Mostrando postagens com marcador O Terço. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador O Terço. Mostrar todas as postagens

domingo, 7 de setembro de 2025

Maravilhas Do Mundo Prog: O Terço - Suíte (1982)


Trago aqui, em homenagem ao sete de setembro, uma Maravilha Prog de uma das maiores bandas brasileiras de todos os tempos, O Terço. Retomando a história, o grupo Terço em 1976 lança Casa Encantada, após um período em um sítio no interior de São Paulo, na "casa encantada" que deu nome ao álbum. Porém, a formação deste disco não avança, já que o vocalista e tecladista Flávio Venturini decide ir gravar junto de Beto Guedes, enquanto Cesar de Mercês retorna definitivamente para o Terço (Cesar havia participado dos dois primeiros discos da banda), e junto com ele apresenta o novo tecladista, Sérgio Kaffa.

O compacto "Amigos"/"Barco de Pedra"

A estreia da nova formação, agora como quinteto (além de Cesar e Kaffa temos Sergio Hinds na guitarra e vocais, Sergio Magrão no baixo e vocais, e Luiz Moreno na bateria e vocais) ocorre no compacto “Amigos”/”Barco de Pedra” e também do álbum Mudança de Tempo, lançado em 1978. Contendo músicas instrumentais e belos arranjos, esse disco completa uma trilogia essencial em qualquer armário de colecionador, destacando o clássico "Gente do Interior", com um lindo arranjo orquestral de Rogério Duprat, "Terças e Quintas", que lembra bastante as canções progressivas de bandas como Gentle Giant e PFM, principalmente pelo trabalho de piano feito por Kaffa, com bastante marcações e viradas, a fantástica faixa-título, com dois temas e momentos muito distintos, o primeiro carregado pelo baixo pesadíssimo de Magrão e violões, e o segundo mais ameno, privilegiando solos de violão, piano elétrico e guitarra, a jazzística "Descolada" e a complexa "Hoje É Domingo", que encerra com chave de ouro esse grande disco.

Anúncio do lançamento de Mudança de Tempo, na revista Pop

É neste álbum que surge o logotipo que caracteriza a a banda nos anos oitenta e noventa, e que foi criado por Guernot. A capa do álbum também teve duas versões, assim como Criaturas da Noite; uma com o logotipo sobre um fundo azul, e outra com o grupo olhando por uma janela, sendo que a primeira é muito rara. Na divulgação de Mudança de Tempo, O Terço fez os seus primeiros shows internacionais, no chamado Concerto Latinoamericano de Rock. Foram três no Brasil (São Paulo, Campinas e Belo Horizonte) e dois na Argentina (em Buenos Aires, no Luna Park, e em Rosário), sempre acompanhados pela banda Crucis, que vem a ganhar uma homenagem no futuro álbum do O Terço, chamado Time Travellers (1993), com a faixa “Crucis”.

Problemas com a gravadora e também a sensível mudança na sonoridade acabaram abalando as estruturas da banda, bem como um grave acidente com Hinds, que o impossibilitou de continuar a tocar por um bom tempo, sendo substituído para completar a turnê de divulgação do álbum por Ivo de Carvalho. Ao fim da turnê, ainda em 1978, O Terço anunciava seu término. Luiz Moreno montou a banda Original Orquestra e participou do álbum de Elis Regina Ao Vivo, de 1979. Sérgio Magrão fundou, ao lado de Flávio Venturini, Cláudio Venturini, Vermelho e Hely Rodrigues, o super grupo 14 Bis, que estourou no Brasil com sucessos como "Caçador de Mim", "Todo Azul do Mar", e as versões fantásticas para "Canção da América" e "Nos Bailes da Vida", de Milton Nascimento, enquanto Hinds seguiu em carreira solo.

As duas capas de Mudança de Tempo

Mas em 1982, com Hinds, Ruriá Duprat (teclados), Zé Português (baixo) e Franklin Paolillo (bateria), O Terço volta às suas atividades, e em 1983 lança Som Mais Puro. O disco foge dos padrões progressivo que fizeram d'O Terço uma das maiores bandas do estilo no país durante os anos 70, mas resgate com propriedade “Suíte”, Maravilhosa faixa instrumental dos tempos de Venturini. Ela começa com o riff de guitarra de Hinds e o piano elétrico de Duprat, trazendo então as batidas de bateria, a marcação do baixo e os sintetizadores repetindo o riff de Hinds. Então, a guitarra despeja seu solo sobre um andamento percussivo e quebrado. Uma breve pausa leva ao piano elétrico, seguido pelo bonito solo de guitarra de Hinds, no qual ele usa o botão de volume para criar belos efeitos, até que guitarra e piano repetem o mesmo tema por alguns momentos, levando a um magistral solo de Hinds. Ao fundo, o baixão estoura as caixas de som, com um andamento peculiarmente encantador da bateria e dos sintetizadores. Lindo trecho!

Guitarra, bateria e baixo fazem marcações pesadas, que nos remetem a "1974", enquanto o piano martela forte ao fundo, passando por um solo mais virtuoso de Hinds, que vai crescendo com a entrada do órgão e do andamento de Paolillo. Então, mais uma breve pausa modifica a canção novamente. Enquanto Hinds sola explorando novamente o pedal de volume e longas notas, bateria, piano e baixo dão um show de marcações e passagens marcadas igualmente, que encaminham nossa Maravilha para sua segunda metade. Agora o andamento é festivo, comandando pelo piano e pelo baixo. A guitarra faz leves notas, e embala a canção para uma sequência de batidas que trazem o solo de sintetizadores (imitando um trompete) feito por Duprat, sobre um ritmo percussivo, São várias mudanças no tempo da canção, extremamente complexa, para chegarmos a reta final dessa joia com longos acordes do órgão elétrico, acompanhado apenas pelo piano. As tradicionais vocalizações que marcam tanto a carreira do grupo se fazendo presentes, e então, temos o último solo de Hinds, com um espetáculo de Paolillo na bateria, fechando os 10 minutos e 20 segundos de "Suíte" com o riff da guitarra sendo cantarolado em sua memória. Sensacional!

Ruriá Duprat e Sergio Hinds (acima).
Zé Português e Franklin Paolillo (abaixo). O Terço em 1982

As demais faixas soam bem oitentista, focando na MPB de"Asa Delta", e trazendo a colaboração de Cantuária em "Coração Cantador", "Linda Imagem" e "Nunca Duvidar", bem como o emocionante reencontro, depois de 10 anos, entre Cantuária, Hinds e Jorge Amidem (a primeira formação do grupo, ainda como O Têrço) em "Tambores da Mente", mesmo que seja somente como compositores, nesta que é outra boa faixa de Som Mais Puro.  Destaque também para "Viajante Relógio", com um belo trabalho de teclados e sintetizadores por Duprat, e a viajante "Luzes", magnífica faixa instrumental de mais de sete minutos de duração que também pode ser considerada uma Maravilha Prog, com um espetáculo a parte de Hinds usando o botão de volume na guitarra sobre camadas de teclados e intervenções de baixo e percussão durante a primeira metade da canção, e um fervilhante show santaniano na segunda metade, na qual a cozinha Paolillo/Português comanda o ritmo para Hinds e Duprat brilharem em seus solos, e tendo incluso breves solos também de Paolillo e Português. Baita faixa!

Depois de Som Mais Puro, o grupo seguiu com diversas mudanças de formação, chegando a fazer os shows de abertura do Asia e do Marillion quando os mesmos passaram por aqui ao mesmo tempo em que lançaram O Terço (1990), o já citado Time Travellers (1993), Compositores (1996), Spiral Words (1998) e Tributo a Raul Seixas (1999), além do ao vivo Live at Palace (1994). Em 2001, A formação clássica – Sérgio, Venturini, Mercês, Magrão e Moreno – se reuniu para participar de um show de Venturini. Foi o pontapé inicial para uma reunião, que começou a tomar forma rapidamente. Porém, devido a uma parada cardíaca, Moreno veio a falecer em 2003, adiando o retorno por mais algum tempo.

Sérgio Hinds, Sérgio Mello, Sérgio Magrão e Flávio Venturini, em 2012

Em 2005 O Terço voltou a ativa com Hinds, Venturini, Magrão e Sérgio Mello substituindo Moreno, feito registrado no CD/DVD Ao Vivo, onde o grupo tocou, entre outras, “1974″, “Tributo ao Sorriso” e “Criaturas da Noite”, e também teve a participação especial do talentoso Marcus Vianna (Saecula Saeculorum, Sagrado Coração da Terra). Venturini retornou para sua carreira solo, até que em 2015, surpreendem com o lançamento, via crowfunding, do CD 45 Anos de Estrada - Ao Vivo, e do DVD O Terço 3D, no qual a banda - agora com Hinds, Mello, Magrão e Fred Barley na bateria - inova mais uma vez, com uma apresentação trazendo efeitos tridimensionais para quem assiste em casa, e tendo, entre suas quinze canções, nada mais nada menos que "1974" e "Suíte", esta finalmente gravada por Venturini, e numa versão mais completa que a de Som Mais Puro, atingindo os 16 minutos de duração). O DVD é marcante também pelas participações especiais de Cesar de Mercês e de Vinicíus Cantuária, e foi lançado como forma de comemorar os então 45 anos da banda.

Em 2021, foi lançado o livro 50 Anos, escrito em parceria entre Nélio Rodrigues e Hinds, trazendo muitas histórias sobre a banda e também - inovando mais uma vez - cinco imagens em realidade aumentada. Da formação que gravou os principais discos da banda nos anos 70, Hinds segue em carreira solo, fazendo shows regularmente. Venturini lançou em 2020 Paisagens Sonoras Vol. 1, e desde então, deu uma sumida dos holofotes, assim como Magrão. O presente da banda é de lembrança apenas na memória dos fãs, e a esperança de que um dia, possam voltar aos palcos para mais uma vez arrebatar o coração dos fãs com lindas Maravilhas Progs e tantos sucessos que o grupo gravou.

quarta-feira, 16 de setembro de 2015

DVD: O Terço - O Terço 3D [2015]







O sistema crowfunding tem se tornado uma das boas opções para artistas e ONGs lançarem projetos, conseguindo recursos através de financiamento praticamente privado em troca de material inédito adquirido em primeira mão, ou ainda, edições limitadas de um determinado produto, dando vida a ideias, sonhos e projetos. Claro que o Financiamento Coletivo não é utilizado apenas para música, mas como esse é o foco do nosso site, hoje trago aqui um material que adquiri por esse sistema. Trata-se  do DVD O Terço 3D, lançado pelo grupo O Terço em julho desse ano. No caso, adquiri um belo pacote com CD + DVD + Blu-Ray + 2 Camisetas + Palheta exclusiva + 2 ingressos para show por um excelente preço, via promoção lançada no site Kickante, e que valeu muito a pena. Mas aqui vou me concentrar apenas no lindo DVD.
A oferta adquirida por esse que vos escreve

Comemorando em 2015 quarenta e cinco anos de carreira, sempre liderado pelo guitarrista e vocalista Sergio Hinds, O Terço mais uma vez inova em sua carreira, já marcado pelas inovações musicais nos anos 70, com a criação dos instrumentos Tritarra (uma guitarra de três braços tocada pelo guitarrista Jorge Amiden) e o Violoncelo Elétrico, bem como um palco extremamente bem desenvolvido, nos moldes dos padrões internacionais de bandas como Yes e Pink Floyd, desta feita O Terço traz como novidade uma mídia com a apresentação do quarteto em estúdio, cercada por visualizações em 3D que tornam tudo ainda mais atraente.

Obviamente que a utilização de um óculos 3D é fundamental para as sensações de ver Sérgio Hinds, Flávio Venturini (teclados, violões e voz), Sérgio Magrão (baixo, violões e voz) e Fred Barley (bateria, voz) dentro de sua sala, mas mesmo quem assiste sem os óculos fica encantado pela perfeição das imagens que brotam do televisor.


Flávio Venturini, Sergio Hinds e Sérgio Magrão, sob os efeitos 3D de "1974"

Conforme citado acima, essa formação é praticamente a formação que consagrou a banda em 1975 no lançamento do aclamado Criaturas da Noite, com exceção do baterista Fred Barley, um novato músico que com muita competência ocupa o lugar do ídolo Luiz Moreno (falecido em 2008), e é este álbum que predomina no track list do DVD, já que seis das oito canções do disco estão presentes no DVD, que começa com duas delas, as clássicas "Hey Amigo" e "Criaturas da Noite" (quer jeito melhor de começar um DVD d'O Terço do que com esses dois sonzaços?), intercaladas pela revisão de "Tributo ao Sorriso", uma das primeiras canções da banda a fazer sucesso, no caso no Festival Internacional da Canção de 1971, e que aqui aparece na versão mais conhecida, apresenta no CD e DVD O Terço Ao Vivo (2006), ganhando um belo solo de moog.

Além da parte visual, altamente atrativa, a parte musical também traz surpresas, começando pela presença do violonista e vocalista Cézar de Mercês logo de cara, na citada "Hey Amigo". Nome importante em diversos momentos do grupo na década de 70, principalmente na construção das letras e melodias dos três principais álbuns da banda - o já citado Criaturas da Noite, Casa Encantada (1976) e Mudança de Tempo (1978) - , Cézar aparece como o quinto membro em diversos momentos, seja comandando a voz principal da versão bluesy de "Flor de La Noche", seja na linda sequência acústica, onde o quinteto manda ver com versões inspiradas para "Foi Quando Eu Vi Aquela Lua Passar", "Jogo das Pedras", "Queimada", "Pássaro", . Essa parte da apresentação é para ser guardada a sete chaves na mente do fã, já que além das versões estarem afiadas, ver Venturini tocando violão não é tão comum.


O Terço acústico: Sérgio Hinds, Sérgio Magrão, Fred Barley, Cézar de Mercês e Flávio Venturini

As vocalizações marcantes durante toda a carreira do quarteto surgem com força na pesada "Cabala", nas já citadas "Foi Quando Eu Vi Aquela Lua Passar" e "Queimada", e no refrão de "P. S. Apareça", do desconhecido Compositores (1996), e a sutileza instrumental da banda revela-se na perfeita "Ponto Final", talvez a melhor criação que o baterista Luiz Moreno deixou para a posteridade.

Outro grande momento para os fãs é o registro completo, pela primeira vez, da linda "Suíte". Essa pérola da discografia d'O Terço foi registrada no álbum Som Mais Puro, de 1982, sendo regravada posteriormente no álbum Time Travellers (1992), mas apenas com menos da metade de sua versão original, já que naquela ocasião, seu criador, Venturini, não fazia mais parte da banda.  Em Time Travellers ainda por cima, ela aparece com uma letra em inglês, que também não constava originalmente.


Mais efeitos 3D em "Suíte"

Eis que com a oportunidade de registrar o DVD, o grupo trouxe as partituras originais de "Suíte" - originalmente batizada de "Projeto Sinfônico" - para tema de casa, e assim, os fãs podem conferir os mais de dezesseis minutos de uma canção simplesmente embasbacante e viciante, que irá fazer voltar o DVD para conferir os detalhes 3D da mesma, já que de primeira, a canção é tão fascinante que nem conseguimos perceber toda a potência das viajantes imagens de galáxias e nebulosas que saltam da TV. A diferença para o registro de 1982 é que a canção ganhou um belíssimo trecho com teclados e vocalizações, similar ao apresentado em "1974", e viajantes passagens de guitarra. Para quem assistiu ao já citado DVD O Terço Ao Vivo, naquela apresentação  - em comemoração aos 35 anos da banda - temos como convidado o líder do Sagrado Coração da Terra, o violinista Marcus Vianna, que deu uma sonoridade diferente para o som, além também da participação Ruriá Duprat nos teclados e sintetizadores, adicionando modernidade para a faixaa. Aqui em O Terço 3D é apenas o quarteto, mandando ver com a partitura original setentista, sem inserir nenhum outro instrumento e arrancando arrepios dos fãs.

Mais imagens em 3D aparecem na outra grande suíte registrada no DVD, a Maravilha Prog "1974", também apresentada na íntegra e em uma versão com diferenças mínimas ao original. A única diferença é o solo de Venturini no meio da canção, que aqui foi substituído por acordes de piano e sintetizador, mas que não prejudicam o conjunto da obra dessa que certamente forte concorrente a uma das melhores canções do rock progressivo nacional. Criaturas da noite surgem em 3D na faixa que leva esse nome, e uma casa encantada é construída na faixa de mesmo nome, a qual apresenta Sérgio Hinds ao violão.


O complexo vocal d'O Terço abrilhanta o DVD

Por vezes, prestando-se muita atenção, parece que a edição do DVD cometeu algumas falhas, como por exemplo uma sequência de acordes no órgão de Venturini sendo executado em "Criaturas da Noite", enquanto a imagem mostra ele apenas fazendo alguns acordes no piano, ou quando ele pula de um teclado para outro mas não há nenhuma mudança no som em "Suíte", bem como alguns "pratos fantasmas" que são batidos enquanto Fred apenas toca sua caixa, só que esses são detalhes ínfimos perto da grandeza da obra.

Nos extras, O Terço 3D apresenta uma série de entrevistas com o quarteto, além de Vinícius Cantuária e Cézar de Mercês, contando a história do grupo desde seu início até o lançamento de Mudança de Tempo, ou seja, abrangendo o período de maior consagração da banda, complementado por imagens raras e inéditas. Entre declarações de amor ao grupo feitas por Venturini e Magrão - ambos possuem uma carreira paralela, com Venturini seguindo solo e Magrão liderando o 14 Bis - algumas histórias são impagáveis, como por exemplo a de uma apresentação do grupo realizada em um Ginásio de Santa Catarina - só vendo! 
Vinícius Cantuária nos extras do DVD

Uma pena que não temos vídeos de apresentações da década de 70, o que seria um adicional extremamente bem-vindo, já que é impossível encontrarmos alguns registros em vídeo d'O Terço nessa época.

Track list

1. Hey Amigo
2. Tributo Ao Sorriso
3. Criaturas da Noite
4. Flor de la Noche
5. 1974
6. Cabala
7. Casa Encantada
8. Foi Quando Eu Vi Aquela Lua Passar
9. Jogo das Pedras
10. Queimada
11. Pássaro
12. Suíte
13. PS: Apareça
14. Antes do Sol Chegar
15. Ponto Final

segunda-feira, 6 de outubro de 2014

Review Exclusivo: Sérgio Hinds Apresenta "O Terço Lado B" (Rio de Janeiro, 02 de outubro de 2014)



Reviver o passado é um sonho que muitos jovens gostariam de realizar, principalmente os admiradores do rock setentista nacional. Afinal, qual fã de nossa cena brasilis que não viaja com um reencontro do trio Mutantes (Sérgio Dias, Arnaldo Baptista e Rita Lee), ou então, reviver os momentos tropicalistas do final dos anos 60, quiçá o auge da carreira de Raul Seixas, entoando as Leis de Thelema em seus alucinantes shows da fase Gita em 1974.

Pois acredito que os cerca de quatrocentos presentes no Teatro Rival Petrobrás na última quinta-feira, 02 de outubro, na cidade do Rio de Janeiro, sentiram uma nostalgia inimaginável quando Sergio Hinds subiu no palco carioca acompanhado de Ronaldo Rodrigues (teclados, Arcpelago, Massahara, Módulo 1000), Silvio Izy (baixo, vocais) e Fred Barley (bateria, vocais) para apresentar o espetáculo Sérgio Hinds Apresenta "O Terço Lado B", que um dia antes, havia sido realizado no palco do Teatro Bradesco, em Belo Horizonte.

Sérgio Hinds

O objetivo do espetáculo, como o próprio nome diz, é apresentar as canções menos conhecidas da carreira do O Terço, um dos principais grupos do rock progressivo brasileiro, com uma trinca de discos essenciais lançados entre 1975 e 1978 (Criaturas da Noite - 1975, Casa Encantada - 1976, e Mudança de Tempo - 1978), nos quais, comandados por Hinds e pelo parceiro Flávio Venturini, levaram o grupo a ser eleito o melhor grupo do rock brasileiro de 1975, a frente de gigantes como Mutantes e O Som Nosso de Cada Dia.

Porém, a carreira do grupo havia começado em 1970, com um disco tão cobiçado quanto raro, O Têrço, misturando elementos do rock com folk, e  1973, deu grandes passos para o progressivo com o excepcional Terço, trazendo a épica e Maravilhosa suíte "Amanhecer Total" ocupando todo o lado B de um vinil que hoje acabou praticamente esquecido tanto pelos fãs que surgiram pós Criaturas da Noite quanto aos que conheceram a banda somente nos anos 80.

Um brinde à Jorge Amiden

Foi exatamente de Terço que saiu o primeiro lado B a ser apresentado pelo quarteto, a pesadíssima "Deus", que colocou o Rival para cantar, e depois de um brinde promocional da cerveja O Terço, que está no mercado há menos de um ano, tivemos uma linda homenagem ao primeiro guitarrista do grupo, Jorge Amiden, recentemente falecido, através de "Tributo ao Sorriso", canção que ficou mais conhecida recentemente pelo DVD O Terço Ao Vivo (2005), mas que foi composta em 1970 para a participação do grupo no V Festival Internacional da Canção, ocorrido naquele ano.

Então, Sérgio comentou sobre o objetivo do espetáculo, de quão difícil foi lembrar de algumas canções, principalmente uma música longa quanto a que eles iriam apresentar agora, a suíte "Amanhecer Total". Se havia algum barulho na plateia, ele prontamente foi cessado para receber atenciosamente os dezoito minutos mais inimagináveis de um fã d'O Terço, com a Maravilhosa suíte interpretada com suas cinco partes, com grande destaque para a surpreendente e bela interpretação de Barley, fazendo as vozes agudas com precisão, e claro, para todo o quarteto, repassando as intrincadas partes da suíte com muito feeling e atenção. Se houve falhas, somente perfeccionistas notaram, e mais incrível ainda foi saber que o quarteto havia ensaiado apenas uma vez para poder tocar a mesma.

Fred, Sérgio e Silvio, em “Gente do Interior”

Aplausos ensandecidos fizeram o Rival tremer após "Amanhecer Total", e não precisaria o grupo seguir para ter garantido o valor do ingresso, só que haviam se passado apenas meia hora de espetáculo, e Sergio Hinds tinha muito mais para presentear os fãs, que segundo ele, são o principal motivo para a banda estar ali. Em um momento mais intimista, sentados em cadeiras Silvio e Sergio, e com a percussão de Barley, fazem uma bonita versão de "Gente do Interior" (Mudança do Tempo), sem a presença de Ronaldo, que retornou para colocar a primeira canção Lado A d'O Terço nos ouvidos dos fãs, e consequentemente a segunda Maravilha da noite, a suíte "1974".

Com Barley novamente surpreendendo nos vocais, "1974" (Criaturas da Noite) levou alguns presentes às lágrimas, mostrando como a música é capaz de tocar a alma de um ouvinte. Ronaldo também foi um grande destaque com as passagens viajantes de seus teclados soando como se fossem há 40 (como o tempo passa e não percebemos) anos atrás, e o baixão de Silvio duelando com a guitarra de Sérgio foi impressionante, mas o melhor foi soltar a voz com as vocalizações clássicas de "1974", aplaudidíssima em pé por todo o teatro, e ainda, louvada por um dos presentes como "uma música que nos faz ter orgulho do rock brasileiro". Dava para sentir a emoção correr pelo sangue de todo mundo, principalmente de Sérgio, que sorria como uma criança. Foi o segundo grande momento da noite.

Ronaldo Rodrigues

Atendendo a pedidos, "Adormeceu" foi resgatada do obscuro compacto duplo lançado pelo grupo em 1971, época em que construíram os exóticos instrumentos Tritarra e Violoncelo Elétrico, resgatado recentemente (2011) no CD Tributo ao Sorriso (junto com a canção que batiza o álbum e que já foi citada antes), seguida por outro grande Lado A d'O Terço, "Criaturas da Noite" (Criaturas da Noite), cantada em uníssono pelo teatro, e a elegante "Blues do Adeus" (Mudança do Tempo), onde Silvio pode soltar seu vozeirão.

Veio a instrumental "Crucis" (Time Travellers, 1992) e a comprovação de que os presentes no Rival estavam diante de uma das maiores revelações da bateria nacional. Afinal, o longo solo de Barley foi de colocar queixos no chão, tamanha a velocidade e técnica que o monstro de diversos braços apresentou. Além de cantar muito bem, o que ele fez no seu solo foi demais, arrancando aplausos espontaneamente, e mais ainda, fazendo o próprio Sérgio Hinds curvar-se para uma performance inesquecível.

Discos autografados por Sérgio (acima),
Palhetas, baqueta de Fred Barley e autógrafos de Fred e Silvio (abaixo)

O encerramento do show foi uma festa a parte, com a pegada "Lagoa das Lontras", que colocou O Terço novamente nos anos 70, em outra bela obscuridade de Terço, destacando os duelos de baixo e guitarra, seguida pela dançante "Luz de Vela", rockzão na linha Erasmo Carlos, única representante de Casa Encantada, com uma versão muito mais pesada do que a versão original, já que a ausência dos metais que estão no álbum de 1976 foi compensada pela vibrante voz de Silvio, e o espetáculo foi concluído com nada mais nada menos que o maior sucesso D'O Terço, "Hey Amigo", mais uma vez levantando a plateia, que após a banda despedir-se, continuou aplaudindo para trazer o grupo ao palco.

Alguns segundos foram suficiente para que Sergio, com um grande sorriso no rosto, agradece-se à todos, e como que um convite para o show não parar, mandou ver no petardo "Volte Na Próxima Semana" (Criaturas da Noite), inspiradora de tantas bandas do rock brasileiro nos anos 80, deixando o palco após quase duas horas de uma apresentação fantástica e marcante e partindo paro a os camarins.

Um bolha bolhando com Sérgio, Ronaldo e Fred

Pouco depois, Sérgio, Ronaldo, Fred e Silvio (esse só por alguns minutos) ainda deram mais um presente aos fãs que esperaram ao lado do palco, retirando fotos, autografando álbuns, livros e principalmente, jogando conversa fora como se fossem velhos amigos de todos.

Parabenizando ao pessoal da organização do espetáculo, principalmente Claudio Fonzi, o idealizador de todo o projeto, concluo dizendo que não há dúvidas quanto a grande sensação desse belíssimo show, já que não houve um fã saindo do Rival com um adjetivo diferente em sua mente que não fosse "Inesquecível", ou ainda a frase "Valeu a pena esperar" ressonando na cachola até a hora de dormir, se é que isso foi possível depois de tanta adrenalina saída dos palcos do Rival.

Set list, baqueta, folder promocional, palhetas e ingresso autografado por Ronaldo

Set list

1. Deus
2. Tributo ao Sorriso
3. Amanhecer Total
4. Gente do Interior
5. 1974
6. Adormeceu
7. Criaturas da Noite
8. Blues do Adeus
9. Crucis
10. Lagoa das Lontras
11. Luz de Vela
12. Hey Amigo

Bis

13. Volte Na Próxima Semana

quinta-feira, 24 de abril de 2014

Maravilhas do Mundo Prog: O Terço - Solaris [1976]


Depois de ter conquistado seu espaço como um dos principais nomes do rock nacional, o quarteto O Terço recebia a difícil tarefa de manter-se no topo. Com a concorrência acirrada do Mutantes de Sérgio Dias, Flávio Venturini (vocais, teclados), Sérgio Hinds (guitarra, vocais), Luiz Moreno (bateria, percussão, vocais) e Sérgio Magrão (baixo, vocais) precisavam ir além das inspirações britânicas, e a solução foi voltar às raízes do grupo, ou seja, adicionar as culturas nacionais ao rock 'n' roll setentistas.

As explorações de "Amanhecer Total" e "1974" eram perfeitas, e eram o caminho honesto, mas como todo grande empreendimento, audácia foi empregada pelo quarteto, e assim, em 1976, o grupo trancou-se em um sítio no interior de São Paulo, localizado no km 48 da BR 116, para gravar e compor as novas canções. O local foi apelidado de Casa Encantada, devido a alta energia emanada por lá, e foi esse apelido que batizou o quarto álbum do quarteto, mais um clássico do rock nacional.

Anúncio do lançamento de
Casa Encantada na revista Pop, em 1976
Nele, temos de tudo um pouco. Logo no início, surpreendem cantando em espanhol o sucesso "Flor de la Noche",  tendo a participação do percussionista Zé Eduardo e vocais de Moreno, em um belíssimo jazz rock que é seguido pelo rock empolgado de "Luz das Velas", também cantado por Moreno e recheado com naipe de metais comandado por Rogério Duprat.

"Guitarras" lembra canções da Mahavishnu Orchestra, com Hinds demolindo o instrumento que dá nome à canção, mas surpreendendo com a inclusão de instrumentos típicos do samba, no caso o agogô e a cuíca, ambos tocados por Zé Eduardo, e que assaltam a canção entre as viajantes escalas do moog e da guitarra, em um daqueles momentos mágicos que a história da música fornece aos seus apreciadores.

Os violões e as vozes de "Foi Quando Eu Vi Aquela Lua Passar" parecem ter saído dos álbuns do Secos & Molhados, mostrando a versatilidade que o quarteto gerou na Casa Encantada, e temos novamente o maestro Duprat na linda "Sentinela do Abismo", com destaque para a introdução medieval de Venturini ao piano e flautas tocadas por César de Mercês, ex-músico do O Terço. "Flor de La Noche II" encerra o lado A com a letra em português de "Flor de La Noche", em um ritmo bluesy.

A clássica faixa-título abre o lado B, e assim como "Criaturas da Noite", essa canção ficou marcada entre os fãs do O Terço principalmente pelo emocionante arranjo vocal construído por Venturini e Luiz Carlos Sá. Mercês participa na canção executando um animado solo de flauta, e a partir de então, O Terço desbanca de vez para o progressivo, com "Cabala", um épico construído por Venturini junto com Zé Geraldo - que também trabalhou nas orquestrações e tocou violão na mesma  - cheia de quebradas indecifráveis, os sintetizadores enigmáticos e sua letra citando bruxas, rituais e magia, chegando na Maravilhosa "Solaris".

Capa dupla interna de Casa Encantada

Essa curta faixa instrumental "Solaris", composta por Luiz Moreno, tem uma potência delirante mais forte que qualquer coquetel de LSD com cogumelos. Venturini surge dedilhando o piano acompanhado por leves acordes de violão, deixando o piano comandar os acordes que "aquecem" a canção com os solos individuais de moog e guitarra, feitos ao mesmo tempo.

A bateria de Moreno surge timidamente entre os solos, retornando ao dedilhado do piano e aos acordes de violão, agora com leves batidas nos pratos, para Magrão socar seu baixo e começar uma insana sessão na qual o moog nos leva por horizontes infinitos de galáxias desconhecidas, com a bateria de Moreno sendo o motor da nave que atravessa as estrelas, constelações, planetas e nebulosas em uma viagem assustadora.

Repentinamente, o piano surge dedilhando novamente, e acompanhado do moog, encerra a canção com um majestoso solo, mas o suficiente para deixar seu queixo caído pela sala.

Flávio Venturini, Luiz Moreno, Sérgio Hinds e Sérgio Magrão

"O Vôo da Fênix" é outra canção famosa deste álbum, mesclando novamente elementos do samba com o progressivo britânico e com um refrão tão conhecido como o número de dedos do Ex-presidente Luis Inácio Lula da Silva principalmente pela parte percurssiva de Zé Eduardo. Uma homenagem aos amigos Sá e Guarabyra encerra o álbum, com o velho folk rock dos tempos de O Têrço, em "Pássaro", outro grande sucesso do O Terço, contando com a participação de  Venturini no acordeão.

Após o lançamento de Casa Encantada, O Terço participou do do programa global Sábado Som. A banda fez uma média de 400 concertos entre os anos de 1975-1976, lotando teatros e eventos. Além dos festivais citados acima, vale a pena lembrar da homenagem que fizeram para os Beatles, junto com os Mutantes, em 1976.

Dois momentos do O Terço em 1976:
Sérgio Magrão,  Luiz Moreno, César de Mercês e Sérgio Hinds  (à esquerda);
Sérgio Hinds, Flávio Venturini, Sérgio Magrão e Luiz Moreno (à direita)

Novas músicas começavam a surgir, como "Raposa Velha" e "Suíte". Porém, Venturini decidiu sair e tentar a sorte ao lado de Beto Guedes. Mercês retornou definitivamente e junto com ele apresenta o novo tecladista, Sérgio Kaffa, que trabalhou muito na gravação do compacto "Amigos"/"Barco de Pedra" e também do álbum Mudança de Tempo, lançado em 1978.

Contendo músicas instrumentais e belos arranjos, esse disco completa uma trilogia essencial em qualquer armário de colecionador, destacando "Terças e Quintas", que lembra bastante as canções progressivas de bandas como Gentle Giant e PFM, com bastante marcações e viradas, "Mudança de Tempo", com dois temas e momentos muito distintos, e a jazzística "Descolada".
É neste álbum que surge o logotipo que caracterizaria a banda nos anos oitenta e noventa, e que foi criado por Guernot. A capa do álbum também teve duas versões, assim como Criaturas da Noite; uma com o logotipo sobre um fundo azul, e outra com o grupo olhando por uma janela, sendo que a primeira é muito rara.

As duas capas de Mudança de Tempo

Na divulgação de Mudança de Tempo, O Terço fez os seus primeiros shows internacionais, no chamado Concerto Latinoamericano de Rock. Foram três no Brasil (São Paulo, Campinas e Belo Horizonte) e dois na Argentina (em Buenos Aires, no Luna Park e em Rosário), sempre acompanhados pela banda Crucis, que iria ganhar uma homenagem no futuro álbum do O Terço, chamado Time Travellers (1993), com a faixa "Crucis".

Problemas com a gravadora e também a sensível mudança na sonoridade acabaram abalando as estruturas da banda, bem como o grave acidente de Hinds, que o impossibilitou de continuar a tocar por um bom tempo, sendo substituído para completar a turnê de divulgação do álbum por Ivo de Carvalho. Ao fim da turnê, ainda em 1978, O Terço anunciava seu término. Luiz Moreno montou a banda Original Orquestra e participou do álbum de Elis Regina Ao Vivo, de 1979. Sérgio Magrão fundou, ao lado de Flávio Venturini, Cláudio Venturini, Vermelho e Hely Rodrigues, o famoso conjunto 14 Bis, enquanto Hinds lançou seu primeiro álbum solo.

Anúncio do lançamento de Mudança de Tempo, na revista Pop

O Terço retornou em 1982, com Hinds, Ruriá Duprat (teclados), Zé Português (baixo) e Franklin Paolillo (bateria), lançando Som Mais Puro, com destaque para a faixa "Suíte", dos tempos de Venturini. O grupo seguiu com diversas mudanças de formação, lançando material regularmente e chegando a fazer os shows de abertura do Asia e do Marillion quando os mesmos passaram por aqui. Depois de Som Mais Puro, foram lançados O Terço (1990), o já citado Time Travellers (1993), Compositores (1996), Spiral Words (1998) e Tributo a Raul Seixas (1999), além do ao vivo Live at Palace (1994). 

Em 2001, A formação clássica - Sérgio, Venturini, Mercês, Magrão e Moreno - se reuniu para participar de um show de Venturini. Foi o pontapé inicial para uma reunião, que começou a tomar forma rapidamente. Porém, devido a uma parada cardíaca, Moreno veio a falecer em 2003, adiando o retorno por mais algum tempo.

Sérgio Hinds, Sérgio Mello, Sérgio Magrão e Flávio Venturini, em 2012

Em 2005 O Terço voltou a ativa com Hinds, Venturini, Magrão e Sérgio Mello substituindo Moreno, feito registrado no CD/DVD Ao Vivo, onde o grupo tocou, entre outras, "1974", "Tributo ao Sorriso" e "Criaturas da Noite", e também teve a participação especial do talentoso Marcus Vianna (Saecula Saeculorum, Sagrado Coração da Terra). Venturini retornou para sua carreira solo, mas O Terço continua fazendo shows, tendo a presença certa da Maravilha "1974", e por muitas vezes, a apresentação de "Solaris", comprovando o valor dessas duas Maravilhas criadas em terras brasilis. 

quinta-feira, 3 de abril de 2014

Maravilhas do Mundo Prog: O Terço - 1974 [1975]





Mutantes, Secos & Molhados e Novos Baianos são os nomes mais citados quando falamos de rock nacional dos anos setenta, lançando álbuns que hoje viraram artigos de luxo nos sebos espalhados pelo país e pelo mundo. Depois destes, temos ainda Bacamarte, Som Imaginário, Módulo 1000, Quintal de Clorofila, Som Nosso de Cada Dia, Recordando O Vale das Maçãs, entre outras bandas que, apesar de muitos de nós conhecermos, sabemos que lançaram poucos discos, ainda mais raros do que o trio acima citado.

Primeiro compacto do grupo
Um grupo que está nos limites de ser o principal nome do rock ou mais uma ótima obscuridade é o carioca O Terço. Suas origens estão no janeiro de 1968, quando os grupos Joint Stock Co. - formado por Vinícius Cantuária (bateria), Jorge Amiden (guitarra), Sérgio Magrão (baixo) e César de Mercês (guitarra) - e Hot Dogs, do qual o guitarrista Sérgio Hinds fazia parte, fundiam-se para dar origem ao conjunto Os Libertos, formado por Sérgio, Vinícius e Mercês, com o último tocando baixo. Em pouco tempo, Os Libertos passaram a se chamar Santíssima Trindade.

No início de 1970, Mercês foi substituído por Amiden, com Sérgio indo para o baixo e, assim, adotaram o nome de O Têrço, com acento circunflexo. Passam a ensaiar e se apresentar em diversos festivais Brasil afora, tais como o Festival de Juiz de Fora, onde ganharam o prêmio principal com a canção "Velhas Histórias", e o Festival Universitário do Rio de Janeiro, onde ficaram em segundo lugar com "Espaço Branco".

A estreia, ainda com o ^ no nome

O som folk rock dos garotos, com um vocal bem trabalhado, não demorou a chamar a atenção das gravadoras, dentre elas a Polygram, que colocou o trio para gravar em poucos dias, lançando ainda em 1970 o auto-intitulado álbum O Têrço. Nele, encontramos um disco fortemente influenciado por The Band e Buffalo Springfield, entre outros nomes do folk rock internacional, com destaque para faixas como "Plaxe Voador", "Velhas Histórias" e "Yes, I Do".

A banda chegou a causar certa polêmica com a capa do disco, onde aparecem sentados com calças jeans e descalços dentro de uma igreja, com um terço entre o trio. Em outubro de 1970, participam do V Festival Internacional da Canção, classificando "Tributo ao Sorriso" em terceiro lugar, e do espetáculo Aberto para Obras, no Teatro de Arena, ao lado do Módulo 1000 e outros artistas.

Compacto duplo de O Terço, trazendo cinco canções

Sérgio decidiu seguir carreira ao lado de Ivan Lins, abrindo espaço para a volta de Mercês. Porém, o tempo ao lado de Ivan foi curto, fazendo com que Sérgio retornasse para O Têrço, assumindo as guitarras e deixando o trio agora como um quarteto. De cara, lançaram um compacto duplo com as músicas "O Visitante", "Adormeceu", "Doze Avisos", "Meio Ouvinte" e "Teatro da Área Extraída da Suíte em Ré Maior (Bach)". Influenciados pelo rock progressivo britânico, consideram cada vez mais do experimentalismo em seus ensaios, e além disso, passam a construir seus instrumentos. É aqui que surge a famosa "Tritarra", uma guitarra de três braços que Amiden empunhava para executar as difíceis peças que a banda começava a criar, bem como o violoncelo elétrico que Sérgio tocava. Esse violoncelo pode ser ouvido, por exemplo, em "Doze Avisos". Os novos instrumentos foram apresentados ao público no VI Festival Internacional da Canção, em 1971, onde a música "O Visitante" alcançou o quarto lugar.

Sergio Hinds (violoncelo elétrico), Cézar de Mercês, Vinícius Cantuária e Jorge Amiden (Tritarra)

Após a participação no VI FIC, Amiden saiu. Para evitar problemas futuros, os remanescentes registraram o nome da banda, agora como Terço, sem acento, e seguem como um trio, enquanto Amiden montou a banda Karma, ao lado de Luiz Mendes Jr (violões) e Alen Terra (baixo). O Terço passou a acompanhar o cantor Marcos Valle, participando no fantástico álbum Vento Sul, com destaque para a esquisita canção "Democústico", culminando este projeto com a apresentação da banda ao lado de Valle no Festival do Midem, na cidade de Cannes, França.

A ida à França e a colaboração com Valle deu um contato ainda mais forte do O Terço com o rock progressivo, demonstrado no compacto "Ilusão de Ótica" / "Tempo é Vento" (1971), onde até mesmo as letras estão mais trabalhadas. Sérgio passa a tocar viola e a estudar cada vez mais. Nessa nova fase lançam o fantástico álbum Terço, abrindo assim sua principal fase no cenário nacional.

A estreia progressiva do Terço, sem o ^

Mais pesado e "roqueiro" que O Têrço, os destaques ficam para as faixas "Deus", a acústica "Estrada Vazia" e a Maravilhosa suíte "Amanhecer Total", com suas cinco partes ("Cores / Despertar pro Sonho / Sons Flutuantes / Respiração Vegetal / Primeiras Luzes no Final da Estrada - Cores Finais") e com a participação de Luiz Simas (Módulo 1000) nos teclados, ocupando todo o Lado B do LP em seus quase vinte minutos de muita loucura e viagem.

Vinícius foi parar na banda de Caetano Veloso, sendo substituído por Luiz Moreno. Sérgio Magrão foi convidado para tocar baixo e Mercês assumiu a função única de letrista e compositor. Com a ajuda de Milton Mascimento, conhecem o multi-instrumentista Flávio Venturini, que havia acompanhado o pessoal do Clube da Esquina e tinha um talento incomum no Brasil, assumindo os teclados do agora batizado O Terço. A nova formação participa do álbum Nunca, de Sá & Guarabyra, e torna-se a formação clássica do O Terço, ao lançar, em 1975 o espetacular Criaturas da Noite.

Compacto de "Queimada"

O disco contém no mínimo quatro clássicos do rock nacional, que qualquer brasileiro em qualquer rincão do mundo conhece. "Hey Amigo" é um deles, abrindo com o seu famoso refrão que foi cantado à plenos pulmões pelos jovens na década de setenta. "Queimada", com seus violões e violas, tornou-se outro grande clássico, e vem na sequência. O talento de Venturini nos teclados aparece em "Pano de Fundo", e no piano durante a viajante instrumental "Ponto Final", com vocalizações de Marisa Fossa. Nela, Venturini também se aventura em solos de moog, órgão e piano. O lado A encerra-se com a hard "Volte na Próxima Semana", com um refrão grudento e muito órgão, e que já torna o álbum essencial.

O lado B então é simplesmente o que os fãs consideram como o mais genial momento da carreira do grupo, abrindo com mais um clássico, "Criaturas da Noite". O que falar de uma canção que está entre as dez mais conhecidas do rock nacional? Com arranjos do maestro Rogéro Duprat, "Criaturas da Noite" virou uma das peças centrais da banda, sendo pedida nos shows até os dias de hoje. "Jogo das Pedras" retoma o clima de "Queimada", com os violões tendo maior destaque.

Sérgio Magrão, Sergio Hinds, Luiz Moreno e Flavio Venturini

E por fim, uma das melhores suítes do rock nacional, a Maravilhosa "1974". Composta por Venturini, essa faixa retrata a importância da entrada do tecladista, dando enfim uma cara de grupo para O Terço. A faixa começa com sua clássica introdução ao piano e com o baixo executando os acordes para Sérgio trazer o tema principal. As marcações se fazem presentes, trazendo o tema principal com as famosas vocalizações de Sérgio ("Na-na-na-na-na-na-na-naaaaaaaaa") e novamente as marcações, para modificar um pouco o tema principal e também as vocalizações ("Da-ra-ri-ra-tu-ra-raaaaaaa Di-ra-ri-ra-ra-raaaaaaaaaa") em uma marcação hipnotizante, com a guitarra executando as mesmas notas das vocalizações.

Os riffs mudam, com Venturini solando sobre um segundo tema instrumental, levando a música para um clima embalado, onde Sérgio sola com um efeito de reverb sensacional.

O Terço ao vivo em 75

A parte mais viajante então chega, com Venturini virando uma centopeia nos teclados, enquanto Sérgio emite vocalizações tristes, acompanhadas por notas de guitarra mais tristes ainda.

O baixo de Magrão dá o toque suingado para a música, passando um clima de apreensão, onde o ouvinte não consegue imaginar o que vai vir. Sequências de baixo, bateria e guitarra intercalam sobre os longos acordes dos teclados de Venturini, levando ao tema final da canção, com mais um solo de Sérgio e as últimas vocalizações, feitas somente com o acompanhamento do piano.

Guitarra e sintetizador duelam por alguns segundos, para Sérgio solar e encerrar essa faixa que , com certeza, tem que ser ouvida e reouvida com todo o carinho e a atenção que se deve dar a uma obra-prima.

Pôster na capa interna de Criaturas da Noite

Criaturas da Noite foi lançado na Europa em 1976 numa versão rara, com as músicas cantadas em inglês e com o nome de Creatures of the Night. Foi o álbum mais bem sucedido da banda, com o compacto de "Hey Amigo" vendendo milhares de cópias e com direito até a apresentação de "1974" como peça musical coreografada, fato este ocorrido em 1977 através do artista argentino Oscar Araiz. Muitos consideram o melhor álbum de todos os tempos do rock nacional.

Em sua versão original o LP trazia uma arte muito bonita, chamada A Compreensão, obra de Antônio e André Peticov, além de um encarte e poster gigante do grupo tocando ao vivo. É claro que essa versão, quando encontrada, é disputada a tapa nos sebos, valendo alguns barris de cerveja. Existe também uma outra versão com o poster sendo a capa do álbum, e que muitos achavam que tratava-se de um álbum ao vivo da banda quando a mesma foi lançada.

Cerveja O Terço

O Terço tornava-se então um expoente do progressivo nacional, ao lado dos Mutantes de Sérgio Dias, participando como um dos headliners dos festivais Águas Claras (1975), Banana Progressiva (1975), Hollywood Rock e Temporada de Verão. Em 1976 a banda isolou-se em uma fazendo no interior de São Paulo, seguindo os passos de Novos Baianos, Mutantes, entre outros. Lá, construíram as canções para o próximo álbum, Casa Encantada, lançado em 1976, e cuja história estará aqui em quinze dias, quando chegaremos na Maravilhosa "Solaris", que junto com "1974", é uma ótima acompanhante para a cerveja com o nome do grupo, lançada ano passado.
Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...