem a base com a bateria  acompanhando a canção, enquanto Peter Gabriel canta a emotiva letra. O  refrão lembra as faixas do primeiro álbum, porém os teclados já  apresentam uma sonoridade bem mais elaborada. Temos um pequeno tema  instrumental, com a participação de Gabriel nas flautas. A letra é  retomada, seguida de um acompanhamento mais lento para a mesma. Destaque  aqui para os diversos instrumentos que surgem, como flautas e  guitarras, que fazem pequenas intervenções. A canção termina com o  teclado executando alguns acordes enquanto temos o assovio de um  cidadão, com um coral cantando sobre camadas de teclados e violões. 
O  lado A encerra com "Visions of Angels", outra linda canção que começa  somente ao piano. O belo trabalho de baixo e guitarra, com o  acompanhamento suave da bateria, traz os vocais de Gabriel, que segue  uma linha bem parecida com as músicas de From Genesis to Revelation, porém contando com mais uma bela sessão instrumental, cheia de flautas e mellotrons. 
A  belíssima "Stagnation" abre o lado B. Novamente os violões trazem a  letra da canção, que possui um acompanhamento suave do teclado. O piano  marca presença, dando espaço para um solo de teclado bem viajante.  Anthony e Mike estavam soberbos na execução dos violões e o tema  instrumental mostra como o Genesis havia esquecido o período college  e encarava realmente o trabalho como fonte de produção. O ritmo da  canção ganha velocidade, abrindo espaço para o órgão solar, agora  contando com o acompanhamento de baixo e bateria. Uma flauta interrompe a  sessão, trazendo um novo clima, com mellotron e violão acompanhando a  letra. Mais uma bela sessão de violão e voz dá sequência para o  encerramento da faixa, que traz um belo tema de flauta, acompanhado pelo  final da letra. Com certeza essa é uma das grandes canções da banda, e  para quem gosta de "Musical Box", por exemplo, será uma ótima  sobremesa. 
"Dusk"  mantém a sessão acústica. Os violões dedilham para Gabriel cantar quase  que agonizando. O refrão traz os vocais de Anthony, Tony e Mike,  acompanhados por teclados. A segunda parte da letra começa agora com os  teclados acompanhando os violões, seguida pelo refrão. Gabriel executa  um pequeno solo de flauta, com a música ganhando uma cadência mais  agitada. Mas o que chama a atenção mesmo é o belo trabalho de violões  construído por Mike e Anthony, o que viria a influenciar bastante na  escolha do substituto de Anthony. 
Por  fim, os teclados introdutórios de "The Knife" dão espaço para uma  canção bem pesada e diferente das demais músicas do álbum. As guitarras  se fazem presente, com Gabriel cantando uma letra super difícil em uma  melodia mais complicada ainda. A velocidade da canção aumenta, com a  bateria de Mayhew a todo vapor, enquanto Philips executa riff em cima de  riff. O ritmo cavalgar da canção segue durante quase quatro minutos,  mudando completamente, agora com baixo e bateria marcando o tempo para  teclado e guitarra viajarem, enquanto a flauta se faz presente com um  pequeno solo. A guitarra sola novamente, terminando a faixa com uma  sequência pesadíssima da banda, onde o teclado sola sobre uma camada de  riffs iguais executados por baixo, bateria e guitarra, e Gabriel  entoando as últimas palavras desta ótima faixa. Um último destaque para Trespass está na belíssima capa elaborada por Paul Whitehead, mostrando que o Genesis havia se modificado, e muito.

Mayhew  foi despedido pela banda por causa de sua forte depêndencia musical, ou  melhor, pouca técnica mesmo, enquanto que Philips pediu o boné por que  estava desiludido com a vida de guitarrista, preferindo seguir seus  estudos de música clássica e orquestra, que o levou anos depois a lançar  os belos álbuns The Geese & the Ghost (1977) e Wise After the Event  (1978). Então, os demais integrantes colocaram diversos anúncios atrás  de um novo baterista e de um novo guitarrista. Aí apareceram Phil  Collins e Mick Bernard, sendo que o último não durou muito e foi  substituído por Steve Hackett, dando então origem a mais clássica  formação da banda.

Ainda sem Phil Collins, o grupo lançou o bom álbum Calling All Stations  no ano de 1997, contando com Ray Wilson (ex-Stiltskin, Guaranteed Pure)  que trouxe novamente o nome do Genesis ao mercado, principalmente na  Europa, onde o disco vendeu bastante, mas que foi malhado justamente por  não ter aquele que é um dos personagens principais na carreira desta  grande banda inglesa.

Recentemente, Collins voltou, ao lado de Mike, Tony, Daryel e Chester, fazendo uma turnê com direito até ao lançamento de DVD (When in Rome 2007).  Porém, pouco se sabe sobre o que vai ser da banda e se ainda vai ser  lançado material inédito ou promissor como o contido em seus dois  primeiros álbuns.
 


 
 












