domingo, 12 de julho de 2015

Santana - Guitar Heaven: The Greatest Guitar Classics of All Time [2010]



Tem dias que ficam marcados na vida da gente por diversas razões, mas sempre ligadas às emoções que você viveu em tal dia (boas ou ruins). Eu tenho vários dias eternos na minha vida, como o nascimento do meu filho, o dia que o Sport Club Internacional foi campeão do mundo, a aprovação no concurso público garantindo minha estabilidade financeira, o almoço que conheci minha esposa, e tantos outros momentos marcantes.

Carlos Santana
Outros, de menor significância, por alguma razão as vezes saltam como um pop-up em meu cérebro, e um deles é a data de 22 de setembro de 2010. Na tarde daquele dia, eu estava em Roma, depois de uma curta temporada por Atenas (tão marcante quanto os fatos citados no parágrafo acima) e de ter assistido Ozzy Osbourne em Paris dois dias antes (idem ao citado por Atenas), e resolvi passear pela cidade para conhecer o que me faltava ver da mesma, já que havia ficado alguns dias por lá no início do mesmo mês.

Foi então que me deparei com uma imensa livraria, próxima ao Vaticano, e nela, entrei para verificar a possibilidade de encontrar alguma preciosidade por um preço módico. Enquanto vasculhava os CDs, DVDs e livros do local, ouvia ao fundo um som conhecido, canções clássicas, interpretadas por um timbre inconfundível. Chamei o vendedor e perguntei: "Isto que está tocando é Santana?" e ele prontamente "Sim, é o novo álbum. Se você quer ouvir, sente-se aqui, e fique a vontade.".

A livraria oferecia um café com bolachas por um preço honesto, e então, larguei o passeio por Roma e fiquei a tarde viajando no ótimo disco Guitar Heaven: The Greatest Guitar Classics of All Time. Ouvi o disco duas vezes, acompanhado por quatro Capuccinos e diversas bolachas, e sai da livraria entusiasmado com o álbum, apesar de não ter adquirido o mesmo na época devido ao fato de, por ser lançamento, seu valor era muito alto (um CD custava mais que vinte Capuccinos).

Quando cheguei no Brasil, meses depois, uma famosa loja online colocou o CD em venda por um preço muito bom, e assim, pude levar para casa um dos melhores álbuns dos tempos atuais, e o melhor disco de 2010 sem dúvidas. Trata-se de uma coleção feita pelo guitarrista Carlos Santana, que elegeu doze grandes solos de guitarra e reproduziu os mesmos através de sua famosa levada latina. Com a participação de diversos convidados, Guitar Heaven vai desde sucessos sessentistas de Beatles e Stones até o peso de AC/DC, passando também pela farofa de Def Leppard, sempre em alto nível. 

Arte promocional do álbum

O álbum abre com duas pancadas logo no início, começando com uma alucinante versão de "Whole Lotta Love", e Chris Cornell (Soundgarden, Audioslave), mandando ver em uma performance impecável, e a perfeita recriação de "Can't Your Hear Me Knocking", um dos grandes solos da carreira de Keith Richards, e que Santana tirou de letra ao incrementar toda sua latinidade nesse clássico da década de 60, trazendo para os vocais Scott Weiland (Stone Temple Pilots). 

As tradicionais linhas percussivas que marcaram o início da carreira de Santana estão presentes na sensacional versão de "Sunshine of Your Love", grande clássico do Cream, e que aqui aparece com a voz de Rob Thomas (Matchbox Twenty). A vocalista India.Arie emociona na recriação de "While My Guitar Gently Weeps", que conta com o violoncelo de Yo-Yo Ma, atestando mais uma vez que quando se fala em covers para canções dos Fab Four, a versão recriada fica sempre melhor que a versão original. As percussões retornam em "Photograph", dando apenas o andamento para os vocais de Chris Daughtry (Daughtry), e a guitarra de Santana torna a mesma bem melhor, na minha opinião, que a versão original do Def Leppard.

Encarte de Guitar Heaven

"Back in Black" ficou irreconhecível nos vocais rappers de Nas, mas manteve o peso original, ficando apenas moderna em relação ao que o AC/DC fez em 1980, assim como "Riders on the Storm", uma das joias da carreira do The Doors, que ganhou um clima ainda mais flower-power do que sua versão original. Nela, temos a participação especial de Ray Manzarek nos teclados (uma das últimas gravações do tecladista, falecido em 2013) e Chester Bennington (Linkin Park) nos vocais.

"Smoke on the Water" ficou fiel a versão original do Deep Purple, tendo os vocais de Jacoby Shaddix (Papa Roach) e com destaque para o slide e o wah-wah utilizado por Santana, além da percussão batucar o tempo inteiro, fazendo certamente você dar suas balançadas de cabeça. A percussão  latina encaixou divertidamente em "Dance Night Away", mostrando que até mesmo o Van Halen pode ser condensado a tambores. Os vocais aqui ficaram por conta de Pat Monahan.

O mais interessante é que mesmo com um grande rol de canções e estilos, em nenhum momento a essência de Santana se perde. Podemos verificar que para todos esses clássicos, Carlos Santana conseguiu deixar sempre sua marca registrada, que é o timbre inconfundível de sua guitarra particular, desfilando solos ásperos, rasgados e agudíssimos. 

"Bang a Gong" é a única que ficou aquém de sua versão original, até por que é difícil conseguir superar toda a malemolência que Marc Bolan apresentou nessa faixa em 1971, e convenhamos, Gavin Rossdale (Bush) está muito longe de ser um bom cantor. O solo de Carlos Santana é o único grande momento da faixa.  

A guitarra flamejante de Santana

O encerramento do álbum é simplesmente comovente, começando com Joe Cocker arrasando na linda "Little Wing", com uma cara totalmente nova, arrepiando até a alma, e fazendo Jimi Hendrix aplaudir em pé ao solo de Santana, e por fim, "I ain't Superstitious", clássico de Truth (Jeff Beck), com a mesma potência no wah-wah de Santana, mas aqui muito mais bluesy que sua versão original, e com Jonny Lang saindo-se muito bem no papel de Rod Stewart. 

Guitar Heaven ainda saiu em uma versão DELUXE, trazendo dois bônus: "Fortunate Son", com Scott Stapp nos vocais, e "Under the Bridge", tendo Andy Vargas no papel de Anthony Kiedis. A versão japonesa ainda foi gratificada com mais um cover, "La Grange", tendo Kenichi Asai nos vocais. No geral, o disco foi extremamente bem sucedido mundo afora, chegando na quinta posição nos Estados Unidos e décima quinta no Reino Unido.

Apesar de dizer que são Os Grandes Clássicos da Guitarra de Todos os Tempos, é claro que ficou faltando joias como "Free Bird" (Lynyrd Skynyrd), "Stairway to Heaven (Led Zeppelin), "Paranoid" (Black Sabbath) ou "Hey Friedrick" (Jefferson Airplane), mas é inegável que a coleção feita por Santana para esse álbum é de muito bom gosto. 

Contra-capa do CD

Track list

1. Whole Lotta Love
2. Can't You Hear Me Knocking
3. Sunshine of Your Love
4. While My guitar Gently Weeps
5. Photograph
6. Back in Black
7. Riders on the Storm
8. Smoke on the Water
9. Dance the Night Away
10. Bang A Gong
11. Little Wing
12. I Ain't Superstitious

quinta-feira, 9 de julho de 2015

Van der Graaf Generator - Live at Metropolis Studios, London [2011]



No dia 18 de dezembro de 2010, 120 sortudos presenciaram um momento único na história do rock progressivo, que foi um ensaio nos estúdios Metropolis em Londres feito por Peter Hammill (teclados, voz, guitarras), Hugh Banton (teclados) e Guy Evans (bateria), mais conhecidos como Van der Graaf Generator, com o objetivo de estarem prontos para a turnê de divulgação do álbum A Grounding in Numbers.

Até então, o álbum não havia sido lançado, e algumas faixas dele foram exploradas, assim como outros dos álbuns lançados pelo grupo após o seu retorno nos anos 2000, no caso Present (2005) e Trisector (2008).

Visão geral do Metropolis Studios, completamente lotado

Para quem ficou apaixonado pelo grupo com os clássicos discos lançados nos anos 70, com destaque para a sequência H to He, Who Am the Only One (1970), Pawn Hearts (1971), Godbluff (1975) e Still Life (1976), Live at Metropolis Studios é uma boa oportunidade para jogar o ranço de fora e conferir os bons materiais que a banda fez recentemente, e ainda, ficar espantado como o trio conseguiu apagar as lembranças de um de seus principais instrumentistas, o saxofonista David Jackson, que gravou os discos citados nos anos 70 e participou do retorno em 2005, gravando Present e o ao vivo Real Time (2007), saindo da banda pouco antes da gravação de Trisector, por problemas de relacionamento entre Jackson e os demais.

Então, colocando o CD 1 no som, o show começa com o intrincado riff de piano de "Interference Patterns" (Trisector), com Hammill soltando a voz de sua garganta como se tivesse nos anos 70, seguida pela agonizante e bela "Nutter Alert" (Present), com outra grande interpretação de Hammill.

Duas visões do palco, com Hammil nos teclados (acima) e na guitarra (abaixo)

O ritmo diminui na suave "Your Time Starts Now" (A Grounding in Numbers), mas não tarda para a loucura voltar às caixas de som com a psicopata e esquizofrênica "Lemmings" (Pawn Hearts), o primeiro grande clássico da carreira do grupo a brilhar para os ouvidos dos fãs, completinha e com vários detalhes a mais, em uma interpretação sensacional, destacando o ritmo alucinante de Evans e principalmente, Hammill assumindo a guitarra. Aqui o show começa realmente para quem curte música, por que a barulheira que o trio faz apenas com guitarra, teclados e bateria, é descomunal. A violência dos gritos de Hammill, as pancadas nas viradas de Evans e todas as diabruras que Banton inventa nos seus teclados, assim como as notas de guitarra que parece soarem desencontradas, dando mais tensão para "Lemmings", são uma amostra grátis de por que o Van der Graaf Generator ainda hoje surpreende os que admiram o rock progressivo.

"Lifetime" (Trisector) soa como um trem passando sua vida, em um clima bastante depressivo extraído da guitarra e dos teclados, além da dramática voz de Hammill, e mais uma novidade vem para os fãs, "Bunsho" (A Grounding in Numbers), bastante intrincada como convém para a sonoridade esperada nas canções do grupo. O primeiro CD encerra-se com o segundo clássico, "Childlike Faith in Childhood's End", uma das obras-primas do grupo registrado no renegado Still Life (1976), daquelas interpretações arrepiantes de Hammill, e com uma assombrosa e emocionante execução de Banton e Evans através de seus mais de . Os mais xiitas vão dizer que o saxofone de David Jackson faz falta, mas honestamente, o que o trio nos apresenta nessa versão é tão belo quanto o que está registrado em Still Life. Dá para sentir a tensão e o apavoramento dos presentes com o que estão vendo no final da apresentação de "Childlike Faith in Childhood's End", com aplausos fortes e incansáveis para o trio.

Guy Evans e seus ritmos impensáveis

O segundo CD surge com as linhas jazzísticas de "Mr. Sands", terceira de A Grounding in Numbers, seguida pela leve viagem dos mais de doze minutos de "Over the Hill" (Trisector), com suas várias sessões intrincadas, em duelos elaborados por bateria e teclados, além de outra performance vocal arrepiante por Hammill. O riffzão enigmático de "(We Are) Not Here" (Trisector) traz uma das melhores canções registrada pelos britânicos nos últimos anos, e o show conclui-se com outro grande clássico, a linda "Man-Erg" (Pawn Hearts), mais uma obra-prima que o Van der Graaf Generator deixou ao mundo nos anos 70. O que impressiona é como a voz de Hammill permanece intacta, e novamente, mesmo os xiitas reclamando da ausência do saxofone de Jackson, não dá para não ficar de queixo caído com a poderosa interpretação do trio, principalmente no grandioso trecho central no qual os instrumentos travam uma batalha musical alucinante, e mais uma vez, o encerramento é arrepiante, com todo mundo urrando muito.

Depois de ficar em êxtase com o orgasmático show de pouco menos de uma hora e meia, é hora das reflexões sobre o mesmo. Durante toda a audição dos CDs, percebemos que o trio está mandando ver, mas aos que não conhecem a carreira do Van der Graaf Generator, fica difícil saber quem destacar entre os instrumentos. Claro que a interpretação vocal de Hammill é incrível, mas será que a dupla de teclados que está fazendo a sonzeira?

Hugh Banton se virando em dedos e pernas

Para solucionar essa dúvida é que temos o DVD, e nele, o excepcional Banton mostra por que é um dos maiores (e na minha opinião o maior) tecladista da história do rock progressivo.

Com uma agilidade exclusiva, o baixinho monta nos seus teclados, fazendo misérias com os pés através das grandes teclas situadas em frente ao seu banco, enquanto desliza freneticamente seus dedos nos dois teclados que estão ao seu redor. Logo na primeira canção, ele já mostra do que é capaz, conduzindo seus teclados concentradíssimo, sendo maravilhoso ver sua agilidade utilizando os quatro membro de seu corpo perfeitamente. Ver o que ele faz na introdução de "Lemmings", ou durante toda essa mesma faixa, em uma barulheira infernal criada apenas por ele, com uma capacidade incrível de tocar dois teclados ao mesmo tempo com uma única mão, Outra que impressiona é "Childlike Faith in Childhood's End", já que ele é praticamente quem conduz toda a canção, apenas com Evans fazendo a base e Hammill cantando absurdamente, com as veias saltando de sua garganta em imagens fantásticas. Resumindo, Banton não é desse planeta!

Peter Hammill utiliza um pedestal para ler as letras

Apesar de algumas canções Hammill utilizar de um pedestal com as letras, isso não estraga também suas grandes performances vocais, ainda mais sabendo que a maioria dos velhos artistas hoje em dia adotam tele-prompters em suas apresentações com muita naturalidade. Por fim, Evans é um animal no seu kit. Um dos bateristas mais injustiçados, a idade mostra que pegou somente no seu corpo, bem mais gordinho do que o menino franzino que está no fantástico DVD Godbluff Live, só que no resto, o cara solta o braço e as pernas, sempre com aquele olhar preocupado mas sereno que tanto marcou sua carreira.

Nos extras do DVD, temos uma série de entrevistas individuais com o trio, falando sobre o retorno do grupo em 2005, a decisão de seguir somente como um trio após a saída de David Jackson, comentários sobre A Grounding in Numbers, o futuro da banda e uma boa - e merecida - babada de ovo de cada integrante para os demais, já que afinal, como bem dito nas entrevistas (em inglês e sem legendas), Hammill é um gênio, Banton é um monstro dos teclados e Evans é o único capaz de criar ritmos impensáveis para acompanhar as letras e a música de Hammill.

Peter Hammill nas entrevistas dos extras

Ainda acompanha o pacote um encarte com diversas fotos (todas em preto e branco) e um breve resumo da história da banda.

Se existe algum pecado nesse álbum, é que Hammill tocando guitarra está um pouco fora de forma, já que este também nunca foi seu instrumento principal, mas é um detalhe ínfimo perto da majestosa apresentação do grupo.

A disposição dos CDs e DVD em Metropolis

Track List

CD 1
1. Interference Patterns
2. Nutter Alert
3. Your Time Starts Now
4. Lemmings
5. Lifetime
6. Bunsho
7. Childlike Faith in Childhood's End

CD 2
1. Mr. Sands
2. Ovetr the Hill
3. We Are Not Here
4. Man-Erg

DVD

Todas as canções do CD 1 e do CD 2, na mesma ordem
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