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segunda-feira, 9 de setembro de 2013

War Room: Van Züllat - O Casulo [2008]



Por Mairon Machado

Convidados: Marco Gaspari e Ronaldo Rodrigues

O War Room desse mês é dedicado para o rock nacional, e nossos colaboradores irão viajar ao som dos gaúchos da Van Züllat, através do primeiro álbum do grupo, O Casulo, de 2008. Infelizmente, o quarteto pelotense encerrou suas atividades ano passado, mas deixou um legado de dois álbuns, dos quais conferimos as impressões de nossos colegas agora

1. Produto Misto

Ronaldo: Começo frenético. Boa impressão.

Mairon: Barulhos e conversas trazem o moog e então surge um dos sons mais poderosos que a música brasileira ouviu na década passada. Baixo e bateria executam uma performance endiabrada, em uma espécie de samba-prog-fusion de difícil caracterização, mas muito, muito bom.

Marco: Uma pergunta: é pra gostar? (pergunto porque são gaúchos e não quero ofender o Mairon).

Mairon: É para ser sincero, Marco.

Ronaldo: Teclados e bateria nervosos, mas o lance brasileiro não deu exatamente liga com o restante, pareceu uma coisa bem distinta - parte A e parte B.

Mairon: Essa virada com a entrada da guitarra é a coisa mais Santana que o Santana nunca gravou.

Ronaldo: Ainda sim, bom!

Marco: Ainda não ouvi nada demais. E o Santana não mora em Alegrete.

Ronaldo: A guitarra tem um sonoridade bem próxima do Sérgio Hinds no segundo disco do Terço, de 1973. Um fuzz bem rasgado.

Mairon: Reta final, com a bateria comendo o pau e o órgão delirando em um grandioso solo, misturado com o moog, para um encerramento cortado após o breve solo de guitarra, levando-nos para a segunda faixa. Bom começo!

2. Sertão Digital

Mairon: Construída sobre as bases nordestinas, essa canção é regada de experimentalismo, e mantém o ritmo frenético da faixa de abertura, porém com muitas viagens na guitarra (carregada de efeitos) e nos sintetizadores.

Ronaldo: Os teclados preenchem cada espaço do som, a sonoridade dos sintetizadores é fantástica! Bastante ousado e com algo bem musical a dizer.

Mairon: E esse solo de flauta? Surpreendente.

Ronaldo: A influência da música regional é nítida, mas em uma autêntica fusão com a sonoridade universal do rock progressivo. A levada de bateria é fantástica também.

Mairon: O tecladista chama-se Cleber Vaz, que também toca guitarra e flauta. Na bateria está Marcelo Silva, Gabriel Mattos no contrabaixo e Jonatão Muller na guitarra. Esse encerramento é muito soturno!

Ronaldo: Encerramento surpreendente, de uma música surpreendente.

3. Cores

Mairon: O clima muda, ficando bem abrasileirado e caindo um pouco na qualidade inicial, mas mesmo assim, muito bom. Marco, cadê você?

Marco: Estou aqui só ouvindo e lendo.

Mairon: A sequência de solos de flauta e violão é bem encaixada, e curto as mudanças. Essa flauta me lembra muito Recordando o Vale das Maçãs. Marco, você está curtindo?

Marco: Acho bacaninha. Não sei o que dizer, lamento.

Ronaldo: Dentro do panorama até então apresentado, difícil construir uma opinião mais concreta. O som é agradável, mas pode passar despercebido também, mesmo sem saber exatamente o que vem pela frente.

Marco: Esse tipo de som tem muita informação. Eu pelo menos fico confuso numa primeira audição.

Ronaldo: De fato - muitas variações, frenesi total, e isso tudo em faixas curtas. But I like it!

Mairon: Eu quando ouvi a primeira vez fiquei chocado, por isso comprei o CD para ouvir com calma. São ótimos músicos, com ótimas ideias, e a coisa funfa.

4. De Sol a Sol

Mairon: Jazz americano para neguinho não botar defeito, repleto de tempero brazuca na cozinha e pelo solo de flauta.

Ronaldo: Estou sentindo falta de um pouco mais de acento melódico. Até então, o disco foi praticamente quebradeira do início ao fim. É o tipo de fórmula que para assistir no palco, gera uma catarse. Para ouvir em casa, é preciso um apetite especial.

Marco: Ia dizer coisa parecida: bom de tocar, mas chato de ouvir, hehe...

Ronaldo: A música vai direto ao ponto, sem preliminares...

5. Utacarani

Ronaldo: Não tem nem pausa entre as músicas!

Mairon: Segue a linha da faixa anterior, e quase não percebemos a mudança de uma para a outra. Ritmo alucinante. E o moog comendo solto, além da bateria estar demais.

Ronaldo: Realmente, esse trabalho de moog é embasbacante e nenhum dos outros músicos fica atrás.

Marco: Desculpem, isso é disco para músicos. O moog é bacana mesmo.

Mairon: Esses duelos e virações são fantásticos. Olha a sequência de solos de baixo e bateria, que coisa FODÁSTICA.

Ronaldo: Um tipo de progressão bem ELP essa parte agora.

Mairon: O cleber é altamente influenciado pelo Wakeman e pelo Thijs Van Leer

6. Tarantula

Mairon: Agora é a vez da guitarra brilhar, e essa cozinha é muito, mas muito perfeita. Moog comendo solto!

Ronaldo: O som da bateria poderia ser melhor tratado, a gravação parece ser meio amadora.

Mairon: Foi gravado em 2 canais apenas Ronaldo, intelizmente. Um trabalho bem amador.

Ronaldo: Uma pena! Uma boa qualidade e um pouco mais de paciência na construção das músicas faria esse trabalho atingir uma amplitude muito maior.

Mairon: Acredito que houveram dois problemas aí: Cidade pequena e falta de interesse em produzir o trabalho (falta de apoio mesmo, os caras correram atrás, mas ninguém se interessou)

Marco: Cadê aquela coisa regional das primeiras músicas?

Mairon: Está na flauta e E na percussãozinha que rola no fundo.

Marco: Ah!

Ronaldo: O grupo tem identidade, talento e boas composições. Faltou equilibrio, contudo.

7. A Montanha 

Marco: Definitivamente, não gostei.

Mairon: Violões dão uma nova sonoridade, junto com sons de pássaros, na canção mais maluca do álbum.

Ronaldo: Uma abertura menos veloz, já é um refresco para os ouvidos.

Mairon: Enquanto a bateria faz uma coisa, a guitarra faz outra, parece cada um viajando no seu instrumento. Uma canção atípica, tranquila, para respirarmos. Show da guitarra, que até então estava um pouco escondida

Ronaldo: Linda passagem com os violões e a flauta.

Mairon: Mais lembranças de Recordando o Vale das Maçãs.

Ronaldo: Apesar de gostar de uma quebradeira boa, essa mais melódica é a faixa que mais apreciei.

Mairon: Esse crescendo é muito legal, e olha o violino aparecendo do nada.

8. Do Pé da Seringueira

Mairon: Um jazz simples, que definitivamente, acalma os ânimos depois da frenética abertura do álbum, com um maravilhoso trabalho ao piano do Cleber.

Ronaldo: Realmente o piano dá show, mas essa faixa parece um tampão no álbum, um tanto estéril, do tipo "já vi esse filme".

Mairon: As inspirações clássicas surgem do nada, é é muito bonito esse trecho. Um crescendo emocionante.

Ronaldo: A progressão é muito boa, bem colocada, gostei!

9. Jazzpion

Marco: Gostei do nome

Mairon: Cleber continua exibindo-se ao piano, com propriedade e talento. Trecho central esquisito e muito progressivo!

Ronaldo: Um tema cômico, mas leva um tempo até entender o que realmente está acontecendo.

Mairon: Doideira!

Ronaldo: E as vezes esse tempo é maior do que a duração da própria faixa! O tecladista, vez por outra, toca mais rápido do que eu sou capaz de ouvir!

Mairon: Hauehauehauehua!

10. Tropicando

Ronaldo: Uau...que introdução!

Mairon: Quebradeira de baixo, bateria e guitarra. Ronaldo, no segundo CD eles gravaram uma música de 20 minutos, daí da para absorver melhor o som, mas essa primeira audição te deixa meio tonto (eu pelo menos fiquei).

Ronaldo: Seria interessante ver como se desenvolvem em uma faixa longa.

Mairon: Se sairam bem Ronaldo, mas é muita doideira. Até uma parte somente com berimbau tem.

Marco: Sai música, entra música e é quebradeira ou pianinho maluco. Enjoou já. Mas gosto de baixo no fundo.

Ronaldo: Marco, não é você que gosta do Henry Cow? (pergunta do tipo daquelas que não é pra provocar não, ok?).

Mairon: Essas virações da guitarra são estupendas!

Marco: Não vejo nada aí parecido com o Henry Cow. Talvez as viradas de bateria de vez em quando ...

Ronaldo: Inspiradas nos melhores momentos da guitarra jazz-rock.

11. Samba Jacaré!

Mairon: Essa é para colocar a casa para dançar. Um sambão de raiz, levado pelo violão e pelo baixo, com a bateria comendo solto para a guitarra ser estribuchada em pelo estúdio. Um encerramento perfeito para um grande álbum!

Ronaldo: Realmente não se parece em nada com o som deles, mas a proposta de frenesi sonoro, sons inusitados, informação múltipla, eu tentaria fazer alguma associação. No caso, o som deles é mais direto e menos soturno. Uma pegada meio "novos baianos".

Mairon: Ahã, bem por aí, só que mais "Hard"! Essa misturança é um deleite! Assim como as mudanças inesperadas.

Marco: Essa música eu gosto. Não tem aquele fuzuê, aquele comichão. Gostoso isso.

Mairon: Tem alguns segundos de silêncio, e depois volta

Ronaldo: Essa faixa já não me fez a cabeça.

Mairon: A minha também não, Ronaldo.

Marco: Pô, eu gostei. Vou sair do grupo.

Mairon: Esse Marco.

Ronaldo: Ele que sempre foi um louco, um romântico, um anarquista...

Mairon: Agora virou leitor de Paulo Coelho

Marco: Acabou? Viva!!!

Mairon: Não, ainda tem mais, aguarde. Bem sinceramente, esse final é desnecessário, mas enfim, não entendi qual a ideia com o mesmo.

Marco: Gostaria de dizer algo em minha defesa: vão tomar no cú!!

Ronaldo: Um abraço de urso pra você, Marco. Idem, Mairon...

Mairon: Um selinho do Sheiki para você, Marco. Quanto ao som, é legal, curti o saxofone, mas foge do contexto do álbum.

Ronaldo: Nada a ver esse final, mesmo...

Marco: Isso que tá tocando é a banda ainda. Esse caras não largam o osso.

Considerações Finais

Mairon: Um álbum de difícil assimilação na primeira audição, mas que deixa aquela sensação de "Puta que pariu, preciso ouvir isso de novo" e não "Nunca mais vou ouvir isso". Um talento que infelizmente foi desperdiçado, assim como tantas outras boas bandas reveladas nos últimos anos e que não conseguiram seu lugar ao sol, por questões de patrocínio entre outros.

Marco: Achei tudo maluquinho, espertinho, inho e inho... A banda da guarda civil bêbada não faria melhor.

Mairon: Marco detonando, aheuaheuahea! O próximo disco que eu convidar o Marco, só ele vai gostar. Já está na minha agenda, só tenho que achar o link e me preparar espiritualmente para ouvir a bomba.

Marco: Não gostei de detonar, inclusive. Não acho justo com os músicos. Mas achei over pra caramba. estou ficando velho. Vou ouvir Roberto.

Mairon: AOHEHAOIEIOHAEIHAOHI. Roberto Carlos está te dando mais emoção? Isso é influência do Sheiki!?

Marco: Quem é esse Sheik, o pianista dessa banda?

Mairon: O centroavante dos selinhos

Marco: Ah, sim, joga no meu time, né? Bando de viados.

Ronaldo: Saldo positivo. O trabalho é ousado. O problema que as vezes é tão ousado que beira a desintegração. Músicos de talento inquestionável, mas que pisaram demais no acelerador. Tem momentos fantásticos, soberbos até, mas pra captá-los de verdade, somente com várias audições. Reafirmo que faltou equilíbrio e qualidade de gravação para o trabalho conseguir ser mais apreciável; talvez um sinal de imaturidade ou uma visão equivocada do gosto médio dos fãs de rock progressivo, que seriam o mais próximo de um potencial público alvo para a banda. Se o importante era apenas se expressar, o objetivo foi atingido com sobras. Agora, em termos de comunicação com o ouvinte, foi somente a banda que falou e não deu tempo de ninguém sequer abrir a boca.

Marco: Ronaldo é o meu herói.

Mairon: Bela definição Ronaldo. Com essa encerramos os trabalhos. Até a próxima gurizada!

Ronaldo: Abraços.

Marco: Outro. Selinhos mil.

terça-feira, 3 de janeiro de 2012

Melhores de 2011: por Mairon Machado


Massahara


Nesta primeira semana de janeiro, de segunda a sexta, diversos colaboradores da Consultoria do Rock estarão apresentando listas com suas preferências particulares envolvendo os novos álbuns de estúdio lançados em 2011. Cada redator tem a oportunidade de elaborar sua listagem conforme seus próprios critérios, escolhendo dez álbuns de destaque, além de uma surpresa e uma decepção (não necessariamente precisam ser discos). Conforme o desejo de cada um, existe também a possibilidade de incluir outros itens à seleção, como listas complementares, enriquecendo o processo e apresentando sugestões relacionadas ao ano que acabou de se encerrar. Como culminância do processo, no sábado, os dez álbuns mais citados serão compilados e receberão comentários de todos os colaboradores, não importando o teor das opiniões.

Por Mairon Machado (Publicado originalmente no blog Consultoria do Rock)

Não sou muito adepto aos novos sons, mas sempre que uma banda que eu curto lança um álbum novo, corro atrás para ver o que está acontecendo, com exceção do jazz, um dos meus estilos preferidos e que, independente da década, é sempre bem vindo a qualquer momento. Porém, no último ano, graças principalmente à minha colaboração aqui no blog, acabei ouvindo muito material de bandas novas ou desconhecidas para mim, e isso refletiu bastante na minha definição dos 10 melhores álbuns de 2011, mesmo de alguma forma incluindo algumas velharias. De forma geral, ficou o lado positivo de um ano repleto de bons lançamentos e a dificuldade em escolher apenas 10 entre tantos discos bons.

Álbuns do ano

Massahara - Massahara
Uma das sessões do blog é a "Direto do Forno", na qual um de nossos colaboradores recebe um CD que acaba de ser lançado ou relançado e é designado para resenhar o mesmo. Fui felicitado de receber o primeiro álbum do grupo paulista Massahara, auto-intitulado, que alegrou bastante vários dias do meu 2011. Nas oito canções do CD, um ótimo resgate da sonoridade do hard setentista, destacando o talento individual de músicos com grande técnica e principalmente, criatividade, que fizeram de Massahara o melhor álbum do ano passado para este que vos escreve. Ainda hoje continuo ouvindo e me surpreendendo com canções como "Já Nem Ligo Mais", "Lugar ao Sol" e "Tudo o que Eu Quero". O Massahara virou a referência para mostrar que o som setentista, cultuado por muitos (eu inclusive) ainda é capaz de sobreviver e apresentar discos decentes.

Yes - Fly from Here
Quando Jon Anderson saiu do Yes em 1979, o mundo recebeu de presente Drama (1980), um dos melhores discos do grupo, que mostrava o talento de compositor do baixista Chris Squire e do guitarrista Steve Howe. Ao lado dos ex-Buggles Trevor Horn (vocais) e Geoff Downes (teclados), bem como do baterista Alan White, Squire e Howe começaram a compor diversas canções, e muitas delas ficaram de fora de Drama. 30 anos depois, Anderson saiu novamente do Yes. Algumas das canções que ficaram fora de Drama foram resgatadas por Squire, Howe e White, que reviveram os momentos do que foi chamado de Yes-Buggles ao lado de Downes e do novato vocalista canadense Benoît David. Com a produção de Trevor Horn, saiu Fly from Here, que apresentou finalmente ao mundo a versão final da suíte "Fly From Here". É inegável que não é o velho Yes dos anos 70, e que David não tem o alcance vocal de Anderson, mas, por outro lado, as composições de Fly from Here são de encher os olhos e ouvidos. Não somente a faixa-título é destaque. Todo o álbum é um conjunto de belas canções, que soa como uma perfeita sequência para Drama. Se você curtiu o álbum de 1980, certamente curtirá esse segundo álbum sem Anderson, e o segundo melhor lançamento de 2011.

Saxon - Call to Arms
O que você espera ouvir de um grupo da NWOBHM? Bom, eu espero ouvir linhas melódicas de guitarras, um baixo grudento e canções que fazem cantarolar do nada. Há algum tempo eu não conseguia encontrar isso em um disco do estilo, até que ouvi Call to Arms, o décimo nono álbum do Saxon. Com certeza, é o melhor disco do grupo desde Solid Ball of Rock (1991), e a adição de Don Airey nos teclados deu um ganho a mais para o já ótimo som feito por Biff Byford (vocais), Paul Quinn (guitarra), Doug Scarratt (guitarra), Nibbs Carter (baixo) e Nigel Glocker (bateria). Vários são os pontos altos de Call to Arms, mas vou indicar apenas três pérolas, que futuramente, serão chamadas de clássicos: "Call to Arms", "Hammer of the Gods" e "Mists of Avalon". Enquanto outros grupos da NWOBHM estão meio perdidos em termos do que querem fazer musicalmente, o Saxon é a prova viva de como se manter na ativa fazendo o que fazia no passado, e ainda assim sendo original.

Vãn Züllat - Betelgeuse
Três anos de espera e finalmente o segundo álbum do grupo pelotense Vãn Züllat foi lançado. A expectativa era enorme. Afinal, a suíte "Betelgeuse" estava sendo interpretada ao vivo, e muitos se perguntavam como aquela maravilha do rock progressivo ficaria em estúdio. A dúvida foi sanada em Betelgeuse, e mostrou que não só os quase 20 minutos da faixa-título eram a arma principal de Cleber Vaz (teclados, flautas, guitarras), Gabriel Mattos (baixo), Marcelo Silva (bateria) e Jonatã Müller (guitarras). A épica "Seis Níveis de Criogenia" é o ápice de criatividade do rock progressivo nacional nos últimos 20 anos, misturando bandolim, berimbau, e claro, efeitos sintetizados de moog, mellotron, hammond e outros aparatos que tanto encantam os admiradores do estilo. Fora isso, o talento individual de cada membro é excepcional, resultando em um disco redondinho e que superou o já perfeito O Casulo (2008). Segundo disco de progressivo na minha lista, e não o último. 

R.E.M. - Collapse Into Now
Quando em 2010 foi anunciado que os americanos do R.E.M. estavam gravando um novo disco, a dúvida pairava no ar. Desde New-Adventures in Hi-Fi (1995), o grupo lançava material que alternava entre o ótimo e o descartável. O último disco do grupo até então, Accelerate (2008), figurava como ótimo, e assim, o próximo álbum deveria ser considerado descartável. Pois Collapse Into Now fugiu à regra e agradou em cheio aqueles que apreciam o que o trio Michael Stipe (vocais), Peter Buck (guitarras) e Mike Mills (baixo, teclados) vêm fazendo desde que estourou no planeta inteiro com "Losing My Religion", há vinte anos. Vários são os momentos de destaque desse bonito disco, do qual recomendo três canções: "Überlin", "It Happened Today" (com participação de Eddie Vedder) e "Blue", a segunda canção do grupo contando com os vocais emocionantes de Patti Smith. Infelizmente, esse álbum também marcou por ser o último de uma das principais bandas de rock dos anos 80.

Uriah Heep - Into the Wild
Ah, que saudades dos anos 90! É o pensamento que vem à cabeça quando ouço Into the Wild, o disco lançado pelos ingleses do Uriah Heep. Depois de dez anos,  o grupo resolveu voltar a lançar discos de estúdio. Assim, em 2008 veio Wake the Sleeper, seguido por Celebrate (2009) e Into the Wild, o melhor dos três. A linha musical é similar ao que foi apresentado quando Bernie Shaw assumiu os vocais do grupo, remetendo diretamente aos bons Sea of Light (1995) e Sonic Origami (1998). Os principais destaques vão para "Trail of Diamonds", "Nail on the Head" e "Lost", nas quais os tradicionais solos com wah-wah de Mick Box, acompanhados pelo hammond certeiro de Phil Lanzon e da cozinha formada por Trevor Bolder (baixo) e Russell Gilbrook (bateria) mantém o som característico de um dos mais injustiçados grupos do hard britânico. Mais um exemplo de que é possível sobreviver no presente soando idêntico ao passado. No caso do Uriah Heep, é um passado bem recente, mas muito bom.

Wynton Marsalis e Eric Clapton - Play the Blues Live from Jazz at Lincoln Center
A passagem de Eric Clapton pelo Brasil no ano passado não foi tão alardeada, principalmente por ocorrer em um período no qual o Rock in Rio e o SWU Festival eram as principais atrações no país. Além disso, a divulgação do álbum lançado pelo guitarrista em 2011 foi precária. Sei que não era permitido tratar de discos ao vivo entre os 10 melhores do ano, mas com todo o perdão aos meus colegas consultores, Play the Blues Live from Jazz at Lincoln Center não poderia ficar de fora dessa lista de jeito nenhum. Não é apenas um disco ao vivo. É um disco ao vivo de jazz com Eric Clapton e o monstro do trompete Wynton Marsalis, acompanhados por uma ótima big band, e que é de um ineditismo tão raro, que suas canções soam todas como novas, com a diferença de que os presentes no Lincoln Center naquela noite puderam ouvir essa obra-prima. Os fãs mais fieis do guitarrista irão se apavorar com os alucinantes nove minutos de "Layla", mas os admiradores do jazz voltarão no tempo para um boteco impregnado de fumaça de cigarro, com um copo de uísque e a embriagante sonoridade de pérolas arrebatadoras como "Je Turners Blues", "Ice Cream" e "Joliet Bound". Destaque também para o resgate de duas canções de Taj Mahal, "Corrine Corrina" e "Just a Close Walk With Thee". Belíssimo álbum, como poderia ser com a união de dois gigantes da música.

Marcin Wasilewski Trio - Faithful
Ainda no jazz, os poloneses do Marcin Wasilewski Trio lançaram uma obra-prima. Conhecedores do estilo, preparem-se para se assustar com a performance de Marcin Wasilewski (piano), Slawomir Kurkiewick (baixo) e Michal Miskiewicz (bateria). Os caras detonam literalmente, e parece que estamos ouvindo um trio com os saudosos Art Tatum (piano), Slam Stewart (baixo) e Jo Jones (bateria). O trio polonês consegue alternar momentos calmos e simples (à la Keith Jarret Trio) com outros de muita experimentação e delírios instrumentais (no estilo do trio de Michel Petrucciani). Ótimo disco de jazz trio, para curtir em qualquer dia, acompanhado de bons petiscos e embriagantes drinques. Destaque para as gemas "Night Train to You", "Oz Guizos" e "Lugano Lake", que ajudam a fazer deste o melhor disco instrumental lançado ano passado. 

Van der Graaf Generator - A Grounding in Numbers
Desde a volta do Van der Graaf Generator em 2005, o grupo vem lançando um álbum a cada três anos. O primeiro deles, Present (2005), era um dos mais promissores retornos da história. Porém, em Trisector (2008), o grupo virou um trio, e a ausência do saxofonista David Jackson acabou afetando o gosto dos mais conservadores. Pois os remanescentes Peter Hammill (teclados, voz, guitarras), Hugh Banton (teclados, baixo) e Guy Evans (bateria) mantiveram o norte planejado em Trisector e arrebentaram com o fantástico A Grounding in Numbers. O sinistro órgão de Banton volta a se fazer presente, e as letras de Hammill continuam cada vez mais atraentes e inteligentes. Nada melhor para um físico do que ouvir uma canção sobre a identidade de Euler, no caso "Mathematics". Outra fantástica faixa é a épica "All Over the Place", assim como as instrumentais "Red Baron" e "Splink". Por fim, o que mais chama a atenção é a ausência de uma longa canção, sempre característica nos álbuns do grupo, mostrando que, passados mais de 40 anos desde o nascimento do Van der Graaf Generator, eles ainda são capaz de surpreender.

Robbie Robertson - How to Become Clarvoyant
A The Band foi talvez a melhor banda do Canadá, muito devido às canções compostas por seu líder, o guitarrista e vocalista Robbie Robertson, que, cercado de outros gênios da música, lançou álbuns essenciais em qualquer coleção. Seu último disco foi lançado em 1998, e essa volta repentina surpreendeu a todos. E não é que Robbie conseguiu se modernizar sem soar forçado? How to Become Clarvoyant é um disco simples, honesto, recheado de canções leves e gostosas de ouvir em qualquer situação. Trazendo participações especiais de nomes como Eric Clapton, Steve Winwood e Trent Reznor, entre outros, Robbie emociona com bonitas faixas e ótimas letras, onde os destaques maiores vão para as baladas "When the Night Was Young", "The Right Mistake", "She's Not Mine" (essa, uma mistura de U2 com Bruce Springsteen) e as lindas instrumentais "Madame X" e "Tango for Django". Um retorno digno de um dos principais nomes da música.

Menções honrosas:

Alice Cooper - Welcome 2 My Nightmare 
Anthrax - Worship Music
Black Country Communion - 2 
Chickenfoot - III
Deicide - To Hell With God
Domingos Mariotti e Fernando Motta - Reunião
Keith Jarret - Rio
Marcelo Camelo - Toque Dela
Megadeth - Th1rt3en


A surpresa

 
Çağdaş Gençlik Senfoni Orkestrası

Em busca de canções para o segundo Podcast em homenagem ao Dream Theater, descobri uma fascinante apresentação da Orquestra da Juventude Contemporânea de Istambul, na qual, regida pelo jovem maestro Eren Başbuğ, garotos e garotas interpretam diversas canções do Dream Theater em versões sinfônicas. Um espetáculo sonoro, que inclusive me levou às lágrimas em alguns momentos, demonstrando que, por trás de todas as masturbações instrumentais de John Petrucci e cia., existem sim belas e encantadoras melodias. Parabéns à Eren Başbuğ pela iniciativa, e aos membros da Çağdaş Gençlik Senfoni Orkestrası pela coragem e habilidade para interpretar as intrincadas e complexas canções do grupo americano, com destaque para o vídeo acima, no qual "Octavarium" é apresentada na íntegra.

A decepção

O não lançamento do novo álbum do Rush
Em 2010, o single com "Caravan" e "BU2B" foi o anúncio de que em 2011 seria lançado o novo álbum do Rush. A turnê "Time Machine Tour" estava promovendo as novas canções e diversos clássicos do passado. Fui ao Rio de Janeiro assistir ao trio canadense e, comprovei com meus ouvidos, que Geddy Lee não está cantando mais nada, mas está tocando muito. A expectativa ficou então para o que aconteceria em estúdio. Passou-se o ano e nada do novo álbum. Parece que em fevereiro de 2012, Clockwork Angels chegará às lojas. Esperamos que esse não seja o novo Chinese Democracy do rock.


A melhor notícia

A volta do grupo Los Hermanos

Anunciada no final do ano, foi a melhor notícia que um fã do grupo poderia ter. Claro que o quarteto carioca vem se reunindo regularmente, mas para ocasiões especiais. Agora, parece que com uma grande turnê pelo país, pode ser que um novo material surja, saciando a sede pelas canções de Marcelo Camelo, Rodrigo Amarante, Barba e Bruno Medina.


A pior notícia

A morte do guitarrista Gary Moore
Entre tantas perdas que a música sofreu em 2011, sem dúvida a mais sentida foi a do guitarrista Gary Moore. No dia 6 de fevereiro, o mundo acordou sabendo de sua morte. Dono de uma técnica impecável, que foi registrada em dezenas de álbuns perfeitos como Back on the Streets (1978), Run for Cover (1985), After the War (1989), Still Got the Blues (1990), bem como os discos ao lado do grupo Skid Row (34 Hours, de 1971), Thin Lizzy (Black Rose: A Rock Legend, de 1979) e Colosseum (Electric Savage, 1977), isso só para citar alguns, Moore foi um dos nomes mais importantes do rock irlandês, e nos deixou cedo, com apenas 59 anos. Ausência que será marcante na música a partir desse ano.

terça-feira, 12 de julho de 2011

Vãn Züllatt - Betelgeuse [2011]



Por Mairon Machado (Publicado originalmente no blog Consultoria do Rock)

Depois de três anos de expectativa, finalmente o grupo pelotense Vãn Züllatt lançou seu segundo álbum. Betelgeuse consegue a façanha de superar o trabalho inicial do grupo. Mais maduros e com uma técnica cada vez mais aprimorada, Cleber Vaz (teclados, guitarras, flautas, violão e sampler), Marcelo Silva (bateria e sampler), Gabriel Mattos (baixo, sintetizador BY5) e Jonatã Müller (guitarras, violão, flautas, teclados) mostram em um álbum espetacular o por que de o grupo estar se tornando cada vez mais conceituado não só no Rio Grande do Sul como no país.

Gravado entre agosto de 2010 e março de 2011 no estúdio Z em Pelotas, e com as participações especiais de Douglas Osinaga (guitarra) e Eugênio Bassi (voz, violão, bandolim, berimbau, contrabaixo e  percussão), Betelgeuse é apresentado pelo grupo como "um álbum instrumental conceitual baseado em ficção científica e ligeiramente influenciado pelos efeitos toxicológicos do vinho tinto. Qualquer semelhança  com qualquer outra coisa é puramente acidental", possuindo apenas quatro faixas, e com pelo menos uma delas, a suíte faixa-título, enchendo os olhos e os ouvidos em uma futura maravilha prog. 

Cleber, Jonatã, Gabriel e Marcelo

O CD narra uma história de ficção científica, onde através de intrincadas peças instrumentais, fazemos uma jornada pelo universo a bordo da nave Vãn Züllatt, abrindo com os "Contatos" estabelecidos com a vida inteligente fora da Terra. A canção com o andamento intrincado de bateria, baixo e órgão, acompanha o  tema inicial das guitarras que leva para os solos Osinaga, com muitas notas velozes e setentista ao extremo. A sequência de escalas é fantástica, assim como o emprego do wah-wah, e um pequeno tema leva ao solo do órgão, que irá lembrar-lhe dos grandes momentos de Jon Lord no Deep Purple, voltando para o tema inicial das guitarras, com  Marcelo e Gabriel fazendo a precisa marcação para os viajantes acordes de moog. Keith Emerson está no seu quarto nesse momento. Depois da viajante sessão de teclados, um curto tema da guitarra com wah-wah encerra a canção.


Chegamos no penoso processo de criogenia humana, com barulhos diversos abrindo a pequena suíte "Seis Níveis de Criogenia". Percussão e berimbau fazem o belo tema introdutório do primeiro nível de criogenia, seguido de um duelo entre berimbau e percussão. Vozes trazem um tema no bandolim (o segundo nível), acompanhado de barulhos percussivos, que passam a fazer a mesma melodia do bandolim, chegando ao surpreendente e belo solo de piano do terceiro nível. As escalas clássicas são encantadoras, e a guitarra chorando ao fundo dá um toque mais dramático ao belo tema dessa sessão.


A flauta surge acompanhando o tema do piano, levando então para o quarto nível de criogenia, que é um belíssimo solo de violão clássico. Vozes aparecem no meio do solo, que transforma-se em uma linda sequência de acordes, com um ritmo que lembra muito as canções do compositor baiano Elomar. Emocionante é o que pode se dizer para os acordes do violão nessa parte da canção, chegando então no quinto nível, onde um violão jazzístico e batidas nos pratos fazem o suave tema de uma ballad-jazz, com solos de violão e flauta. 

Assim, as mesmas vozes anteriores chegam para o sexto nível, voltando para as percussões e o solo de berimbau de Eugênio. O clima é pesado no solo, e as percussões dão ritmo para que o berimbau seja estraçalhado em notas pesadas, com o chocalho sendo o complemento da criogenização de seu cérebro, encerrando com um cântico africano acompanhando o ritmo do berimbau.


Para fazer a jornada pelo universo, o Vãn Züllat recebe uma "Dica",  uma canção apenas com a participação de Cleber, onde ele retorna ao piano para fazer um solo memorável. Suavemente, somos levados para três minutos e 30 segundos de encantadoras notas, executando um tema digno dos grandes momentos de Chopin (não estou exagerando, o solo é muito belo).


A viajante capa de Betelgeuse



Após a "Dica", começamos nossa viajem de ida e volta à constelação de Órion através da longa suíte "Betelgeuse". Dividida em onze partes, ela abre com barulhos viajantes simulando um foguete espacial na introdução da canção, chamada "Desconectando", saindo da Terra em direção a Órion, com o piano aparecendo em um solo rápido. Baixo e bateria aparecem em "Marte", para a guitarra fazer um curto tema, que é repetido algumas vezes, trazendo o solo de moog, já em um ritmo cadenciado da guitarra e da cozinha Marcelo/Gabriel. O solo do moog é repetido, e assim, a pesada guitarra faz o tema que o moog havia nos apresentado, para intervenções de guitarra, flauta e moog surgirem durante o andamento, bem como viradas da bateria e vozes.

O moog sola novamente, para a guitarra entrar em "Rumo A Saturno" com um solo leve, acompanhado pelo andamento suingado da bateria, do baixo e do piano elétrico, tendo o moog ao fundo, e variando para as breves intervenções onde temos curtos solos de órgão. Os sintetizadores então transformam a canção em "Os Piratas de Órion", para uma pesada sessão, onde o riff do sintetizador transforma-se em um pesado riff de guitarra, com direiro a um solo de moog, e com Marcelo soltando o braço na bateria. A canção ganha ritmo, atingindo uma velocidade interessante, alternando entre o andamento marcado e pesado com esse trecho mais rápido.  


O Vãn Züllat vai diminuindo o ritmo, chegando em "Buraco de Minhoca (a Ida)" onde o tema inicial de "Desconectando" é repetido pelo moog, porém com um solo de piano sendo acompanhado pela cadenciada levada de bateria. Os barulhos espaciais surgem, onde a sobreposição de teclados nos dá a impressão de estarmos enlouquecendo, estourando em uma imponente apresentação de sintetizadores e mellotron chamada "Betelgeuse (A Visão)", onde a guitarra faz um lindo tema com o slide, e o emprego do mellotron é merecedor de aplausos por parte de Mike Pinder (Moody Blues) e Robert Fripp (King Crimson).


Vãn Züllat ao vivo

Lentamente, piano, baixo e bateria passam a acompanhar o solo de moog em "À Deriva", com a entrada do órgão permitindo que a guitarra sole. Marcelo faz viradas na bateria, em um ritmo floydiano que poderia ter sido mais bem explorado com batidas mais quebradas, na linha de Bill Bruford (Yes, King Crimson, ...), mas o andamento encaixa-se para o retorno a Terra em "O Planeta Azul (O Devaneio)", com um belo tema do moog destacando os teclados wakeanos e as interessantes intervenções do sintetizador, os quais parecem gerar problemas na nave espacial.


Vozes assombrantes nos fazem passar pelo "Buraco de Minhoca (A Volta)", com  o moog relembrando o tema inicial de "Desconectando", para vozes diversas aparecerem. Um tema marcado entre guitarra, baixo e sintetizador é executado entre diversas viradas da bateria, durante "No Cinturão de Asteróides", com um show a parte de Marcelo, levando ao agitado solo da guitarra, acompanhado por piano elétrico, baixo e bateria. Um curto solo de flauta é executado, com intervenções de moog e sintetizadores, para os barulhos iniciais do foguete espacial surgirem novamente em "Atração Gravitacional", encerrando a viagem retornando com total segurança para a Terra.
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