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sábado, 27 de abril de 2024

Consultoria Recomenda: Invasão Britânica



Editado por André Kaminski

Tema escolhido por Davi Pascale

Com Anderson Godinho, Daniel Benedetti, Fernando Bueno*, Líbia Brígido, Mairon Machado e Marcello Zappellini

Uma bela seleção de discos clássicos sessentistas aparece neste Recomenda, focado nas bandas do movimento conhecido como "Invasão Britânica", liderado principalmente pelos Beatles, Rolling Stones e The Who. Mas tirando esses gigantes, a Invasão Britânica da América teve muito mais bandas, tanto grandes como pequenas, que fizeram algum sucesso ou lançaram seus discos por lá. O que achou de nossa seleção? Comente lá embaixo!


Herman's Hermits - Both Sides of Herman´s Hermits [1966]

Por Davi Pascale

A British Invasion também ficou marcada com a presença de grupos mais pops. Dentre esses, sempre gostei muito do trabalho realizado pelo The Hollies, pelo Gerry & The Pacemakers e pelo Herman´s Hermits. Pensei muito em qual álbum indicar porque, assim como acontecia com os The Beatles, a discografia norte-americana (e também, a brasileira) eram, muitas vezes, álbuns criados para aquele país misturando algumas músicas do disco em questão com as músicas lançadas nos compactos. Queria indicar um álbum como foi concebido e comecei a revirar o tracklist (muitos desses discos tenho a versão norte-americana na minha coleção) e notei que nesse LP continha “Bus Stop”, uma faixa que tocou bastante aqui no Brasil. Além dessa, também gosto muito de “Listen People”, “The Story of My Life”, “When Where You When I Needed You” e “Dial My Number”. Disco bem bacana e que difere um pouquinho dos álbuns indicados aqui, que são espetaculares, mas são mais focados no blues ou na psicodelia.

Anderson: Nesse álbum as melodias cativantes, alegres e a simplicidade das músicas apresentam um cenário mais atrelado ao pop rock, algo mais palatável não tão agressivo com distorções ou vocais mais elaborados. Elementos distintos de outras bandas já comentadas e que justamente por isso posicionam o Herman’s Hermits em um espectro um pouco diferente das demais citadas ao meu ver. Dentre as mais interessantes citaria a boa Bus Stop que na verdade é um cover da banda The Hollies e a animada Dial My Number. No geral foi o material que menos me empolguei em reouvir, mas deve-se destacar que participaram do movimento da Invasão Britânica com alguma relevância.

André: Não faz muito tempo que eu conheci este álbum. Eles pegam por um lado mais pop do que rock em seus discos, mas o fazem com uma qualidade exemplar, caso deste disco.

Daniel: Não conhecia. É aquela sonoridade bem Beat, mas, aos meus ouvidos, soou excessivamente adocicada. Não é pra mim.

Líbia: Esse grupo também não era do meu conhecimento. Eles tem uma variedade de estilos bem variados, explorando muitos estilos em evidência na época de lançamento. Tem muita qualidade em suas músicas. A que mais se destacou para mim foi a “Where Were You When I Needed You”, quando ouvi senti algo familiar nos primeiros acordes, e lembrei imediatamente da “Crystal Light” do UFO, lançada anos depois. Deixando de lado essa observação, achei todo o conjunto musical muito bom, os vocais aqui estão mais entregues ao coração assim como todo o restante da banda, a dinâmica da música é muito boa. Se eles seguissem essa linha em todo o restante do álbum seria mais incrível.

Mairon: Eita. Não lembro a última vez que ouvi este disco. Deve ter sido lá no final de 2007, início de 2008, por aí. Era uma época onde os blogspots da vida estavam bombando, assim como vários grupos do Orkut traziam links para baixar discos diversos, e eu me divertia conhecendo muita coisa boa de diversos estilos. Quando coloquei aqui para tocar, lembrei na hora do choque que tomei ao ouvir o baixão e o peso de "Little Boy Sad", com o arranjo vocal interessantíssimo, mas depois o disco não segue assim. Ao longo de pouco menos de meia hora, o que se sobressai são arranjos vocais espetaculares, e um instrumental bem fraquinho, como atestam "Bus Stop", "Dial My Number" e "Where Were You When I Needed You?". É legal ouvir Herman (Peter Noone) cantando em francês tosquinho de "Je Suis Anglais (L'autre Jour)", mas a sua voz acaba se tornando as vezes irritante. O solo de guitarra de "For Love" é no mínimo constrangedor. Melhor faixa para o rockaço de "My Reservation's Been Confirmed". Obrigado ao consultor que recomendou esse disco (ouvi a versão britânica por sinal) por me fazer dar algumas risadas lembrando de um passado não muito distante.

Marcello: A banda de Peter Noone nunca me chamou a atenção, para ser honesto, mas o cantor tem meu respeito, afinal ele foi o primeiro a colocar nas paradas “Oh! You Pretty Things”, de David Bowie. Além do ótimo Noone nos vocais (à época com 19 anos, mas já um intérprete maduro e com boa variação de voz), o grupo incluía Derek Leckenby e Keith Hopwood nas guitarras, Karl Green no baixo e Barry Whitwam na bateria, que lidera uma versão da banda até hoje. O forte da banda eram os arranjos vocais, mas as guitarras não comprometem, destacando-se nas várias músicas. Este é o segundo LP inglês (e o quarto americano) da banda e traz doze músicas, na maioria covers, e teve como grande sucesso “Leaning on a Lamp Post” (o que não dá de entender, porque a música é bem enjoadinha). O álbum começa com as guitarras surpreendentemente pesadas de “Little Boy Sad”, um dos seus destaques, junto com “My Reservation’s Been Confirmed”, “For Love”, a curiosa “Je Suis Anglais” – que deveria ter feito sucesso na França, com Noone arriscando-se no francês, e a bela baladinha “Listen People”. Por outro lado, a versão de “Bus Stop” (de Graham Gouldman), é mais fraca do que a do The Hollies (e confirma que Bobby Elliott era um dos melhores bateristas da cena britânica nessa época) e “All the Things I Do For You” soa como um pastiche de Bob Dylan imitando os Beatles tentando fazer uma música dylanesca. As demais músicas não se destacam, mas também não comprometem. No todo, o disco é bom, mas sofre do mesmo problema que a esmagadora maioria das bandas da época: as coletâneas são melhores. E apesar de suas qualidades, o Herman’s Hermits não figura alto na lista das bandas inglesas dos anos 60.


The Kinks - Kinks [1964]

Por Anderson Godinho

Acredito que o The Kinks represente muito bem essa fase de virada cultural que ocorria no Reino Unido dos anos 1960: uma banda de irmãos e amigos já envolvidos na cena musical, que buscavam seu lugar ao sol através de uma sonoridade que passa por Folk, Blues, R&B e moldava a cara do tal Rock ‘n’ Roll. O debut autointitulado da banda traz um material muito eclético e interessante, são poucos mais de 30 minutos que apresentam uma síntese da banda e abriria um leque de possibilidades para seu futuro à época. Praticamente todas a músicas são muito boas no que apresentam. Desde as animadas misturas folk/blues como So Mystifying e I’m a Lover Not a Fighter, passando por aquele toque de rockabilly de I Took my Babe Home. Dentre as autorais, uma vez que o algum é composto por covers, Stop Your Sobbing atende a demanda por baladas românticas. Agora, se o Kinks alçou voos altos na carreira com certeza a pérola You Really Got Me foi a principal responsável! A música, ainda hoje aclamada, alcançou ótimos números logo após o lançamento do material e apresentou algo realmente empolgante e, porquê não dizer, a frente se sua época. Fato é que após esse belo debut, a banda lançaria mais de 20 álbuns até pelo menos os anos 1990.

André: Gosto bastante do Kinks e de sua atitude mais despojada ao compor e gravar suas músicas. É um álbum da invasão britânica, todavia, sem o mesmo brilho dos gigantes Beatles, Stones e Who. A banda melhoraria muito a partir do terceiro disco para frente. Daqui me agrada as versões deles para "Long Tall Shorty" e "Bald Headed Woman". Suas poucas composições próprias me passam despercebido e os outros covers são bem inconsistentes. Disco no melhor dos dias, mediano.

Daniel: A banda dos irmãos Davies em seu primeiro trabalho já mostrava a que veio. Em um misto de composições originais e várias versões, o álbum é muito divertido. Só “You Really Got Me” já valeria a audição, mas o disco é bem mais que isso. O “alto-astral” do álbum nem vislumbra a animosidade que Ray e Dave desenvolveriam ao longo do tempo. Bela indicação.

Davi: É realmente impressionante constatarmos quantos músicos dessa geração foram influenciados pelo saudoso Chuck Berry. Em seu álbum de estreia, os Kinks traziam duas regravações desse que é considerado o pai dos riffs. O hit “Too Much Monkey Business” aparece em uma versão bem mediana e bem inferior à registrada pelo rei do rock Elvis Presley. Já “Beautiful Delilah”, responsável por abrir o LP, ficou fenomenal e é um dos grandes destaques do disco. Assim como os Stones e os Pretty Things, eles misturam releituras com números originais e o mais bacana é que os grandes destaques ficam por conta das autorais “So Mystifying”, “Stop Your Sobbing” (que anos mais tarde voltaria às paradas com uma versão fenomenal dos Pretenders) e “You Really Got Me” (que anos mais tarde voltaria a causar barulho com a incrível regravação do Van Halen). Um bom disco dessa grande banda.

Líbia: Neste registro, os Kinks ainda estão buscando sua identidade sonora. É evidente a presença de diversas influências de artistas de Rhythm and Blues que os inspiraram. No entanto, se há uma faixa que se destaca é a "You Really Got Me". Essa música, de muitas maneiras, é a raiz do surgimento do punk rock. Além disso, Dave Davies é um dos pioneiros do efeito Fuzz na guitarra, pois é conhecido por ter cortado os cones dos alto-falantes de seu amplificador para obter um som distorcido, o que acabou criando esse efeito, e influenciou muitos músicos depois dele.

Mairon: Fabulosa estreia dos caras, trazendo fortes inspirações no blues e no rock 'n' roll americano. Logo de cara, "Beautiful Delilah" surge como que saída de algum álbum perdido de Elvis Presley. Acho a banda muito similar ao que os Stones faziam na mesma época, vide os vocais despojados de "Got Love If You Want It",  "Long Tall Shortly" e "I'm A Lover Not A Fighter", ou as vocalizações de "I'm Been Driving on Bald Mountain" e "So Mystifying". Ou mesmo quando enveredam para baladinhas, como "Just Can't Go to Sleep" e "Stop Your Sobbing", e rockzinhos animados, tais como "I Took My Baby Home" e o cover para "Too Much Monkey Business" (Chuck Berry), parece que falta algo que seus colegas tinham (técnica talvez?). Acabei pegando a versão britânica para ouvir, e nela, o lado B é bem melhor. Gosto da harmônica em "Cadillac", falando de carros como muitos à época, a pegada de "Revenge", bela pauladinha instrumental, e também a cômica "Bald Headed Woman". O lado A por outro lado traz uma obra prima do calibre de "You Really Got Me", imortalizada pela voz de David Lee Roth e a guitarra de Eddie Van Halen, e que é disparada a melhor canção do disco, totalmente diferente das demais, com ótimos vocais e um belo solo de guitarra (para a época muito "audacioso"). As críticas não diminuem a qualidade de Kinks. Somente os coloca um nível abaixo dos gigantes Stones, Beatles e claro, Yardbirds. A banda se tornaria bem maior na segunda metade dos anos 60 e início dos 70, mas isso é para outro Recomenda talvez.

Marcello: The Kinks seria a banda mais britânica de todas as que compõem a chamada “British Invasion”, mas isso ainda não estava nítido nesta época. Os irmãos Ray e Dave Davies, mais Peter Quaife (baixo) e Mick Avory (bateria – antecedeu Charlie Watts numa das primeiras versões do que se tornaria os Rolling Stones), gravaram 14 músicas nessa estreia britânica, sendo seis covers de músicas americanas, duas do produtor Shel Talmy (que também trabalhou com o The Who) e o resto era de Ray Davies. E são do vocalista e guitarrista rítmico as músicas mais conhecidas do álbum, “You Really Got Me” e “Stop Your Sobbing”. O álbum abre com “Beautiful Delilah”, de Chuck Berry, com os Kinks soando quase como uma banda punk! Curiosamente, a primeira música é cantada por Dave Davies e não por Ray. As primeiras músicas de Ray no álbum, “So Mistifying” e “Just Can’r Go To Sleep”, são bem mais interessantes, ainda um pouco imaturas, mas não se pode esquecer que eram composições de um garoto de 19-20 anos. E o resto do lado A segue com rocks sessentistas bem simpáticos (“I’m a Lover Not a Fighter” é uma cópia de “You Can’t Catch Me”, de Chuck Berry, e traz Dave no vocal principal e Ray no seu único solo de guitarra em todo o álbum), até chegar na monumental “You Really Got Me” e sua guitarra distorcida, grande sucesso do disco. A curta “Revenge” traz Ray na harmônica, e os vocais são apenas para fazer efeito. Outra de Berry, “Too Much Monkey Business”, é mais tradicional e mais próxima do original. “Bald Headed Woman” e “I’ve Been Driving on Bald Mountain” são composições de Shel Talmy, e têm pouco destaque, deixando apenas a pergunta de por que tanta preocupação com carecas. A linda “Stop Your Sobbing” vem em seguida, mostrando que os Kinks só tinham a ganhar se investissem nas músicas de Ray. O álbum original termina com “Got Love If You Want It”, clássico do blues que trocentas bandas gravaram.  A edição DeLuxe traz quase meia hora a mais de música, incluindo outro clássico de Ray Davies, “All Day and All of the Night”. Considerado no todo, “The Kinks” não figura muito alto numa lista de melhores álbuns da banda, mas é um disco honesto, enérgico e que já deixava entrever o talento de Ray Davies para composição. Coisas melhores viriam, mas é aqui que tudo começou.


 

The Animals - The Animals [1964] (British Album)

Por Marcello Zappellini

O primeiro LP britânico não traz “The House of the Rising Sun”, que catapultou a banda ao estrelato, diferentemente do americano. Mas escolhi essa versão porque ela capta melhor a energia primitiva do The Animals, a banda que tirou seu nome da reação do público aos seus shows caóticos (o grupo se chamava The Alan Price Set). A formação é a clássica com Eric Burdon nos vocais, Alan Price nos teclados, Chas Chandler no baixo, Hilton Valentine na guitarra e John Steel na bateria, e o repertório é praticamente todo formado por covers de artistas americanos de blues e rhythm’n’blues. A primeira coisa que você ouve ao colocar o disco para tocar é o órgão de Price, grande destaque instrumental da banda, abrindo “The Story of Bo Diddley”, letra de Burdon sobre a famosa “Bo Diddley Beat” – com direito a uma citação de “A Hard Day’s Night”. Na sequência, o que se tem são clássicos de John Lee Hooker (“Dimples”, “I’m Mad Again” e “Boom Boom”), Fats Domino (“I’ve Been Around”, “I’m in Love Again”), Chuck Berry (“Memphis Tennessee” e “Around and Around”), Ray Charles (“The Right Time”), bem como outras composições extraídas da mina de ouro da música americana (“She Said Yeah”, “Bury my Body” e “The Girl Can’t Help It”). As comparações com os Stones, que mineravam o mesmo catálogo, são inevitáveis: “She Said Yeah” e “Around and Around” se saem melhor com o quinteto londrino de Jagger e Richards, mas “Memphis Tennessee” ficou melhor com a turma de Newcastle capitaneada por Burdon e Price, especialmente porque a voz de Eric se casou melhor com a música do que ade Mick Jagger. Os destaques, para mim, ficam com “Dimples” e “The Girl Can’t Help It” (ambas com direito a belos solos do eternamente subestimado Valentine), “I’m Mad Again” (Burdon na sua melhor forma), o órgão de igreja de Price em “The Right Time”, perfeita para a voz de Burdon, e “Boom Boom” – o velho John Lee deve ter curtido essa versão. “The Animals” não traz a música que tornou a banda um sucesso, mas é mais próximo do que eles faziam no palco do que “The House of the Rising Sun”.

Anderson: Assim como era praxe na época, muitas alusões ao blues e ao folk derivados dos EUA, bem como, versões e homenagens. Nesse álbum o The Animals apresenta alguns dos elementos que o caracterizam como banda, como: o contrabaixo e os teclados. Agora, não é possível pensar em The Animals e não ouvir a poderosa voz de Eric Burdon! A abertura do disco é Story Of Bo Diddley e apresenta uma narrativa que contextualiza todo esse cenário de reinvenção e expansão do rock britânico a partir da breve história de Bo Diddley. Logo na sequência um dos destaques do disco, a poderosa Bury my Body que apresenta um som pesado com Eric Burdon destruindo! Dentre algumas coisas mais calmas ou românticas, destaco, o bom blues I’m Mad Again muito intensa que apresenta uma crescente bem interessante. Por fim, a agitada e animada She Said Yeah. Dentre todas essas bandas do período o The Animals é uma que não pode faltar. Uma bela pedida.

André: Tirando a primeira faixa, mais covers. Porém, diferente dos Kinks, os Animais aqui fazem versões muito boas ou até mesmo melhores que as originais dando praticamente uma geral naquilo que seria o início do rock 'n' roll da década anterior. Acho "Bury my Body" e "I'm Mad Again" belíssimos hinos de uma época em que ninguém sequer consegue copiar mesmo com toda a tecnologia de hoje.

Daniel: Fazia muito tempo que eu não ouvia este disco, mas me recordo de que, quando o fiz, não havia me marcado muito. Talvez o fato de que o ouvi logo após a audição do álbum dos Kinks tenha prejudicado minha experiência, mas a realidade é que não me comoveu (novamente). Ah, eu curto a ótima versão para “I'm in Love Again”.

Davi: O álbum de estreia do The Animals, assim como os primeiros álbuns do The Rolling Stones, era focado em releituras do blues. A única exceção aqui é a faixa “The Story of Bo Diddley”, onde os músicos tentaram reproduzir, inclusive, a batida que o cultuado guitarrista utilizava em suas canções. Essa música acho meio sem sal, mas o disco é excelente e tem várias versões que são memoráveis. “She Said Yeah”, “Dimples” e “Bury My Body” se destacam ao lado da inconfundível voz de Eric Burdon. Muitos críticos o consideram uma das grandes vozes do rock e diziam que ele fazia parte do time de "cantores brancos que tinham voz de cantores negros", assim como acontecia com Joe Cocker. Concordo com ambas as afirmações.

Líbia: Um álbum de R&B/Rock muito sólido. A cada faixa, descobrimos novas camadas, destacando a maestria dos membros em capturar a essência desse gênero musical. Faixas como 'Boom Boom' e 'She Said Yeah' foram posteriormente regravadas por muitas outras bandas, mas suas versões sempre se destacam como uma das melhores. O mesmo pode ser dito de 'The House of the Rising Sun', que está na versão americana deste álbum. As músicas de blues se destacam. Em 'I'm Mad Again', Burdon mostra do que é capaz vocalmente.

Mairon: Os Animals durante muito tempo frequentaram audições regulares em meu Media Player. Baseada no blues e R & B americano, a estreia britânica é muito boa, e inova começando com uma faixa de 6 minutos homenageando Bo Diddley na genial "Story of Bo Diddley", contando a história de um dos nomes mais importantes do blues, um dos pais do rock, sobre uma de suas bases mais conhecidas. Letra fantástica! As revisões fogem um pouco dos cantores tradicionais, indo de Fats Domino ("I've Been Around" e "I'm In Love Again") até John Lee Hooker ("Boom Boom", "Dimples" e "I'm Mad Again") e Chuck Berry ("Around and Around" e "Memphis Tenesse"), ou seja, os caras estavam ligados na cena americana dos anos 40 e 50, levando esses artistas para uma nova geração de jovens britânicos com um ar que segue as linhas originais, onde a voz de Eric Burdon se destaca. Porém, o grande diferencial dos caras, além da genialidade de Burdon, era o órgão de Alan Price. Aquele som que nos acostumamos a ouvir no The Doors de 1967 já estava em voga com ele em 64, se sobressaindo em "Boom Boom", "Bury My Body" e "The Right Ime". Na citada "I'm Mad Again", certeza que antes da voz de Burdon entrar você irá pensar "Olha o Doors fazendo mais um blues aí". Pois é meus caros, a origem vem da velha ilha, e que baita solo de órgão!  Um disco de 40 minutos, que para 64 era uma eternidade, onde não há o que tirar nem por. Espetacular!


The Pretty Things - Get the Picture [1965]

Por Líbia Brígido

Um dos grupos muitas vezes esquecidos das primeiras bandas da Invasão Britânica é o The Pretty Things. A ideia principal por trás do álbum era fazer um filme que mostrasse a banda um pouco como os Beatles haviam feito, a fim de oferecer uma boa promoção para a banda. Infelizmente, devido provavelmente à falta de tempo e financiamento, o filme só foi lançado em 1966 e não atendeu às expectativas comerciais. O som não é tão claro, mas isso não é um grande problema para mim. A faixa de abertura "You Don't Believe Me" é uma das minhas favoritas, uma música que não ficaria fora de lugar em discos de meados dos anos 60 dos Beatles ou Stones. As melhores músicas estão no final das faixas bônus. "Come See Me" e "L.S.D." são excelentes.

Anderson: Essa banda eu particularmente não conhecia, assim como muitas outras possíveis pérolas da chamada Invasão Britânica. Trata-se de um rock ‘n’ roll bem clássico que se mantém presente por toda a sonoridade do álbum. Por exemplo, o simples, mas, bem interessante solo de Get the Picture, bem como as distorções e melodias presentes em outras músicas como You'll Never Do It Babe ou Can't Stand the Pain, essa que, por sua vez, soa mais introspectiva do que as demais. Poderia ser uma música do Animals ou mesmo quem sabe estar em um álbum do Blue Oÿster Cult. É um disco interessante, com um rock and roll mais consolidado que outros dessa geração, mesmo dentre os que ouvimos nessa lista, mas não é o que mais me agradou. Muitas músicas simplistas demais, fracas, muitas baladas e um vocalista (Phil May) um tanto sem sal. Porém, fica a oportunidade de conhecer e quem sabe ir mais a fundo em tal banda.

André: Sou mais chegado à sua fase mais psicodélica de uns anos depois, mas nesse período ainda garageiro eles ofereciam ótimas composições que não deviam em nada à sua melhor fase. "You Don't Believe Me" que abre o disco e "Gonna Find Me a Substitute" que fecha o lado B são grandes rocks da época e a banda cresceria ainda muito mais nos álbuns seguintes.

Daniel: Este eu nunca havia ouvido. Parabéns a quem o indicou, curti muito. Os solos de Dick Taylor são bem legais e a sonoridade que funde o Blues e o Rock, de maneira até meio “inocente” (na falta de um termo melhor) são cativantes. “We'll Play House” é uma música muito legal!

Davi: Esse álbum foi minha porta de entrada no universo do Pretty Things. Lembro que peguei o CD para ouvir por conta de “You Don´t Believe Me”, música que haviam composto em parceria com o grande Jimmy Page (sim, o próprio). Essa banda sempre foi muito comparada aos Stones e a comparação faz sentido. Eles percorriam o mesmo território explorando uma sonoridade que era, basicamente, um blues mais eletrizado, digamos assim. As linhas vocais de Philip May, por vezes, remetem ao Mick Jagger. Um grande exemplo seria a regravação do blues de Jimmy Witherspoon, “I Had a Dream”. Um grande diferencial é que eles arriscavam mais com composições próprias e, dentre essas, a minha favorita atualmente é “Cry to Me”. Bom disco.

Mairon: Segundo álbum do grupo, mantém a linha de canções simples que o rock vindo da ilha tinha. A diferença do Pretty Things para outros grupos da British Invasion se dá no vocal dramático de Phil May, vide faixas como a faixa-título, os gritos de "I Want Your Love" e "You'll Never Do It, Baby" ou "You don't Believe In Me", o que dificilmente encontraremos em Beatles ou Stones por exemplo. A harmonia bluesy, também bastante presente nas demais bandas, aqui surge de uma forma um tanto quanto experimental, como atestam "Cry To Me" e "Can't Stand the Pain", além da versão empolgante de "I Had a Dream". E claro, baladinhas para alegrar as meninas também levantam o braço marcando presença, através de "Rainin' In My Heart". Gosto da forma como a guitarra é usada em "Buzz The Jerk" e "We'll Play House", com boas distorções, e do uso do violão na agitada "London Town" . Tudo simples, sem muita técnica ou virtuose, mas redondinho. Melhor faixa ao meu ver é a versão de " "Gonna Find Me a Substitute", original de Ike Turner, e que resume muito bem essa fase inicial dos caras, com todas as características que citei acima. Único ponto negativo é que em 30 minutinhos a coisa acaba, deixando um gostinho de "faltou mais" para saborearmos um belo disco, mas que é um aperitivo entre tantas guloseimas aqui recomendadas. O tempo iria mudar (e muito) a carreira da banda, e S. F. Sorrow, de 1967, fez grande diferença aqui.

Marcello: Banda formada por Dick Taylor após deixar os Rolling Stones, e pelo vocalista Phil May, cujo nome saiu de uma música de Bo Diddley, não da (inexistente) beleza dos meninos. O grupo se completava com o guitarrista Brian Pendleton, John Stax no baixo e um monte de bateristas envolvidos na gravação (Viv Prince, Bobby Graham e Twink Alder). “You Don’t Believe Me” foi coescrita por Jimmy Page, que a produziu (e nos anos 70 assinou a banda com a Swan Song Records). “Buzz the Jerk” e “Get the Picture” são ótimos rocks de garagem, com guitarras na medida e bateria pesada, somados ao vocal canalha de Phil May. A bluesy “Rainin’ in my Heart” soa muito como Stones tocando blues no começo de carreira e, embora seja altamente genérica, é uma música bem gostosa de ouvir por causa do charme tosco dos Pretty Things. “You’ll Never Do it Baby” traz um bom trabalho de guitarras, indicando que Dick Taylor era melhor do que poderia pensar à primeira vista. Mas “I Had a Dream” é muito parecida com “The Night Time (Is the Right Time”) de Ray Charles, e soa meio deslocada – até porque na sequência “I Want Your Love” é bem interessante (e o solo lembra um pouco o de “The Last Time”, dos Stones – mas não sei quem copiou quem nessa história! Falando em Stones, “Cry to Me”, de Solomon Burke, foi regravada também por eles, numa versão que eu acho bem melhor, com Keith Richards se destacando nas guitarras. Mas, verdade seja dita, essa também ficou bacana. O disco se encerra com “Gonna Find me a Substitute”, outro rock bem interessante, com May e Taylor se destacando. Fazia bastante tempo que não ouvia The Pretty Things dos anos 60 (tenho apenas o “Silk Torpedo” em minha coleção). Este álbum me motivou a buscar mais coisas deles dessa época.


The Yardbirds - Having a Rave Up With The Yardbirds [1965]

Por Mairon Machado

Se é para falar de discos para conquistar o mercado americano, nada mais apropriado que Having a Rave Up With The Yardbirds. Voltado única e exclusivamente para os US, este álbum apresenta o talento de Jeff Beck ao mundo. E o cara chega mandando ver com sua guitarra carregada de efeitos e muito mais técnica que Eric Clapton. Além disso, Os Yardbirds eram diferentes de todas as demais bandas não só por revelar Eric Clapton, Jeff Beck e Jimmy Page, mas também por ter em suas composições muito mais do que inspirações bluesísticas, que até surgem na revisão de "I'm a Man", com Keith Relf mandando ver na harmônica, mas com Beck se sobressaindo no solo carregado de efeitos, ou na pancada "Train Kept A-Rollin". E é aqui o toque que faz a diferença no som dos Yardbirds. Os caras exalavam rebeldia e talento para compôr, colocando no bolso os demais fazendo músicas atemporais com muita inventividade e improvisos que ninguém tinha coragem de fazer nesta época, o que para mim a torna simplesmente a maior banda da British Invasion. Essas composições diferenciadas são observadas na beleza psicodélica de "You A Better Man Than I". Colocar Sitar na introdução e no riff de "Heart Full of Soul" não basta para lhe provar isso, então choque-se com os cantos gregorianos de "Still I'm Sad". Não tem como não soltar um "puta que pariu" quando se ouve a primeira, a segunda, a milésima vez de "Still I'm Sad". Quem fez algo tão triste no rock antes de 1965? Que música encantadora! E como é bom ouvir o solo de "Evil Hearted You", e as vocalizações sutis por trás da voz chorosa de Relf. O lado B é um compilado de quatro faixas da estreia Five Live Yarbirds ("Smokestack Lightning", "Respectable", "I'm A Man" e "Here 'Tis") que ainda não haviam saído nos EUA, agora com Clapton na guitarra, e bem mais blues do que o ardente lado A, mas não menos incrível. Discaço!

Anderson: Bom, escola básica do Rock and Roll: Yardbirds. Você precisa conhecer e ponto. Esse álbum em específico conta com Jeff Beck substituindo Eric Clapton, ou seja, trata-se de algo grande. Dentre as músicas da banda, uma vez que os covers eram muito comuns nas gravações da época, logo na primeira faixa uma pedrada daquelas: Mr. You're a Better Man Than I traz um rock and blues muito poderoso que dita a regra do que viria na sequência. Heart Full of Soul é outro som maravilhoso, com algumas experimentações e ritmo marcante com uma pegada um tanto folk, sensacional. Na animada The Train Kept A-Rollin mais um clássico Rock ‘N’ Roll traz uma capacidade de envolver o ouvinte que irá perceber o que aconteceu quando a música acabar, muito bom! Poderia comentar sobre os ótimos blues, solos, gaitas, melodias... mas deixo a surpresa para quem for conferir! Vale a pena!

André: Aqui não tem erro tendo dois grandiosos guitarristas como Jeff Beck e Eric Clapton cada um em um lado do disco (Beck em estúdio, Clapton no ao vivo). Todo guitarrista deveria pegar esse disco e ouvir umas 10 vezes seguidas para ver se inculca em sua mente um pouco da verdadeira arte de se tocar guitarra. Não dá de destacar uma faixa aqui, o disco todo é excelente.

Daniel: Yardbirds é, de longe, minha banda preferida nesta lista. Sempre admirei a capacidade do grupo em pegar canções de terceiros e as transformar em uma espécie de nova música, imprimindo a personalidade do conjunto em suas versões. Também, uma banda que tinha Jeff Beck, Eric Clapton e Jimmy Page não foi qualquer uma.

Davi: Em seu segundo registro, os músicos passavam por um período de transição. Saía o fenomenal Eric Clapton, para a chegada do igualmente fenomenal Jeff Beck. E isso está contado no disco. Como assim? O lado A traz 6 registros, em estúdio, ao lado de Beck. Já o lado B são 4 músicas ao vivo com a guitarra de Clapton. A mudança de estilos também é sentida. O lado A traz uma pegada mais rock psicodélico tendo como destaques as inesquecíveis “You´re a Better Man Than I”, “Heart Full of Soul” e “I´m a Man”. O lado B, por outro lado, tem uma pegada mais blues, mais R&B, tendo como destaque “Smokestack Lightning”. Quando for ouvir, além das guitarras, reparem no trabalho vocal e no trabalho de harmônica de Keith Relf. Muito se fala, compreensivelmente, dos guitarristas que passaram pelo grupo, mas ele também era um diferencial na banda.

Líbia: É incrível como esse grupo jovem soava sofisticado e como eles eram originais. Em 1965, a maioria dos grupos não podia deixar de ser influenciada pelos Beatles, mas os Yardbirds tinham uma abordagem única. Uma das minhas favoritas desse registro é a "Evil Hearted You" que segue com uma melodia memorável e um maravilhoso trabalho de guitarra de Beck. Outra surpreendente é a “Still I’m Sad” que combina backing vocals no estilo canto gregoriano, um arranjo musical parecido com Ennio Morricone e uma ótima performance vocal principal.

Marcello: Um LP americano, pois na época a banda não tinha cacife para bancar um 12 polegadas (alguém aí chegou a ver essa denominação?) na Inglaterra – até porque o único LP britânico até então, “Five Live Yardbirds”, tinha fracassado comercialmente. Formado por músicas antigas, gravadas com Eric Clapton, e novidades com Jeff Beck, “Having a Rave Up...” é um daqueles discos para você fechar os olhos e viajar no som. O lado A é praticamente irrepreensível, sendo difícil destacar alguma música: “Evil Hearted You” traz guitarras extremamente pesadas para sua época, “Still I’m Sad” traz o canto gregoriano como influência (com direito a Giorgio Gomelski, produtor e empresário da banda, no basso profundo), a bela “You’re a Better Man Than I” (de Mike Hugg, do Manfred Mann – uma banda que pensei que ia aparecer nessa lista), que nunca entendi como é que foi parar no lado B do compacto “Shapes of Things”, e a versão com Beck reproduzindo a cítara na sua Telecaster de “Heart Full of Soul” (a melhor, para mim – a versão com a cítara não ficou tão boa), o balanço de “Train Kept A’Rollin’”... Ou seja, à parte a questionável inclusão da versão de estúdio de “I’m a Man” (que, aliás, é gravada com Clapton na guitarra-solo), só há clássicos dos Yardbirds no lado A. No lado B, quatro músicas extraídas de “Five Live...”, que não foi lançado nos EUA naquela época: “I’m a Man” reaparece na sua versão (muito superior) ao vivo, “Respectable” do Isley Brothers (com a banda engatando a quinta marcha), “Here ‘Tis”, de Bo Diddley (como as bandas inglesas gostavam dele no começo dos anos 60!), e mr. Eric “Slowhand” Clapton no seu habitat natural em “Smokestack Lightning”. Ao vivo, a banda se mostra segura, ainda que a voz de Keith Relf não seja a melhor para o repertório apresentado; é curioso ver que a maioria das músicas do lado B não mostre o talento de Clapton - será que é porque tinha saído da banda? No mais, os bons Jim McCarthy na bateria, Paul Samwell-Smith no baixo e o subestimado Chris Dreja na guitarra rítmica (também, quem vai prestar atenção nele numa banda que teve Clapton, Beck e depois Jimmy Page?) seguram bem a peteca. Mas o lado A deste LP é melhor e é preferível ouvir “Five Live Yardbirds” na íntegra para ver o que os Most Blueswailing eram capazes de fazer.


The Dave Clark Five - Have a Wild Weekend [1965]

Por Fernando Bueno

*Infelizmente, Fernando Bueno não conseguiu nos mandar os comentários a tempo desta publicação. (André)

Anderson: A autointitulada faixa título já inicia os trabalhos com uma baita energia! Rock ‘N’ Roll, mas com aquela pegada de rockabilly, aquela animação na melodia. Diria que nesse mesmo sentido se enquadram I Can’t Stand It, On the Move e mesmo Doo Dah. Porém é a segunda música do álbum, Catch Us If You Can, que posiciona o álbum como algo grandioso. O que os caras conseguiram com a melodia dessa música é memorável. O álbum em si foi composto no intuito de ser trilha sonora do filme de mesmo título e isso por um lado pode ter limitado a criatividade da banda ou mesmo ter aberto possibilidades, fato é que o disco é totalmente alinhado a dinâmica cinematográfica. Entretanto, ao comparar esse material com o Kinks, o Yardbirds ou o Animals a seta do Dave Clark Five aponta para trás e não para frente, não se ouvem inovações do que viria a ser incorporado lá no Hard Rock ou lá no universo psicodélico, ao menos não enxergo assim, remetem mais ao passado consolidado do estilo que se delineava. Todavia, não se engane, é um ótimo álbum, muito bom mesmo, top 20 da Billboard, mas datado.

André: Dentre todos, o disco que eu esperava menos mas que me surpreendeu positivamente. Uns rocks blueseiros misturados ao surf que me animaram muito aqui no que a audição foi passando. Depois fui ver que esse disco é uma trilha sonora de um filme. Fiquei até com vontade de assistir o dito cujo filme só para ter uma desculpa de ouvi-los de novo.

Daniel: Conhecia apenas de nome e nunca havia parado para ouvir um álbum inteiro. Não é que foi uma audição ruim, mas não me causou maiores emoções. Não é algo que eu vá procurar novamente.

Davi: Muito bacana essa lembrança. Eu, provavelmente, teria escolhido o álbum Glad All Over, mas não há como negar que esse disco é bem divertido de ouvir. Misturando canções cantadas com (poucas) instrumentais, Having a Wild Weekend é a trilha de um filme de mesmo nome. As músicas continuam com a pegada que tornou o grupo famoso e traz, ao menos um grande hit: “Catch Us If You Can”. Outros grandes destaques ficam com os rockões “New Kind of Love” e a faixa título, que conta com uma irresistível pegada anos 50, além das baladas “I Said Was Sorry” e “Don´t Be Taken In”. Essa última conta com uma vocalização bem beatle, banda que, na época, eles disputavam. E, certamente, deram muita dor de cabeça, afinal os hits não foram poucos.

Líbia: Eu não conhecia esse álbum, mas ao pesquisar sobre ele, vi que se trata da trilha sonora de um longa-metragem que também aborda questões sociais. Alguém aqui já assistiu ao filme? Quanto às músicas, considero esta trilha sonora ideal para diversos momentos do dia. A primeira que me chamou a atenção foi “Don’t Be Taken In”; sua melodia é envolvente e cativante. Destaque para a instrumental “When I’m Alone”. Tem uma variedade de músicas animadas e baladas melódicas, o lançamento oferece uma experiência auditiva diversificada.

Mairon: Fabuloso quinteto de rock 'n' roll direto na linha Little Richard e Elvis, ou seja, inspiradaço nos gigantes americanos dos anos 50. A faixa título já abre o disco arregaçando. Então, desfilamos por ótimas faixas dançantes com destaque para a presença marcante do saxofone. Ou baladinhas bonitas como "Don't Be Taken In",  "I Said I Was Sorry", "New Kind of Love", onde o piano é o centro das atenções junto de um belo arranjo vocal. Curto bastante as instrumentais "Dum-Dee-Dee-Dum", que parece saída de um filme de faroeste, e principalmente "No Stopping", com o sax mandando ver, belo solo de órgão, e que nos remete a filmes do 007 na linha da guitarra. Além disso, é surpreendente o arranjo de cordas e a leveza da gaita e vocais em "When I'm Alone", com certeza a faixa mais impressionante do álbum, junto de outra instrumental, a suave "Sweet Memories", também com cordas, mas aqui levada por um belo tema de guitarra e harmônica. Acho que o disco soa bem destoado de tempo para 1965, mas que é um baita disco, a isso é.

Marcello: Dave Clark era um baterista mediano, mas tinha um ótimo ouvido para um som pop e seu quinteto era formado por músicos de alto calibre. Este álbum é o sexto da discografia americana da banda e é trilha sonora de um filme de mesmo nome, de John Boorman. O quinteto era formado por Clark na bateria, Mike Smith nos teclados e vocal principal, Lenny Davidson na guitarra, Rick Huxley no baixo e Denis Payton no sax; os backing vocals são divididos pela banda, e quase todos (Huxley é a exceção) compuseram para o disco, produzido pelo nosso herói Dave Clark. O álbum alterna músicas com jeitão de lançamento de compacto com instrumentais próprias para uma trilha sonora – mas algumas são bons rocks, e outras baladinhas para cenas românticas. Após o começo com a roqueira e animada faixa-título, a beatlemaníaca “New Kind of Love” tem aquele sabor do pop sessentista, enquanto que “Dum-Dee-Dee-Dum” é uma quase instrumental, pontuada pelos gritos dos músicos, que soa como country dos anos 50. “I Said I Was Sorry” não teria feito feio no LP “With The Beatles”, por exemplo, e aí reside um probleminha do DC5: enquanto a banda de Liverpool na mesma época lançava “Yesterday”, “Ticket to Ride” e “You’ve Got to Hide Your Love Away”, eles emulavam o som da Beatlemania. Por outro lado, outra instrumental, “No Stopping”, é bem avançada para a época e ficaria interessante na trilha sonora de um filme do 007. Gosto muito de “Don’t Be Taken In” e “Catch Us If You Can”, ótimos exemplos do talento do grupo para compor e gravar músicas que grudavam no ouvido, mas a bela melodia de “When I’m Alone” foi prejudicada pelo arranjo cafona (como teria sido dito em 65...). Dave Clark Five fez um sucesso enorme nos anos 60, mas hoje é quase esquecido. É uma pena, pois o rock’n’roll da banda pode soar inocente, mas era muito bem feito e tinha arranjos bem criativos, com teclados e saxofone proeminentes.


The Tremeloes - The Tremeloes: Chip, Dave, Alan, Rick [1967]

Por André Kaminski

Sendo curto e direto: peguei este disco desta banda porque os considero extremamente underrated. Nunca entendi o porquê de não serem tão conhecidos quanto os seus contemporâneos. Talvez porque os caras são um pouco mais velhos do que "os jovens revolucionários britânicos"? Sei lá. Só peço que ouça.

Anderson: O nome do álbum já indica algo importante, mudanças! A banda deixa de ser uma ‘banda de apoio’ para assumir o protagonismo de suas ações como grupo musical. A sonoridade é bem clássica do período tendendo para um pop rock um pouco mais elaborado, forçando a barra é possível encontrar alguns elementos de psicodelia ou algo progressivo. Particularmente os Tremeloes não me atraem muito, são talentosos, apresentam algumas experimentações por vezes, como em Happy Song ou em Sing Sorta Swingle, mas não são músicas que me cativam. Com certeza é uma banda historicamente importante para o cenário da época, há pessoas que afirmam que a banda e este álbum são subestimados, mas não é uma opinião que compartilho, realmente não me impressionam muito. Vale a pena conferir, mas sem grandes expectativas.

Daniel: Dos que eu não conhecia, achei este o melhor álbum. Minha impressão é de que há mais misturas de sonoridades diferentes ao Pop, com algumas canções com toques psicodélicos. Belas harmonias vocais, algumas músicas com a guitarra mais presente. Vou ouvir novamente.

Davi: A primeira vez que ouvi algo dos Tremeloes foi através de uma coletânea do Brian Poole & The Tremeloes. Lembro que estava curioso para ouvir a versão deles para “Twist and Shout”, que conhecia pelos Beatles e considerava a versão do fab four insuperável (sendo honesto, ainda considero). Depois, ouvi a versão deles para “The Silence Is Golden” (hit do grupo 4 Seasons) e aí, sim fiquei impressionado. A versão era perfeita e as vocalizações encantadoras. Pois bem, esse é o álbum que contém o megahit. O disco é variado e traz bastante influência da cena psicodélica (o que pode ser notado já na faixa de abertura, a contagiante “Happy Song”). Os caras eram feras e o disco entrega outros momentos memoráveis como “I´m With You All The Way” e “Running Out”. Agora... A versão deles para “Too Many Fih In The Sea” é bem abaixo da versão das Marvelettes, hein?

Líbia: Esse foi o único que infelizmente não tive como ouvir, não encontrei por aqui. Nesse eu “tonguei” totalmente. Até encontrei no Youtube mas não tem a divisão das faixas. Como não conheço achei melhor “deixar quieto” no momento e ouvir com mais calma depois.

Mairon: Das bandas aqui recomendadas, os Tremeloes são os únicos que não conheço mais a fundo. Acho que este é o primeiro disco da banda que ouço na íntegra, e gostei do que ouvi, principalmente por encontrar diversas referências ao longo da audição. As variações de "Happy Song", com o piano elétrico em evidência e boas harmonias vocais, já me conquistaram de cara. O mesmo ocorreu com a introdução e a melodia da lindinha "Norman Stanley James St. Clare", influência clara para os álbuns iniciais da Aphrodite's Child de Vangelis e Demis Roussos. Até o estilo vocal me lembrou o que Roussos fez depois. Ao mesmo tempo, foi legal ver o gingado de "Cool Jerk", "Running Out" e "Too Many Fish In The Sea" (bota distorção na guitarra aí!), que me lembrou o que a Mark I do Deep purple faria anos depois. No geral, o que mais me chamou a atenção foram os arranjos vocais, se destacando em "Come On Home", "I'm With You All The Way", "Negotiations In Soho Square" e "Sunshine Games", e a psicodelia de faixas como a doida "Sing Sorta Swingle" ou "Suddenly Winter", algo quejá surgia com força na Londres de 67. E quando ouvi "Silence Is Golden" meu coração bateu mais forte, já que me remeteu a infância ouvindo horas a fio Jive Bunny & The Master Mixers!! Bem bom de conhecer este trabalho.

Marcello: De todos os álbuns escolhidos, este era o único que nunca tinha ouvido antes. Conhecia a banda de nome e nunca tinha ido atrás, por conta da sua primeira fase como Brian Poole & The Tremeloes – a banda que a Decca preferiu contratar em vez dos Beatles. A banda é formada aqui por Chip Hawkes (baixo e vocais), Dave Munden (bateria, vocais), Alan Blakley (guitarra, teclados, vocais) e Rick Westwood (guitarra e vocais). O álbum começa com “Happy Song”, digna desse nome, bem flower power, bem 1967. “Running Out” já me soa bem mais interessante, com mais energia e um trabalho mais interessante de guitarras. “Negotiation in Soho Square” está mais próxima da primeira música, mas não me agradou muito. “Suddenly Winter” e “Sunshine Games” são boas, mas com guitarras muito magrinhas, que precisavam de um pouco mais de peso. “Silence is Golden”, um dos destaques do LP, é muito bonita em sua harmonia vocal; é uma cover da banda americana The Four Seasons, e como não conhecia a versão original (nunca dei muita importância para a banda do Frankie Valli), fui atrás dela – e gostei mais da cover do Tremeloes. “Norman Stanley James St. Clare” soou um pouco como Procol Harum do primeiro LP, só faltou o Hammond. “Cool Jerk” é um clássico, e ficou legalzinho, mas a versão original do The Capitols, neste caso, é melhor. “I’m With You All the Way” não chamou a atenção e “Sing Sorta Swingle” até é boa, mas tem uma fuga vocal no meio, entremeada por risadas, que estragou tudo... Bom que “Too Many Fish in the Sea” é bem boa, com um órgão muito legal. O álbum conclui com “Come on Home”, uma baladinha interessante. No geral, este álbum batizado com o nome dos quatro músicos foi uma surpresa agradável, mas não vai me fazer sair correndo atrás do resto da discografia da banda. Agradeço a quem o recomendou por me chamar a atenção para ele!


The Zombies - Odessey and Oracle [1968]

Por Daniel Benedetti

Escolhi Odessey and Oracle, pois foi um dos álbuns mais ousados da década de 1960, misturando melodias alucinantes e sons exuberantes do Mellotron comandado por Rod Argent. A forma como as harmonias vocais são construídas são outro ponto alto. Também destaco a seção rítmica formada por Chris White e Hugh Grundy, os quais fornecem um certo peso às canções. Músicas como "Care of Cell 44", "Changes", "Butcher's Tale (Western Front 1914)" e "Time of the Season" falam por si mesmas. Apesar de sua qualidade, a falta de sucesso e demanda por shows fez deste o “último” disco do Zombies até reuniões futuras.

Anderson: Não poderia faltar algo voltado para o psicodélico. Deste modo a lacuna está preenchida com louvor. Esse material é resultado dos últimos suspiros da banda que gravou apenas dois álbuns antes de retornar nos anos 1990. Tecnicamente colocaria esse álbum em outro patamar nessa lista junto com o do Yardbirds. As harmonias são fantásticas, algo de jazz aqui e ali, psicodelia de ponta a ponta, algo de Rock ‘N’ Roll, porém já alçando os anos 1970. Algumas das músicas são clássicas como Hung Up on a Dream, Time of the Season e Butcher's Tale (Your Final Piece). Vou optar por não entrar em detalhes, acredito que os companheiros da resenha vão se desdobrar na obra! Recomendadíssimo.

André: Inacreditável pensar que a banda tinha acabado pela falta de sucesso e renda antes mesmo de lançarem este petardo. E não dá de aceitar que, novamente, o disco vendeu uma mixaria. O que estavam pensando a hippaiada da época? Aqui tem tudo o que eles gostam. O mundo é um lugar injusto. E os zumbis foram vítimas disso.

Davi: É curioso notar que várias revistas colocam esse álbum como um dos melhores de todos os tempos. Digo curioso porque, na época, muitos torceram o nariz para o disco. Inclusive, seu lançamento foi recusado, inicialmente, nos Estados Unidos onde só chegou às lojas 2 anos depois, quando o grupo não mais existia. Aquela velha história... A banda não deixou os chefões contentes com os números atingidos e isso levou à separação. O disco, de fato, é maravilhoso e mistura psicodelia e harmonia na dose certa. Um exemplo do que estou falando é a belíssima “Brief Candles”. Outra que eu gosto muito é a faixa de abertura “Care of Cell 44”. Como se não bastasse, ainda temos o o classicão “Time of the Season", uma gravação que considero simplesmente perfeita. Bela lembrança!

Líbia: Este é um álbum que, numa loja de discos, conquistaria pela capa, especialmente se você fosse um fã do visual psicodélico. Ele possui uma grandiosidade nas composições; na minha opinião, é muito original, por isso surpreende. Das minhas favoritas, "Beechwood Park" tem uma vibe psicodélica, mas também é muito emocional. "Brief Candles" tem harmonias semelhantes às dos Beatles? Provavelmente possui muita influência, mas tem uma essência única. "Hung Up On A Dream" é muito emocionante. Enfim, adorei este álbum; foi o que mais gostei de ouvir desta lista, álbum nota 10. Fiquei até triste com a história da banda em relação a indústria musical.  Deixo aqui o meu "Muito Obrigada" pela recomendação.

Mairon: Podem me chamar de maluco, mas considero este álbum uma cópia paraguaia de Pet Sounds. Basta ouvir as vocalizações em “Care of Cell 44″ e “A Rose for Emily” que essa sensação aparece de cara. Acho que é um disco bem trabalhado, principalmente na parte vocal e no piano de Rod Argent, e é óbvio que o mellotron dá uma cara diferente. As alternâncias entre acústico e elétrico de "Maybe After He's Gone", com ótimas vocalizações, são um dos pontos altos do álbum, assim como as "flautas" e todo o arranjo de "Changes", bem como manda o estilo psicodelia londrina de 68. Não é um disco ruim, mas não entendo todo o auê que fazem com ele, e também penso que a British Invasion aqui, em especial, já havia acabado. Fechando o comentário, ressalto que a clássica “Time of the Season” é certamente a melhor faixa do disco, e ela por si só já vale o LP, principalmente pelo solo de piano elétrico, o melhor momento da carreira do Zombies.

Marcello: Uma obra-prima tardia de uma banda que estava se desfazendo. Rod Argent e Chris White criaram um repertório de belas canções para marcar o fim dos Zombies, cansados de muito batalhar e pouco obter em troca. Gravado entre junho e setembro de 1967 e lançado em abril de 1968, “Odessey and Oracle” inclui doze composições originais, das quais cinco foram escritas pelo tecladista Rod Argent e sete pelo baixista Chris White; as gravações foram complicadas e, para todos os efeitos, a banda estava nas últimas. O quinteto se completa com Hugh Grundy na bateria, Paul Atkinson na guitarra e Colin Blunstone nos vocais. Do início com “Care of Cell 44” ao encerramento com “Time of the Season”, “Odessey...” oferece apenas pérolas do pop psicodélico do final dos anos 60. Além dessas músicas, gosto muito de “A Rose for Emily”, “Beechwood Park”, “Hung Up on a Dream”, “I Want Her, She Wants Me” e “Friends of Mine”, mas o disco todo se mantém em alto nível o tempo todo, o que o faz ser um daqueles álbuns especiais que você ouve sem pular nenhuma faixa. Mas, quando foi lançado, “Odessey...” seguiu o caminho para o anonimato, sem chamar a atenção do público; em 1969, “Time of the Season” começou a tocar nas rádios americanas e virou um hit, o que fez com que houvesse uma demanda por shows e turnês – mas os Zombies já tinham acabado após um último concerto em dezembro de 67 (o que levou ao surgimento de vários “fake Zombies” pelos EUA!). Quando a banda se reuniu nos anos 90, “Odessey...” foi finalmente executado ao vivo por quem era de direito, e de lá em diante várias turnês capitaneadas por Blunstone e Argent levaram o álbum adiante. Este é daqueles discos que não podem faltar na coleção de quem gosta de rock, ponto final.

sábado, 11 de março de 2017

Melhores de Todos os Tempos - Aqueles que Faltaram: por Bernardo Brum

O jovem Caetano Veloso

Por Bernardo Brum

Com Alexandre Teixeira Pontes, André Kaminski, Christiano Almeida, Davi Pascale, Fernando Bueno, Flavio Pontes, Mairon Machado, Ronaldo Rodrigues e Ulisses Macedo


Não deixe esta seleção te enganar: ela passa longe de ser definitiva. Ela é o resumo de um apanhado de mais de 30 discos cuja ausência senti. Quando havia passado dos 20, o coração já tinha começado a pesar. Mas amo com força cada um desses dez discos – muitos deles foram primeiros ou segundos lugares em listas minhas, e vê-los de fora foi tipo ver o time perder um gol, com o perdão da metáfora cretina. Ainda que esses “acertos” e “erros” sejam altamente subjetivos, foi uma dádiva que os editores da Consultoria tivessem essa ideia para que façamos nossa própria justiça ao invés de reclamar. Então, pois bem, em ordem cronológica, aí vão meus dez escolhidos e os respectivos comentários.

The Stooges - Fun House (1970)
Bernardo: Se The Stooges (1969), gravado em Nova York e produzido por John Cale (Velvet Undergroud), privilegiava a experimentação, a atmosfera de microfonia, a repetição estilística e a postura vanguardista tentando parecer meio The Doors e meio Velvet Undeground, Fun House foi gravado em Los Angeles e produzido por Don Gallucci, tecladista da banda de garage rock Kingsmen (do clássico "Louie, Louie"), e com a adição na banda do saxofonista de jazz Steve MacKay. O resultado da “californização” dos Patetas é a banda no volume máximo, mais livre do que nunca em um disco de fúria demencial que ainda soa completamente despirocado. Canções como “Down on the Street”, “T.V. Eye” e “1970” mostram a banda completamente imersa em atonalidade, improvisação e distorção. Um dos discos mais excessivos da mais excessiva das épocas.
Alexandre: Guitarras mal gravadas, com efeito de “delay curto” irritante, vocal (mal) gritado, baixo e bateria que qualquer iniciante com pouquíssimos meses de instrumento e um mínimo de talento poderia reproduzir. Quando Iggy Pop não está berrando, parece Jim Morrison, e isso não é um elogio. Há de se discernir energia e atitude de barulheira. Energia e atitude podem conter musicalidade, o que eu não encontrei aqui. E ao pesquisar a história do álbum e até o seu legado, entendi que o errado era eu. “Dez milhões” de artistas citam este disco como um de seus preferidos. Nenhum desses artistas (entre eles Joey Ramone e Jack White) tem alguma relevância fundamental para mim. As harmonias de guitarras (não o solo propriamente) no fim de "Dirt" salvam a monotonia que permeia o álbum todo. E é só. O que é aquele saxofone em "1970 (I Feel Alright)"? O que é aquele final do disco? O lado B é literalmente intragável. Se o errado era eu, continuo sendo.
André: Vai ser um pouco difícil comentar os discos do Bernardo pelo fato de termos gostos completamente diferentes (e acredito que ele sentirá a mesma coisa quando ouvir os meus). Felizmente, ele recomendou o Stooges, banda que, apesar de não ter ouvido muita coisa, possui o meu respeito devido à sua influência e inspiração para tantas outras. Fun House é um disco curto, tem uma pegada garageira bacana e uma levada jazzística bem legal. A canção da qual mais gostei foi a título, "Fun House", em que o naipe de metais se destaca junto àquela pegada rock 'n' roll típica dos anos 1960. Pena que o vocal de Iggy Pop não ajuda muito a eu apreciar mais a obra.
Christiano: Mesmo não tendo muita familiaridade com o punk rock, tenho que admitir que estamos diante de um clássico. Um disco seminal para o desenvolvimento do estilo. Lançado em 1970, Fun House é mais uma prova do grande ecletismo que caracterizava as bandas daquela época, sendo até meio difícil encontrar um rótulo para o som dos Stooges. Ao mesmo tempo em que percebemos elementos de hard rock e rock 'n' roll, um certo clima de psicodelia dá as caras em algumas músicas. Um bom exemplo disso é “Dirt”. Por outro lado, a sujeira de faixas como “Loose” e “1970” mostra que algo até então inclassificável estava sendo apresentado por esses jovens rapazes de Michigan. Ótima escolha.
Davi: Confesso que o debut do Stooges é o meu preferido deles, mas Fun House é um disco bacana. Pesado, com bastante atitude e inovador. O arranjo mais cadenciado e viajado de “Dirt” é muito bacana. A ideia de adicionar sax ao som da banda, que pode ser conferido em faixas como “1970”, é genial, já a bagunça sonora de “L.A. Blues” poderia ter sido limada. Destaque para o trabalho vocal do sempre endiabrado Iggy Pop e para o trabalho de guitarra de Ron Asheton. Faixa preferida: “Down on the Street”.
Diogo: Não soubesse antecipadamente, mesmo assim não seria difícil adivinhar que os Stooges são crias de Detroit e suas vizinhanças. Por mais que cada grupo tivesse suas diferenças, a crueza e o peso de suas composições, além de uma atmosfera evidentemente urbana, eram ponto de intersecção entre grupos como MC5, Grand Funk Railroad, Alice Cooper (egressos do Arizona, bem sei disso) e Stooges. Com um som muito baseado em riffs de guitarra, a banda desenvolve suas músicas ao redor do trabalho de Ron Asheton, algo bem evidente na maior parte do tracklist, especialmente em "Down on the Street", grande destaque. Quando resolve dar uma "viajada", o grupo também se sai bem, vide a ótima "Dirt", que traduz a psicodelia para um mundo cinza de chaminés de indústrias e laranja e vermelho vivo das caldeiras (tal qual sua capa) que derretiam o metal que dava vida a toda essa cena, distante do bucolismo idealista californiano. Fun House é um produto de sua época e de sua região, mas fez e continua fazendo sentido para muita gente ao redor do mundo.
Fernando: Em algum período no meio da faculdade eu conheci Syd Barret e fiquei maluco. O interesse por Iggy Pop e Lou Reed veio nessa época também. Porém, por mais que eu os achasse divertidos, não conseguia curtir tanto esses dois últimos. Assim, o interesse pelas carreiras regressas dos músicos quase nunca passou pelos meus ouvidos. Ouvir Stooges agora me parece algo legal para animar um bar, um pub inglês ou uma reunião de amigos, mas não creio que seria o ideal para ouvir em casa sozinho. Algumas coisas remetem aos Rolling Stones, como em “Loose”, por exemplo, mas, no geral, é o tal garage rock em sua essência.
Flavio: O disco começa de forma interessante com "Down in the Street", um rock básico bem marcado, privilegiando o vocal rasgado de Iggy Pop.  No momento do solo a coisa dá uma complicada, quando já se percebe que a guitarra não vai ajudar muito. Daí pra frente não vejo muita novidade: apesar de relevar a qualidade do som gravado, limitado em função do ano de lançamento, o grupo soa muitas vezes com uma banda de garagem, em um ensaio despretensioso. Alguns berros exagerados aqui e ali, a bateria apenas na base da animação. O baixo cumprindo o papel mais básico possivel e as guitarras por vezes dando até "tiro pra fora". A melhor música talvez seja a quarta, "Dirt", um pouco mais psicodélica e só. Não há dúvidas de que em 1970 tivemos coisas bem melhores que isso.
Mairon: Os Stooges foram precursores do punk rock e revelaram ao mundo a identidade maluca de Iggy Pop. O segundo álbum não é tão bom quanto o primeiro (que poderia ter sido lembrado para a edição dedicada a 1969), mas ainda assim é uma bela de uma pancadinha nos joelhos. Sempre é legal ouvir e sacudir a cabeleira (hoje não mais existente) durante "Loose" e a faixa-título, bem como os chapantes solos de guitarra em "Down on the Street" e o andamento arrastado de "Dirt". Fico pensando o que se passava na mente dessas quatro criaturas quando criaram este disco. Para eles, viva a existência de insanidades do porte de "T.V. Eye", "1970 (I Feel Alright)" e "L.A. Blues", sendo que, nas duas últimas, o saxofone de Steve Mackay e os gritos de Iggy são muito doentios. Poderia ter entrado pelo menos no lugar de Déjà Vu (Crosby, Stills, Nash & Young). Baita lembrança, Bernardo.
Ronaldo: Quase todas as bandas de proto-punk são melhores que as bandas punk propriamente ditas. E o motivo é que, na época, ainda era necessário tocar razoavelmente bem para convencer a plateia. É o caso do Stooges. Todos os elementos do rock raivoso que infestaria a segunda metade dos anos 1970 estavam já ali cristalizados e mais bem acabados do que a obra de todos os discípulos dos Stooges juntos. Rock possante e rasgante, visceral e louco, como o bom rock praticado em 1970.
Ulisses: Uma cacetada caótica na forma de um blues rock garageiro contorcido e de variada intensidade, em que Iggy Pop se resume a balbuciar e gritar redundantemente. É mais divertido do que parece, ainda mais por causa da guitarra faiscante de Ron Asheton e da bizarra presença do saxofone. O disco tem um clima de loucura que abarca o ouvinte de primeira e funciona muito bem.

The Kinks - Lola Versus Powerman and the Moneygoround, Part One (1970)
Bernardo: É com este álbum conceitual carregado do melhor senso de sátira inglês que os Kinks e particularmente Ray Davies conseguiram unir toda sua proficiência melódica e toda sua ambição conceitual em um disco que tem algumas das melhores linhas melódicas já compostas pelo grupo (como nas baladas “Strangers, “Get Back in the Line” e “This Time Tomorrow”), mas o grande destaque é, obviamente, o peso cadenciado de “Lola”, uma música romântica de um homem que se vê apaixonado por uma mulher transexual. Começando leve e bem humorada, a música vai ganhando power chords e vocalizações emocionais com uma evolução natural e um cuidado tão esmerado que o resultado não poderia ser diferente: um clássico instantâneo e hino do rock setentista.
Alexandre: É evidente que os estilos musicais de preferência do Bernardo e o meu são bem díspares. Desta maneira, antes de tudo é um grande aprendizado passear por esta lista, talvez mais do que de vários outros consultores. Assim, optei por não fazer considerações acerca de que este ou outro determinado disco poderia ou não estar na lista final, pois provavelmente seriam pouquíssimos os citados. Melhor fazer uma análise pura e simples. Nesse propósito, gostei do que ouvi, em especial do uso de instrumentos como violões do tipo National Steel, banjos, timbres de teclados mais tradicionais e pianos. A sonoridade e a atmosfera do rock dos do fim dos anos 1960 e primeira metade dos anos 1970 está latente e é bem vinda. E é até surpreendente, pois associava a banda a um estilo mais antigo, já que o pouquíssimo que conhecia deles vinha de regravações cover (em especial "You Really Got Me", em versão matadora do Van Halen). Bons vocais, backings, bom instrumental, nada fora do lugar. Um álbum que hoje em dia pode soar um tanto genérico, apesar do cuidado em ter letras voltadas a um mesmo conceito (críticas à indústria fonográfica), mas é agradável. Destaco as faixas "Get Back in Line", "Powerman" e, especialmente, "Got to Be Free".
André: Vejo muita gente louvando este disco, mas confesso que o considero apenas um bom álbum do Kinks. Sim, eu sinto saudades dessa época, mas acho que o Kinks já tinha dado o seu melhor entre três e cinco anos antes deste disco ser lançado. Tem lá boas sacadas de teclado, como em "Top of the Pops", mas já me soa como um disco de banda veterana fazendo apenas álbuns sem aquela gana do iniciante. Ou fazendo músicas mais piadinhas, como "The Moneygoround". Sim, eu sei que alguns podem me malhar nos comentários, mas me perdoem e pensem "ele não sabe o que faz".
Christiano: Mais um grande disco lançado em 1970. Para o ouvinte desavisado, Lola Versus Powerman... pode parecer uma colcha de retalhos, tamanha a variedade de estilos explorados pela banda. Na verdade, este álbum é um ótimo exemplo da passagem dos anos 1960 para a década posterior. “Get Back In Line”, por exemplo, traz um clima que pode lembrar nomes como The Beach Boys. “Rats”, por sua vez, tem uma pegada mais próxima do hard rock setentista. Como o The Kinks era uma banda muito acima da média, esse ecletismo tem como resultado um álbum musicalmente muito rico, que cresce a cada nova audição. Definitivamente, indispensável.
Davi: Ótima lembrança. Gosto muito do Kinks e este LP é realmente um clássico. Em termos de sonoridade, ele mistura as guitarras do hard rock com o violão do folk. A faixa de abertura, “The Contenders”, mostra bem essa mistura. Quem gostava daquela sonoridade mais suja dos britânicos, como em “You Really Got Me” ou “All Day and All of the Night“, se identificará com “Top of the Pops”, “Rats” e “Poweman”. Entre os momentos mais “calmos”, também temos ótimas faixas como “Get Back in Line”, “This Time Tomorrow” e o clássico “Lola”.
Diogo: Os Kinks pertencem àquele grupo de bandas britânicas que não morreram (criativamente ou encerraram atividades) no fim dos anos 1960, fazendo uma boa transição para a década seguinte, mostrando crescimento, perspicácia e ambição, sem abrir mão do típico senso de humor. A banda escreve a sério sem se levar tão a sério, resultando em muito boas canções, como "Lola" e "Top of the Pops", que brincam na temática e na interpretação, mas mostram esmero instrumental e conquistam pelo ouvido. Dave Davies tem a chance de brilhar com sua voz na pesada "Rats" (hard setentista pra ninguém botar defeito) e em "Strangers", balada que encontra par em "Get Back in Line" e mostra a variedade do álbum, que ainda assim soa homogêneo em sonoridade e qualidade. Destaco ainda as duas canções que encerram o disco, "Powerman" e "Got to Be Free". Não posso dizer que morro de amores pelos Kinks, mas a banda acertou a mão em Lola... e fez por merecer o espaço.
Fernando: Não conheço o Kinks da forma que eles merecem. Sei que a partir de Face to Face (1966) até este aqui está o crème de la crème do grupo, mas eu sempre fiquei mesmo no disco de 1969, Arthur (Or the Decline and Fall of the British Empire). Toda vez que me dá vontade de ouvir a banda, é nele que eu vou. Sei que é um pouco de comodismo da minha parte, mas é a verdade. Tentarei me redimir. Aos mais sabidos aí, me respondam: não encontrei uma segunda parte: ela existe ou não? Deve haver alguma história por trás disso.
Flavio: Ao ouvir outro disco do mesmo ano, mesmo entendendo que a proposta é totalmente diferente, vejo uma produção um pouco melhor que a de Fun House. Há presença de banjos, pianos, vocais dobrados em um western rock 'n' roll que agrada em boa parte da bolacha. O vocal cumpre bem o papel antenado com o estilo. Gostei de "Denmark Street", "Got to Be Free" e quase todas desceram bem. A apontar como negativo, um momento ou outro um pouco mais lento, como em "Strangers", soando enfadonho. Apesar de não surpreender, Lola... é um disco agradável sem ser um destaque do ano e merecer aparecer por aqui.
Mairon: Conheço pouco de Kinks e sempre ouvi falar bem deste álbum conceitual. Foi-me surpreendente o que ouvi, principalmente pelas melhores faixas, com a harmônica e o piano destacando-se em "The Contenders", as guitarras hardonas e os vocais gritados de "Rats", "Powerman" e "Top of the Pops" (as melhores do disco), a linda "A Long Way From Home", que poderia estar facilmente em Beggars Banquet (The Rolling Stones, 1968) e aquele delicioso órgão de "Get Back in Line". Ainda temos a sutil "Strangers", o bom arranjo vocal da veloz "This Time Tomorrow", também com uma ótima participação do órgão, e a clássica "Lola", faixa que com certeza você já deve ter ouvido alguma vez na vida, bem como as inspirações country de "Got to Be Free" e "Denmark Street". Esqueça as piadas "Apeman" e "The Moneygoround", nada acrescentam ao disco. O ano de 1970 foi bem concorrido, mas apesar de a lista ter permitido a entrada de dois discos que não aprecio tanto assim (Déjà Vu e All Things Must Pass, este último de George Harrison), não sei se Lola conseguiria um lugar.
Ronaldo: Creio que os Kinks foram uma espécie de The Who do segundo escalão, pois fizeram a mesma migração do som mod adolescente para uma maturidade musical construída em cima de histórias conceituais. E também com o mesmo senso aguçado para criar músicas grudentas e com poucas firulas. Neste caso, as batidas de violão e os acompanhamentos de piano dão um tom mid-tempo a todo o trabalho, que não é eloquente por esbanjar decibéis, mas sim por se gastar em melodias detalhadamente esculpidas.
Ulisses: Bem tocado, bem produzido, com boa variação de sonoridade e que flerta com vários outros gêneros, sendo bastante sólido e consistente do começo ao fim. Não é lá uma audição impressionante, mas a predileção da banda por arranjos espertos e agradáveis a faz descer suficientemente bem.

Caetano Veloso - Transa (1972)
Bernardo: Cercado por alguns dos melhores músicos do Brasil à época – Jards Macalé, Tutti Moreno, Moacyr Albuquerque e Auréo de Sousa – o Caetano de Transa faz, segundo ele mesmo, seu primeiro disco de grupo, gravado durante seu exílio em Londres e apresentando o auge da sua maturidade artística. A Tropicália aqui recebe os habituais banhos de rock psicodélico e samba, mas dessa vez de maneira bem mais introspectiva, como reparamos no confessional reggae “Nine Out of Ten”, nos nove minutos de “Triste Bahia”, que vai do lamento acapella ao delírio percussivo, e na abertura provocante, “You Don’t Know Me”. Em um álbum no qual inglês e português competem espaço, a regravação do samba “Mora na Filosofia” faz uma ponte entre gerações e transforma o samba de desilusão romântica de Monsueto Menezes em um semi-rock que provoca todo o establishment político-social brasileiro sem mudar uma letra da música. Ainda soa tremendamente rebelde. Transa é o verdadeiro disco rock and roll de Caetano, através do qual ele perdeu os próprios limites e virou artista do mundo, artista de música, sem bandeira, sem gênero.
Alexandre: Em minha opinião, e eu realmente não sei se o considero o melhor álbum de Caetano, apesar de ser praticamente uma unanimidade entre a crítica, mas dentro desta lista ele sobra, e fácil. Gosto bastante das faixas conhecidas dos álbuns da volta de Veloso ao Brasil, nos anos 1970, mas tenho certa dificuldade de ouvir seus discos na íntegra. O que mais me chamou atenção neste trabalho, e não sei se isso é algo subjetivo e muito da minha interpretação, mas me pareceu que a saudade do Brasil (e da Bahia, talvez mais especificamente em "Triste Bahia") transbordou dos sentimentos do cantor para o vinil. A mistura entre os idiomas inglês e português durante várias faixas e a citação explícita aos elementos de suas raízes brasileiras corroboram essa interpretação. O disco vai muito bem até a quinta faixa, "Mora na Filosofia", que aparece em uma regravação emocionante e com belo arranjo por Caetano e banda. As primeiras faixas compostas majoritariamente em inglês ("You Don’t Know Me", "Nine out of Ten" e "It’s a Long Way") também me agradaram. O final neolítico do álbum passou um pouco do ponto pra mim.
André: Sempre acharei Caetano Veloso um porre. E agora é um porre cantando em inglês. Mas como metaleiro acéfalo, aceito que me enviem o link dele lá me chamando de burro.
Christiano: Escutar este disco foi um exercício curioso. Não suporto Caetano Veloso, mas tive boa vontade para tentar esquecer minha resistência. Musicalmente, é interessante. Tem uma banda muito boa e composições bem inventivas. O grande problema, pra mim, é a voz de Caetano, que azeda as músicas em dois idiomas, mostrando que o cara é chato por essência. Mesmo assim, não tem como ignorar faixas como “It’s A Long Way” e “You Don’t Know Me”, dois dos melhores momentos do disco.
Davi: Caetano é, sem dúvida, um dos melhores letristas/compositores do Brasil. Apesar de não concordar com algumas de suas posições, sou um admirador de sua obra. São poucos os erros (tudo bem que alguns graves, como o torturante Araçá Azul, de 1973) e muitos acertos. Transa é um belo álbum, criado no período em que o músico ainda vivia seu exilio em Londres. Ele mistura inglês com português, sonoridade inglesa com brasileira, citações de Beatles e Edu Lobo. Não esperava vê-lo nesta série e fiquei feliz com sua menção. Faixas preferidas: “You Don't Know Me”, “Triste Bahia” e “It's a Long Way”.
Diogo: Mais que um cantor, músico e compositor, Caetano tornou-se um personagem da cultura nacional. É difícil ignorá-lo, seja em sua música, suas declarações e posições políticas. Talvez esse primeiro item seja, atualmente, o menos comentado pelo grande público. Da minha parte, nunca me dei ao trabalho de explorar sua carreira (esta é a primeira vez que escuto um álbum seu na íntegra), mas o que ouvi até hoje não me causa rejeição, algo que poderia ocorrer considerando meu background. Minha simpatia por sua valorização da norma culta já era um bom começo, que ficou ainda melhor ao dar play na canção que abre Transa, "You Don't Know Me", mesclando português e inglês de uma maneira que eu gostaria de ver mais gente fazendo (com qualidade, por favor) e soando difícil de rotular. Além dela, "Triste Bahia", "It's a Long Way" e "Mora na Filosofia" mostram não apenas Caetano, mas uma banda no caminho certo rumo a uma música brasileira de compreensão universal.
Fernando: O início do disco, com Caetano cantando em tons mais baixos, nem parece o baiano, mas quando ele eleva os tons vem aquele timbre de sua voz com o qual estamos acostumados. Acredito que tenha sido gravado durante ou logo após seu exílio na Inglaterra, explicando as letras se revezando do português para o inglês. Algo que nunca li foi sobre esse período que ele esteve na Inglaterra. A única coisa que me lembro dessa fase é “London London” porque eu a conheci pelo RPM. O que tenho curiosidade é saber se ele teve uma carreira real lá, se chegou a tocar, qual a recepção que teve dos ingleses, etc. Sobre o disco: ouvi sem problemas, mas não é para mim.
Flavio: Como quase qualquer brasileiro, conheço parte do repertório e da carreira de Caetano, e pelo período suponho que aqui esteja uma parte importante da fase internacional do cantor, pois, com o exílio, surgiram as canções londrino-brasileiras. Deixo claro que essa "mistureba" deve fazer sentido para uma "galera", inclusive o Bernardo, pela escolha como um disco esquecido. Bom, sinto dizer que pra mim não agrada. Não gosto do efeito da mistura, nem da pronúncia de Caetano, então, apesar de curto, o disco desceu "a fórceps". Vou salvar com muita boa vontade a brasileira "Mora na Filosofia" e olhe lá.
Mairon: Este álbum foi eleito aqui na Consultoria como um dos dez melhores discos brasileiros da década de 1970. Sofrendo do "Uol Host Incident", o comentário que fiz naquela feita foi perdido, então vamos comentar novamente. Gravado praticamente todo em uma mistura de frases em inglês e português, é um dos últimos grandes discos de Caetano, e com uma banda afiadíssima, na qual Jards Macalé só não faz chover com a guitarra. É um disco sensacional, trazendo o embalo suingado de "Nine Out of Ten" e "It's a Long Way", um show de mistura de inglês e português por Caetano, a psicodelia alucinante de Araçá Azul já começando a dar o ar da graça em “Neolithic Man” e o blues sutil, curtinho, mas encantador de "Nostalgia (That's What Rock 'n' Roll Is All About)", com a participação de Gal Costa. Falando nela, destaque principalmente para a linda "You Don't Know Me", com participação da cantora (que também vivia uma fase sensacional) e citações a "Reza", e a perfeita “Triste Bahia”, misturando elementos do candomblé e da capoeira com o rock e o samba em um crescendo de deixar sem fôlego, que foi eleita por Caetano a melhor música do LP, o que não é mero exagero de pai coruja. Porém, para mim, “Mora na Filosofia” é a melhor do disco, também com um crescendo fantástico, saindo de uma dolorida balada para uma empolgante levada, com aquele som peculiar da bateria brasileira dos anos 1970 e uma interpretação magnífica de Caetano. Uma baita lembrança do Bernardo, mas em uma lista que teve Yes, Sabbath, Purple, Bowie, Stones, Jethro Tull, Gentle Giant, Captain Beyond, Neil Young e Stevie Wonder, a concorrência era muito difícil. Mas caberia bem no lugar de Harvest e Talking Book, pelo menos para meu gosto.
Ronaldo: O sumo mais refinado da musicalidade e do lirismo de Caetano Veloso. Suas transições inglês-português e sua salada miscigenada de estilos são os principais charmes dessa transa.
Ulisses: Música bilíngue e multicultural que entrelaça MPB, bossa nova, rock, reggae e baião. A audição é interessante não só por trazer uma musicalidade rica e extensa, mas também porque sua execução é precisa e criativa; "Triste Bahia", com seu jeitão de roda de capoeira, mas trazendo um instrumental cuidadoso e arrasador por trás, é o melhor exemplo disso. Boa indicação.

Bob Dylan - Blood on the Tracks (1975)
Bernardo: Quem não tem um fraco por discos confessionais? Só sei que eu tenho. Ainda que Dylan negue que os escreva e que tenha ironizado em entrevistas de rádio que pessoas gostavam do disco por “gostar desse tipo de dor”, a fase inspirada do artista – o segundo momento iluminado da sua carreira, que recuperava o momento revolucionário entre The Freewheelin’ Bob Dylan (1963) e John Wesley Harding (1967) – estava de volta, que ainda renderia a obra-prima Desire (1976). Menos bem cuidado e mais sangue nos olhos que seu sucessor, Blood on the Tracks exorciza demônios pessoais de Dylan através de música – seja no lamento de “Tangled Up in Blue”, a raiva épica e um tom acima, cheio de versos cortantes de “Idiot Wind” (“nós somos idiotas, querida/é um mistério que ainda saibamos nos alimentar”) e nas mais suaves “Shelter From the Storm” e “You’re Gonna Make Me Lonesome When You Go”. Para muitos, pode soar um tanto homogêneo; para mim, é um artista no auge da sua sensibilidade nos convidando para uma jornada sem volta pelos lados mais escuros, feios e frágeis de seu coração.
Alexandre: Nunca fui um grande admirador de Bob Dylan, apesar de reconhecer seu mérito indiscutível como compositor. Ainda assim, a tendência era que eu desaprovasse o álbum. No entanto, posso atestar que Blood on the Tracks até soou bem em boa parte, embora não tenha propriamente me entusiasmado. O disco é tido como o crème de la crème, um dos “masterpieces” do compositor, mas para mim o grande mérito dele é não abusar dos tons altos e anasalados e ter poucos momentos de gaita, dos quais eu normalmente não gosto. Destaco "Idiot Wind" e "Tangled Up in Blue". "Simple Twist of Fate" tem a mais bonita harmonia do álbum, poderia ter menos gaita. Os belos timbres de violão durante todo o disco também me agradaram bastante.
André: Este é um belo disco de Dylan. Folk delicioso, espontâneo, de uma qualidade ímpar. Vai dizer que "Tangled Up in Blue" não é uma das melhores canções que ele gravou na carreira? O cara faz chover com um violão na mão. O menino Bernardo mandou muito bem aqui.
Christiano: Sempre achei que Bob Dylan é letra demais e música de menos, mas esse não é o caso de Blood on the Tracks, um disco que traz coisas tão bonitas como “You’re a Big Girl Now”, “Tangled Up in Blue” e “Buckets of Rain”. É inegável que um ar melancólico percorre boa parte das faixas, o que, neste caso, torna o álbum ainda mais belo.
Davi: Bob Dylan é sempre genial. Acredito que este talvez seja o álbum mais confessional de sua carreira. As letras deixam claro o momento turbulento pelo qual passava a relação com sua esposa, Sara. O próprio Jakob Dylan (líder do Wallflowers e filho do cantor) já afirmou publicamente que, quando ouve este LP, a imagem que vem à sua mente é a de seus pais. As gaitas dos tempos de The Freewheelin' Bob Dylan voltam a aparecer em faixas como “You're Gonna Make Me Lonesome When You Go” e “Lily, Rosemary and the Jack of Hearts”. Depois de ter realizado vários álbuns apoderado de sua guitarra, como o antecessor Planet Waves (1974), Dylan volta a explorar os violões nos arranjos. Faixas como “Tangled Up in Blue”, “You're a Big Girl Now” e “Meet Me in the Morning” destacam-se durante a audição.
Diogo: Entre todos os álbuns aqui mencionados pelo Bernardo, Blood on the Tracks é o único que incluí em listas minhas. Após o quase perfeito período de 1963 a 1969, seguido por alguns discos de qualidade bem abaixo da média, ele significou uma retomada em alto estilo, desfilando composições intensas que pouco ou quase nada devem para os melhores momentos de Highway 61 Revisited (1965) e Blonde on Blonde (1966), suas obras máximas. Não me importa se ele viveu ou não as emoções representadas em suas canções, o que importa é que a autenticidade é inquestionável. A vontade que tenho é de empilhar destaque sobre destaque, pois a sequência de ótimas faixas vai quase do início ao fim do álbum, sendo "Meet Me in the Morning" a única quebra mais evidente. As quatro primeiras tiram o fôlego por completo, enquanto o country de "Lily, Rosemary and the Jack of Hearts" termina de derrubar o cidadão. Sei que Bob Dylan recebeu um bom espaço em nossa série, especialmente em suas primeiras edições, mas a citação a Blood on the Tracks é justa. Gosto um pouco mais dele do que de Desire, que também citei e deu as caras na lista dedicada a 1976.
Fernando: Bob Dylan é um daqueles artistas que me faz ter vontade de aprimorar meu inglês. Consigo me comunicar, ler e me viro bem quando viajo, mas entender poesia ou mesmo absorver literatura ainda não consigo completamente. Falo isso porque sua música é simples, basicamente voz e violão, com a adição eventual de algumas camadas de outros instrumentos, e é totalmente focada na mensagem que ele está passado. Quando a mensagem é recebida de forma truncada, acredito que perdemos muito do ato de ouvi-la.
Flavio: Vou (novamente) "ir contra a maré" aqui e me expor ao "linchamento público" ao dizer que nunca entendi essa idolatria a Bob Dylan. Tá, ele foi um grande representante do movimento da contracultura, em defesa dos mais fracos e da filosofia paz e amor da virada dos anos 1960/70, e há algumas boas composições na sua carreira, principalmente no aspecto lírico, mas pra mim é só. Não conseguiria montar um boa coletânea de 60 minutos do artista. Ao me depararar com este álbum de 1975, além de manter tudo exposto, ainda o vejo como dono de um som datado até para a época, já carente de outro panorama. Particularmente, soam bem desagradáveis as inserções de gaita e vocal, em alguns momentos até semitonando. Enfim, daqui não vou destacar nada e mantenho minha posição de afastamento em relação ao repertório do cantor. Passo!
Mairon: Cara, quando ouvi Blood on the Tracks pela primeira vez, através de um amigo meu fã de Dylan, ele me avisou: "Preste atenção nas harmonias instrumentais e nas letras". Bom, isso é o básico para se ouvir Dylan, mas em especial aqui está o fato de que ele está despejando todo o seu sentimento por conta da separação de sua esposa Sara. Sendo assim, as letras assumem um teor pessoal tão dolorido que fica difícil pensar como ele conseguiu gravá-las sem chorar. Claro, ele sempre afirmou que o disco não tem nada a ver com sua vida pessoal, mas essa lenda irá perdurar para sempre, principalmente ao ouvirmos joias tão lindas como "Simple Twist of Fate", "Idiot Wind" e a mais clássica do disco, "Shelter From the Storm". Dylan solta a voz no longo country de "Lily, Rosemary and the Jack of Hearts" e ainda se dá ao luxo de voltar aos tempos de trovador solitário em "You're Gonna Make Me Lonesome When You Go", em que a nostalgia come solta. Como não se maravilhar com "Buckets of Rain", "Tangled Up in Blue", as linhas bluesy de "Meet Me in the Morning" e segurar a emoção no dedilhado de violão da tocante "You're a Big Girl Now" e na doloridíssima "If You See Her, Say Hello". Tinha certeza que este disco entraria na edição dedicada a 1975, por isso tirei-o na última hora para que entrasse Wish You Were Here (Pink Floyd) na minha lista. E não é que Dylan ficou de fora? Entraria fácil no lugar de Bruce Springsteen e de Neil Young, quiçá até do Rainbow. Um dos melhores discos do norte-americano prêmio Nobel de literatura, essencial para qualquer pessoa que goste de música em geral.
Ronaldo: Um feliz casamento entre letra e música. As férias forçadas que Bob Dylan teve no início dos anos 1970 lhe fizeram um bem danado. Sua música voltou oxigenada com um novo lirismo e seu violão encontra-se cada vez mais particularizado e posto em um quadro sonoro caprichado. Só ouço acertos em Blood on the Tracks.
Ulisses: Musicalmente, Bob Dylan nunca me disse nada, é apenas razoavelmente agradável de se ouvir, e não é Blood on the Tracks que vai mudar isso. Liricamente, a história sempre é diferente com o bardo: a prosa é bastante pessoal e vívida, detalhando turbulências de relacionamentos e separações. Acompanhando as ótimas letras e sabendo a história por trás de seu casamento, a audição fica bem mais apreciável.

Jorge Ben - África Brasil (1976)
Bernardo: Jorge Ben é um titã da música brasileira. Do nível de Chico, Caetano, Tim Maia, você nomeie. Aprimorando seu inimitável “samba soul” disco a disco, África Brasil tem o título perfeito: une a sonoridade tradicional africana com o caldeirão brasileiro de maneira impressionante, no que a crítica chamou de um disco de “samba rock”, cheio de guitarras vigorosas mas também cheio de percussões pesadas, viradas impressionantes e de chacoalhar a alma e um baixo que ronca como um trovão. “Ponta de Lança Africano (Umbabarauma)” é daquelas entradas que chegam derrubando tudo e te mostra em alguns segundos a razão de ser um clássico instantâneo, os clássicos “Taj Mahal” e “Xica da Silva” embalaram gerações em sua celebração da história além-Ocidente, e ainda tem outras pérolas como “Hermes Trimegisto Escreveu”, “Meus Filhos, Meu Tesouro” e a autorregravação furiosa de “África Brasil (Zumbi)”, que já havia aparecido mais suave em A Tábua de Esmeralda (1974), encerrando o álbum com o peso de mil hard rocks e heavy metals que penam para igualar a intensidade da sessão rítmica de Jorge. Rei é rei, né, mores?
Alexandre: Os discos brasileiros desta lista estão entre os que mais me agradam. Não tenho uma (salve) simpatia absoluta pelo estilo proposto por Jorge Ben, mas o álbum passou bem durante as várias vezes que o pus pra tocar enquanto pretendia analisá-lo. O cantor está muito bem acompanhado de músicos como Marcio Montarroyos, Dadi e José Roberto Bertrami, por exemplo, que estiveram em bandas como A Cor do Som e Azymuth. É um senhor predicado, sem dúvida, pois o instrumental é de qualidade, sem qualquer questionamento. Dentro desse instrumental, Ben vai divagando acerca de suas viagens entre reinados africanos e partidas de futebol. Em alguns momentos, a viagem me parece além da compreensão, mas o álbum entrega várias faixas conhecidas até para o menos informado sobre a carreira do músico, entre elas "Xica da Silva", "Ponta de Lança Africano (Umbabarauma)", algumas regravações, como "Taj Mahal" e "O Camisa 10 da Gávea", a minha favorita, já que sou rubro-negro confesso e feliz acompanhador da melhor fase do Flamengo e do seu maior ídolo, Zico. O disco é tido e conceituado por ser pioneiro em trazer algo da black music, do soul e, principalmente, o tal samba rock em sua essência, e pela troca do violão pela guitarra pelo próprio Jorge, trazendo mais suingue para um som recheado de elementos percussivos. A questão do uso da guitarra (sutilmente temperada com alguns efeitos, como o phaser – acredito que seja o Phase 90 da MXR) não é o que mais me chama atenção, e, apesar de perceber que isto serviu para modernizar a sonoridade à época, prefiro entender o uso do instrumento como um coadjuvante entre os demais elementos da mistura na busca do estilo pretendido.
André: É, definitivamente, este é um dos caras que realmente conseguiu misturar samba e rock e criar discos no mínimo interessantes, mesmo que não goste do estilo dele. Não me é marcante, mas dá para curtir uns grooves legais como em "Ponta de Lança Africano (Umbabarauma)" e a clássica e conhecida "Taj Mahal" (pena que tem cuíca, eu realmente não gosto de cuíca).
Christiano: Acho Jorge Ben um cara menosprezado. Talvez isso aconteça por conta dos rumos que sua carreira tomou já no fim dos anos 1970. África Brasil é uma amostra do quão original um artista pode ser: já nos primeiros segundos da primeira faixa, “Ponta de Lança Africano”, é possível identificar um tipo de sonoridade muito própria cunhada pelo futuro Sr. Benjor. É aquela história de assinatura musical muito particular. Ao longo do disco, o que temos é um desfile de ótimas músicas, com um clima meio despojado, brincalhão e original. Destaque para “Xica da Silva” e “Hermes Trismegisto Escreveu”, grandes momentos deste grande álbum que, ao lado de Força Bruta (1970)está entre os meus preferidos da carreira do grande Jorge.
Davi: Clássico da música brasileira e um marco na carreira de Jorge Ben. Foi a partir daqui que ele abandonou de vez os violões, assumindo a guitarra como seu principal instrumento. Fundiu a música negra brasileira com a música negra norte-americana. Ou seja, mistura seu samba rock com funk e soul, criando uma sonoridade cativante. O LP apresenta alguns hits, como “Ponta de Lança Africano (Umbabarauma)”, que os mais jovens vão conhecer pelo Soulfly, e “Taj Mahal”. Outros momentos marcantes ficam por conta de “Meus Filhos, Meu Tesouro” e “Xica da Silva”.
Diogo: A presença de Tábua de Esmeralda na edição dedicada a 1974 foi uma das maiores (e mais desnecessárias) polêmicas desde que a série teve início, se não a maior de todas. Pergunto-me, caso este álbum desse as caras duas edições depois, e Tábua de Esmeralda nunca houvesse aparecido, qual seria a reação. Particularmente, considero África Brasil um disco superior, mais gostoso de ouvir, com um trabalho de baixo, bateria e percussão mais envolvente. Apesar da inegável brasilidade do trabalho, Jorge promove uma fusão muito natural da música negra brasileira com a norte-americana e, não fossem instrumentos tipicamente nossos trabalhando forte na percussão, seria muito fácil encaixar suas bases em pancadões soul/funk lançados pelas gravadoras Stax e Motown. As letras são dotadas de um lirismo todo particular, que pode soar estranho a muita gente, mas que eu curto. Respeito Jorge por ter criado um estilo próprio não apenas em sua música, mas em suas letras também. Pouca gente consegue fazer isso.
Fernando: Quando as músicas ficam apenas nas partes instrumentais me lembra o funk setentista, mas basta as vozes aparecerem para me desanimar com o som. Não gosto da interpretação de Jorge Ben, essa “malandragem” que ele passa na voz não me agrada.
Flavio: Jorge Ben em talvez o seu álbum de maior sucesso, com pelo menos quatro músicas clássicas, se não me engano. Eu, que me lembro vagamente da época no Brasil, recordo-me de seu sucesso. Foi uma experiência interessante reouvir o disco, com olhar mais criterioso, anos depois. Ouvir os sucessos "Xica da Silva" e a homenagem ao craque Zico, em "Camisa 10 da Gávea", foi agradavelmente nostálgico. Percebe-se claramente a influência soul (na época um sucesso importado dos EUA) no samba rock de Ben. O disco soa leve com os tons irônicos, folclóricos e futebolísticos das letras. Não dá para ficar alheio à importância da bolacha e encontrar boas qualidades nas composições. Boa produção, com bastante presença de elementos percussivos, como cuíca, chocalhos, surdos, apitos, além da guitarra elétrica quase sempre com função de base, e poucos solos aqui e ali, acertada para o estilo, com a procura pop que trouxe maior sucesso para a carreira de Jorge. Como não gosto de Ramones nem de Bob Dylan, o encaixaria tranquilamente na edição da série dedicada a 1976, mas vejo outros que o substituiriam tranquilamente nesse ano, inclusive o Judas Priest, com Sad Wings of Destiny, sugerido pelo Ulisses.
Mairon: Jorge Ben ter entrado na lista abordando 1974 foi um dos maiores absurdos da série. Já em 1976, com África Brasil, o brasileiro não figurou entre os dez mais, até porque, como eu disse na edição dedicada ao Ulisses, 1976 foi um baita ano. África Brasil me foi mais simpático que A Tábua de Esmeralda logo de cara, pois começa com a sensacional "Ponta de Lança Africano (Umbabarauma)", uma das melhores canções da carreira de Jorge Ben, com vocalizações femininas e um embalo sensacional. As outras canções clássicas, "Taj Mahal", "Xica da Silva" e "África Brasil (Zumbi)", também soam muito agradáveis. Agora, o grande mérito de África Brasil é a banda que está acompanhando Jorge Ben. A metaleira em "Hermes Trismegisto Escreveu" e "A História de Jorge" (essa ainda com uma baita tecladeira) é de primeira, e a cozinha Dadi Carvalho (baixo) e Gustavo Schroeter (bateria) faz misérias nos ritmos suingados, criando um groove contagiante do que podia ser um belo disco, além de Dadi ser o centro das atenções na agitadérrima "Cavaleiro do Cavalo Imaculado". Mas daí veio a choradeira desafinada de "O Filósofo", "Meus Filhos, Meu Tesouro" e, putz, só a cozinha mesmo se salvou, pois isso me traz as piores lembranças de A Tábua de Esmeralda. A cuíca na simpática "O Plebeu" e na homenagem a Zico em "Camisa 10 da Gávea" também não me soou nada bem. Não entraria na edição dedicada a 1976 nem a pau, nem na lista de melhores brazucas da década de 1970.
Ronaldo: Este disco é como se fosse Jorge Ben saindo do campo de grama para o futebol de salão. Seu swing ficou ainda mais acentuado na guitarra elétrica, embalando seus contos hilários. Um discaço caricaturalmente brasileiro em tudo – no balanço, nos arranjos, na temática. Golaço com as camisas rubro-negra-tricolor-alvinegra-cruz-maltina.
Ulisses: Conheço bem pouco da música de Jorge Ben (além de África Brasil, só ouvi Tábua de Esmeralda e Samba Esquema Novo, de 1963), mas o som desse cara sempre me pareceu algo bem curioso e inventivo, e tão divertido quanto inovador. Não sei como anda o som dele atualmente, mas África Brasil segue provocando impressões positivas, ainda, quatro décadas depois, com seu samba rock que traz, de bandeja, funk e psicodelia.

Talking Heads - Remain in Light (1980)
Bernardo: Mistura de punk com afrobeat, de jazz com disco, de rap com fluxo de consciência, Remain in Light é a prova que “geração perdida” é o escambau quando se fala de década de 1980, pois é quando os Talking Heads lançaram sua obra-prima, um discos mais ambiciosos do pop e do rock em geral, desconstruindo concepções básicas de rock, dando independência a instrumentos, criando ritmos inacreditáveis, um bate-estaca tão envolvente quanto imprevisível, como dá pra ouvir nos dois hinos do disco “Born Under Punches (And the Heat Goes On…)” e “Once in a Lifetime”.
Alexandre: Bem, a New Wave me passou longe nos anos 1980, absorto que eu estava naquela catarse de grupos de hard rock e metal que invadiram e arregaçaram o Rock in Rio de 1985. Curioso a ser forçado aqui a ouvir mais do estilo New Wave, esperava algo mais calcado no gênero em si, mas foi colocar o disco pra tocar e perceber uma mistureba embrionária de world music, cheia de atabaques africanos e sons eletrônicos, com um vocal chato às vezes falado, às vezes com linhas vocais até interessantes, mas que se repetem demais. Confesso, eu estava entregando o jogo... Aí vieram dois solos de guitarra (em especial o segundo) na faixa "The Great Curve" com um timbre “animal” e muito fora da curva. Saí da letargia e fui ver quem era esse guitarrista, pois ele lembrava Adrian Belew. Triste a constatação, pois era o próprio, convidado da banda. Ou seja, do grupo em si eu não gostei de muita coisa. É como eu já citei, algumas linhas vocais, por exemplo em "Crosseyed and Painless", mergulhadas nessa world music sem muita variação de acordes durante as canções. A banda, recheada de convidados (em especial o próprio Belew), cresce bastante durante as apresentações ao vivo da turnê subsequente, mas como a análise é sobre o álbum em si, eu vou contabilizar mais contras que prós. No entanto, a proposição por tentar entender os caminhos que o grupo percorreu até chegar a este Remain in Light me deixa em aberto a possibilidade de fazer uma pesquisa mais apurada sobre a totalidade de sua obra.
André: Uma daquelas bandas ditas como "inclassificáveis", visto a variedade de estilos que usam. Tem quem goste (e são muitos), mas não é para mim. Mas gostei da faixa "The Great Curve", que possui uma melodia de baixo, bateria e teclado bem carismática.
Christiano: Depois de escutar este disco, senti-me um E.T. Tanta gente elogia o Talking Heads, destacando a importância da banda, de David Byrne etc. Mas eu só achei chato. Foi uma tortura ter que escutar até o fim. Tudo bem que é um troço diferente, meio experimental, mas é chato de doer, sem pé nem cabeça, repetitivo. Não entendi.
Davi: Banda extremamente cultuada, mas na qual nunca consegui ver muita graça. O álbum com o qual sou mais familiarizado deles é Talking Heads: 77 (1977), já tive que tocar “Psycho Killer” na noite, e também tenho em casa um ao vivo chamado The Name of this Band Is Talking Heads (1982). Ouvi o disco e, mais uma vez, não foi algo que tenha me tocado profundamente. Bem produzido, bem tocado, mas as composições são bem chatinhas. “Crosseyed and Painless” é a melhor do disco, na minha opinião.
Diogo: Deste álbum, conhecia apenas o quase sucesso "Once in a Lifetime", que é uma música inteligente, imprevisível, magnífica e curiosamente memorável. Escutei o restante do disco e nenhuma delas me soou tão bem quanto ela, mas a impressão geral foi boa. Como fã do King Crimson de Discipline, lançado dois anos depois, fica evidente a inspiração que Robert Fripp encontrou no Talking Heads, um sinal de grandeza que poucos músicos com sua bagagem se dão ao luxo de demonstrar. As canções baseiam-se bastante na repetição de determinados temas, mas isso felizmente não as torna enfadonhas, pois o grupo sabe trabalhar muito bem os arranjos e as melodias (e as não-melodias) vocais sobre esses temas. Não é o tipo de som que pretendo escutar com grande frequência, mas me estimulou a conhecer melhor a carreira do Talking Heads. Consiste, sem dúvida, em uma indicação muito superior e mais importante que outras que deram as caras na série em se tratando na nossa popular "cota alternativa".
Fernando: Muita gente considera o Talking Heads uma daquelas bandas "one hit wonder" por conta de “Psycho Killer”, que TODAS as bandas covers de TODOS os bares tocam. Conheço algumas pessoas que gostam do grupo e sei que a música citada nem sempre é considerada entre as melhoras deles, mas quase nada além dela me agradou. Ouvi o disco todo esperando mudar de ideia, mas é isso mesmo.
Flavio: Um disco revolucionário para a época, com destaque absoluto do guitarrista Adrian Belew, que, pelo que vi, nem era da banda, sendo portanto um convidado. O uso de repetições de segmentos, frases musicais, predomina na bolacha toda, determinando o início do estilo eletrônico, que é prenchido com bastante percussão, em estilo tipicamente africano. Não sou fã do timbre de David Byrne, apesar de entender a influência do seu trabalho no Talking Heads naquilo que viria depois, como o eletrônico e todos os seus afiliados. Podem ser destacados os bons vocais dobrados e a produção, que acerta em cheio o objetivo de fazer um álbum inovador. Não destaco música em especial: em geral não é um disco que me agrada, já que o estilo não é o meu predileto. Ficou a referência do trabalho para a entrada de Adrian Belew no King Crimson, o que por si só já é um ponto positivo.
Mairon: Assim como o The Police, o Talking Heads é outra banda que não consigo curtir. David Byrne é um cara genial, disso não duvido, mas as músicas da banda são muito "experimentais" para minha cabeça. Neste caso, o grupo parece estar fazendo um embrião do que veio a ser o King Crimson meses depois, até porque a presença do malucaço Adrian Belew nas guitarras junto da loucura magnífica de Brian Eno é a união da fome com a vontade de comer. Soma-se a isso toda a capacidade criativa de Byrne e temos um disco muito diferente do usual. Instrumentos africanos perambulam aqui e acolá, batidas ritmadas para ficar na mente da criatura, mas falta algo que me dê um tesão na audição. É muita repetição de frases na mesma música, o ritmo não muda, sei lá, não consegui achar nada de bom aqui. Em um bom dia, acho que apreciaria somente "The Overload", por conta da sua soturnice. Portanto, sem chances de entrar na lista dedicada a 1980.
Ronaldo: Uma espécie de pop irreverente que se tornou muito influente no pós-punk e New Wave, mas que, assim como quase 100% do estilo, carece de um pouco mais de imaginação. Quase todas as músicas do disco parecem apostar todas suas fichas em um único e pequeno fragmento musical, repetindo-o infinitas vezes. As canções terminam exatamente como começam e apenas a voz consegue trazer algo que te faça achar graça. Destaque para a faixa "Once in a Lifetime"; ainda que apoiada sobre a mesma premissa do restante do disco, o faz com bons ganchos.
Ulisses: Não vou negar que o som New Wave do álbum, banhado em ritmos africanos e funk, é deveras chamativo em um primeiro momento. Porém, no decorrer da audição, ficou bastante claro que, embora apresente uma boa diversidade de ritmos e climas, Remain in Light não possui quilate para ser algo mais que um registro interessante de experimentação sonora.

The Jesus and Mary Chain - Psychocandy (1985)
Bernardo: Uma muralha intransponível de ruídos. Muitos mencionarão isso como um defeito, mas, para ser sincero, minha alma sofre um novo abalo sempre que ouço “Just Like Honey”, “The Living End”, “The Hardest Walk”, “My Little Underground” e tento entender como eles fizeram essa mescla de pop onírico com atmosfera perturbadora; enquanto o melhor do noise/shoegaze cerca nossos ouvidos, Jim Reid sussurra de maneira quase sessentista, quase como se The Jesus and Mary Chain fosse a bad trip dos Beatles e dos Beach Boys, sendo românticos em uma terra de pesadelo. Disco com o peso de um sussurro e a leveza de uma bigorna.
Alexandre: Bem, como eu só conhecia a banda de nome, fui “providenciar” o álbum e achei que havia errado de arquivo, porque o que estava ouvindo era uma fita demo gravada no estúdio caseiro daqui de perto. E gravado em 1985, ou até antes, porque hoje nem o estúdio caseiro grava algo com um som tão tosco como esse. Tentei outras fontes, a barulheira continuava. Ou seja, era isso mesmo, era esse o arquivo sim... “Holy mother of reverbering vocals!!!!”, diria o menino prodígio para o homem-morcego. Mas a primeira música ainda não era o pior em qualidade de som. Quando começou a segunda faixa, com o apropriado nome "The Living End", saíram os guitarristas, entraram um bom punhado de apiários e um sem-número de enxame de abelhas que ficaram até o fim do álbum. Como se não bastasse, o produtor declarou guerra às frequências graves e resolveu deixá-las de fora do álbum, fazendo com que o baixista, cujo nome atende por Douglas Hart, tivesse de promover uma rebelião para que pelo menos os seus timbres pudessem dar as caras por aqui. É seu o melhor (?) momento do álbum, lá pra perto dos dois minutos da faixa "The Hardest Walk", em que as abelhas ficaram no “mute” e da bateria restou o bumbo. Pena que são apenas cerca de dez segundos. De resto, foi puro sofrimento em 39 minutos intermináveis. Pior disco da lista.
André: Sem chance, acho essa banda e esse estilo vocal de rock alternativo enfadonhos. Mais sussurro do que canto. Eles pelo menos têm o mérito de possuir um pouco mais de energia, a exemplo de "Cut Dead", mas me dou o direito de desgostar mesmo de bandas consagradas e consideradas importantes quando se trata de um estilo que me desagrada.
Christiano: The Jesus and Mary Chain é uma banda bem esquisita e Psychocandy (1985) é indicado por muitos como um dos melhores momentos de sua carreira. Não é um tipo de som muito fácil de ser assimilado, por conta do uso excessivo de recursos como microfonia e barulhos meio caóticos, mas era uma proposta bem inovadora para a época. Além disso, as composições são boas, têm um clima interessantemente claustrofóbico. Acho que a banda é um tipo de versão suja do The Church, só para citar uma fonte de comparação, e isso é bom.
Davi: Lembro-me de ver alguns vídeos deles nos anos 1980 e também no início dos anos 1990, sem que nunca me chamassem atenção. Escutei o disco e realmente não me cativou. Influência latente de Joy Division e Velvet Underground. Dois artistas dos quais nunca gostei. Definitivamente, não é minha cara. Sem momentos de destaque para mim.
Diogo: Os caras pegaram aquilo de que menos gosto na psicodelia californiana sessentista e adicionaram um mar de microfonia e um oceano de ambiência tipicamente oitentista. Muito difícil gostar disso. Ouvir música é como degustar um prato de comida: não adianta desafiar o convencional e tentar criar algo original se o resultado não apetecer, seja ao paladar ou à audição. A mim, Psychocandy não apeteceu. Há boas melodias cá e lá, a proposta é inovadora e bem executada, mas não há nada que me faça querer ouvir o álbum novamente, pelo menos a curto e médio prazo. É uma peça importante para entender alguns rumos que a música tomaria algum tempo depois, mas, assim, como um artefato bélico em um museu, é melhor que permaneça como uma memória do que seja novamente colocado na ativa.
Fernando: Depois do grunge e de aprender as origens do movimento da cidade de Seattle, busquei conhecer os precursores do chamado rock alternativo. Encontrei Pixies, Sonic Youth, The Jesus and Mary Chain, entre outros. Porém, eu nunca consegui gostar deles como gostava de Nirvana, Pearl Jam, Soundgarden etc. “Just Like Honey” tem uma sonoridade etérea que engana no começo e, a partir de “The Living End”, a barulheira causada pela distorção saturada começa e chega no seu auge em “You Trip Me Up”. Serviço de utilidade pública: não ouçam com fone de ouvidos! 
Flavio: Bom, aqui a coisa desanda: o The Jesus and Mary Chain faz um disco por vezes muito lento, com um vocal sussurante, com aquela guitarrinha limpa bem "basicona", ou às vezes puxada para o punk, com o uso de um timbre de overdrive insuportável. O resto da banda compõe sem melhorar o panorama. O desepero foi aumentando quando vi que haveria quinze músicas, e o alívio quando acabava cada uma era maior. Não posso destacar nada aqui. Desculpe-me, Bernardo, mas esse vocal foi de matar, onde gravaram isso? Dentro de uma tubulação de gás com uma britadeira em compressão? Minha esposa perguntou que ruído é esse que entrou sem querer no disco e por que não tiraram? Para finalizar, gostei do título da última música, que reflete o meu sentimento ao ouvir o disco:  "It's So Hard".
Mairon: Essas bandas do pós-punk não me causam uma impressão muito forte. Claro que admiro e respeito a história de grupos como o Jesus, mas não consigo ouvir um álbum inteiro sem pensar que o que está ali é uma ampliação piorada do que o punk propôs uma década antes. Tem momentos bons ("My Little Underground", "The Living End", "Never Understand", "Something's Wrong" e "The Hardest Walk", que me lembrou Pixies), momentos que não fedem nem cheiram ("Taste of Cindy" e "You Trip Me Up") e momentos que poderiam nem existir ("Taste the Floor", "Inside Me",  "It's So Hard" e "In a Hole", que parece ter sido o avô do Nirvana). Ou seja, é mais sem gosto que sopa de nabo. Gostei do estilo Lou Reed de "Cut Dead", a melhor do disco. Ah, e quando pintou "Just Like Honey" e "Sowing Seeds", juro que ouvi a voz de Raul dizendo: "Um dia, numa rua da cidade, eu vi um velhinho sentado na calçada, com uma cuia de esmola e uma viola na mão". É um disco legalzinho, mas mesmo com RPM em primeiro em 1985, não entraria de nenhuma maneira na lista dedicada àquele ano.
Ronaldo: Para quem conhece bem o rock psicodélico norte-americano dos anos 1960, o tipo de som do The Jesus and Mary Chain neste disco não surpreende. Nada aqui é novidade em termos de construção sonora e primitivismo musical. A roupagem, esta sim, totalmente oitentista, é que é a impressão digital do trabalho. E isso não é um predicado positivo neste caso, porque aqui se encontram em abundância os piores lugares-comum daquela década – som abafado, timbres horríveis de bateria, guitarra e teclados e vocais entendiantes, apáticos, sem um pingo de pegada.
Ulisses: Eu estava com essa banda há algum tempo no meu PC e esta lista foi o empurrão necessário para que eu a ouvisse propriamente, pois eu já havia lido vários comentários positivos em relação a ela. Trata-se de um pop rock encoberto por uma grossa camada de reverb, microfonia e distorção que, embora dê vida a um resultado inegavelmente engenhoso, não escapa de soar repetitivo e pouco refinado, dando a entender que os caras haviam desenvolvido mais o conceito sonoro do que as composições que fariam parte dele. Entretanto, logo de cara fica marcada a (óbvia) influência deste registro para bandas posteriores, que souberam trabalhar melhor esse tipo de sonoridade.

Primal Scream - Screamadelica (1991)
Bernardo: Os Stones foram pra Manchester na época do filme “A Festa Nunca Termina” (2002), trocaram a heroína por ecstasy e resolveram fazer Screamadelica. Só isso explica. Brincadeira. Na verdade não: é fruto da mente insana do ex-baterista do The Jesus and Mary Chain Bobby Gillespie. O sujeito pegou o blues rock e misturou com o batidão da nascente cena dance, pegou andamentos de dub para a cozinha e fez um dos discos mais viajados e rebeldes de sua época, com uma justa homenagem ao rebelde eterno Peter Fonda em um trecho de áudio no início de “Loaded”, no qual reproduz sua fala do filme “Os Anjos Selvagens” (1966) em que prega liberdade e chapação. Por isso, a simpática “Movin’ on Up” pode até soar atraente, mas nada te prepara para o literal “rock de rave” de “Slip Inside this House”, as duas partes de “Higher than the Sun”, na qual tudo é vertido em uma viagem digna do Funkadelic em sua obra-prima Maggot Brain (1971), entre outros momentos de puro brilhantismo. Que discão da porra. Continua tão despirocado, rebelde eanticonvencional quanto era na época. É tão característico mas não ficou datado um dia. Como diria uma das próprias canções… “Don’t Fight It… Feel It”.
Alexandre: É uma questão de estilo, provavelmente. Até que a primeira música não é de todo ruim, uma mistura de "Sympathy for the Devil" e o coral gospel de "Oh! Happy Day". Entraram a bateria eletrônica e todos os elementos mais eletrônicos no álbum e eu invariavelmente comecei a torcer o nariz. A tal questão de estilo. A voz de Bobby Gillespie, por vezes um “fiapinho” frágil, também não contribuiu para alguma melhoria na avaliação. Uma mistura de Rolling Stones e The Black Crowes com sons mais pasteurizados. As músicas são um tanto genéricas e também não me chamaram atenção, a despeito do arranjo mais modernoso. Quanto mais eletrônico, pior, como em "Higher than the Sun". A coisa descamba para o tal estilo “dub” de "Inner Flight" e isso é quase o fundo do poço. Entra "Freedom '90", eu me lembro do saudoso George Michael, mas aí descubro que não é a faixa solo do cantor inglês de ascendência grega e sim "Loaded". Desculpe-me, Bernardo, quando eu trouxer uma boa saraivada de álbuns de hard e metal, você pode dar o troco. Este ficou difícil.
André: Mais uma banda que venera drogas e que provavelmente gravou o álbum sob o efeito das tais. Mais vocais arrastados. Mais chatice. Mais florzinha. Mais hippies. Mais... Paro por aqui.
Christiano: Outro disco bem conceituado no meio da galera mais “descolada”. Outro que me fez sentir desconfortável. Só achei chato, cheio de barulhinhos engraçadinhos e bobos, que servem para ornamentar músicas muito mais ou menos. Uma tortura.
Davi: Início dos anos 1990, as raves e os ácidos tomavam conta da noite e parecem ter feito a cabeça dos músicos do Primal Scream. Resolveram se afastar um pouco do rock e entrar de cabeça na música eletrônica que começava a ditar moda. Há quem considere este álbum um clássico, mas sempre o considerei um disco de mediano para baixo. Extremamente confuso e bastante cansativo. “Movin' on Up”, com sua pegada Rolling Stones, é uma ótima canção e é, de longe, a melhor do disco. “Slip Inside this House”, embora já esteja na pegada da house music, ainda agrada. Outro momento interessante é a balada “Damaged”, na qual Bobby Gillespie volta a encarnar Mick Jagger. O resto do álbum é bem chatinho.
Diogo: Mudanças podem ser muito positivas. Como a que Bobby Gillespie fez ao deixar de ser baterista do supracitado The Jesus and Mary Chain para assumir a linha de frente de sua própria cria, o Primal Scream. Não que eu tenha achado Screamadelica uma maravilha (longe disso), mas se trata de uma expressão artística bem mais audível que Psychocandy. O álbum tem geografia e temporalidade bem estabelecidas – Grã-Bretanha da virada dos anos 1980 para a década seguinte –, isto é, trata-se de algo bem datado; mas quantos discos ainda mais datados idolatramos sem restrições? Não vejo problema nisso. Screamadelica parece ter sido concebido tendo em vista as pistas de dança, explorando bem alguns ganchos vocais e instrumentais e estendendo as faixas a durações mais longas que o normal (às vezes demais, como em "Come Together"). "Don't Fight It, Feel It" é um ótimo exemplo disso, assim como "Jaded". Na boa, eu nunca fui muito chegado em casas noturnas "alternativas" (de nenhum tipo, na realidade) e pistas de dança me são territórios hostis, mas é muito, muito melhor ouvir músicas de grupos como o Primal Scream (e EMF, The KLF...) nesses ambientes do que aquele indie rock pau molenga pós-Strokes que infesta esses ambientes há muitos anos. Há momentos que destoam disso, como a surpreendente "Inner Flight" e "Damaged", uma totalmente diferente da outra e remetendo a épocas distintas.
Fernando: Da mesma forma que o The Jesus and Mary Chain é um precursor do grunge, podemos dizer que o Primal Scream é antecessor do britpop. Mas aqui a coisa já é diferente. Começa totalmente calcada em um som setentista, tem melodia e um trabalho vocal bastante agradável. Porém, é muito variado ao longo do tracklist. Tem uma mistureba que, se em algumas músicas vai bem, em outras não. “Come Togheter” (que poderia ter uns três minutos a menos) é daquelas músicas que todos já ouviram, mas quase a totalidade não faz ideia de quem seja o artista.
Flavio: O disco começa com a animada pop "Movin' on Up", obviamente influenciada pelos Stones, recheada de vocais femininos em tom gospel, acompanhada de um solo de guitarra que poderia entrar em qualquer disco da banda influenciadora.  Entretanto, esse panorama neo-Rolling Stones não prossegue no restante da bolacha. O disco traz em seu "core" elementos de pop/techno/dance/lounge/eletrônica, misturando instrumentos tradicionais com o uso extremo de sintetizadores e samplers. Apesar de não ser adepto do estilo, encontro bons elementos harmônicos em Screamadelica e entendo-o como um disco influenciador até para artistas que não se ambientavam nesses elementos citados, como Madonna em Erotica (1992) ou mesmo o U2 (muitos anos depois) em Pop (1997). O vocal de Bobby Gillespie é agradável e funciona bem no estilo. Há momentos mais interessantes, como o solo em "Damaged" e o baixo em linha simples, mas agradável, em "Higher than the Sun", e outros nem tanto, como a chata "I'm Comin' Down". Enfim, um bom disco, influenciador, porém um pouco longo demais, o que cansa um pouco no fim.
Mairon: Screamadelica foi o primeiro contato que tive com o Primal Scream, há algum tempo. A versão de "Slip Inside this House" (original do The 13th Floor Elevators) já mostra que os escoceses gostavam de beber na psicodelia, adicionando samples e batidas de acid house, enquanto "Come Together" (não a dos Beatles, e em sua versão editada, porque a completa é um saco) e a clássica "Loaded", com a levada de "Sympathy for the Devil", tocavam direto nas rádios FM do Rio Grande do Sul, então era fácil saber quem estava ali. É interessante perceber que apesar de usar samples de muitas canções antigas, os guris estavam bem influenciados pelos nomes em voga no cenário musical, como George Michael na gospel "Movin' On Up", um pouco de R.E.M. em "Damaged" e até o Depeche Mode de Violator (1990) misturado com um pouco de Genesis na sensacional "Higher than the Sun". Mérito nesse caso, claro, para a produção de The Orb, que dá um ar ainda mais nostálgico sobre a década de 1990. Cara, na época se criticava isso para quem era fã do hard setentista, mas o amadurecimento das pessoas faz perceber que, pôxa, os caras fizeram algo bem significativo para a música. Curti a psicodelia simpática de "Shine Like Stars", a ousadia de misturar eletrônicos e sintetizadores de forma simpática na instrumental "Inner Flight", que soa como um "bem vindo, Pet Sounds, aos anos 1990", as percussões e o saxofone na intimista "I'm Comin' Down". Desnecessária mesmo só "Higher than the Sun (A Dub Symphony in Two Parts)" e a tosca "Don't Fight It, Feel It", com Denise Johnson nos vocais, tornando Screamadelica um disco longo demais, mas nada que destrua este álbum que marcou época e poderia realmente ter entrado por conta de sua importância no lugar do Death. Teria sido muito bem visto.
Ronaldo: Na década de 1990, houve um salutar resgate de sonoridades mais orgânicas e o Primal Scream é um expoente desse tipo de releitura. Ainda que usando francas novidades ao sabor da época, como as batidas eletrônicas, as bases usam bem pianos e violões acústicos e se valem de belos backings vocals. Suas melodias buscam reler o soul e o funk dos anos 1960/70 de forma muito autêntica, incorporando frases do reggae-pop e da disco music, em uma fusão bastante rica. Algumas faixas são desnecessariamente longas ("Come Together" é de uma chatice inacabável), mas compreensíveis no contexto de uma pista de dança.
Ulisses: Dentre os caminhos sonoros que o rock noventista explorou, o do Primal Scream é um dos mais chamativos: a sonoridade nebulosa do disco é resultado de um amalgáma de rock britânico com música eletrônica e psicodelia. Há momentos mais dançantes ("Don't Fight It, Feel It") e outros mais suaves ("Damaged"), garantindo que o registro entretenha o ouvinte de várias formas. Apesar da forte (e representativa) lista do ano de 1991, vejo que havia espaço para o Primal Scream no lugar do Teenage Fanclub ou do U2, por exemplo.

Tom Waits - Bone Machine (1992)
Bernardo: Um disco para os amigos da série odiarem: o esquisitão Tom Waits em uma vibe meio rock, meio folk, meio country, meio... Industrial. Isso aí. Seja no peso absurdo e ridiculamente “machão” de “Goin’ Out West”, a apocalíptica dobradinha de abertura composta por “Earth Died Screaming” e “Dirt in the Ground”, no proto-punk resmungão de “I Don’t Wanna Grow Up” (que você já ouviu com os Ramones) e até o quase-gospel “That Feel”.  Dá até pra entender por que o sujeito fica tanto tempo sem lançar disco: o esmero, a ambição e a pretensão poética, a mentalidade anticonvencional para pegar a música tradicional e desconstruir ela do jeito mais esquisito possível… Sim, ainda é aquele Tom Waits piradaço de Rain Dogs (1985), que se afastou do jazz para tornar maluquice musical uma marca registrada, mas provando que mesmo a música moderna não estava a salvo do seu olhar acurado, outsider e singular.   
Alexandre: A segunda música até passa, mesmo a voz super bêbada de Waits se adequou ao instrumental belo de "Dirt Ground". Há outros poucos momentos bonitos, em especial "A Little Rain (for Clyde)", um blues com bonito piano e acentuações de pedal steel guitar. O restante do álbum, quase que inteiramente mergulhado na esquisitice que atende pelo nome de música experimental/alternativa e nos brinda com ruídos estranhos, elementos de percussão desagradáveis e vocais de gosto pra lá de duvidoso, eu passo, serve para entrar no rol de premiações sem sentido do Grammy. É melhor que Mule Variations, de 1999, além do fato de ter quase 20 minutos a menos que aquele, o que pra mim é um bônus, mas é evidente que isso não pode ser considerado um mérito.
André: Mais um disco que apenas fortalece meu desgosto pelo Tom Waits.
Christiano: Um disco complicado. Tem alguns momentos interessantes, como “A Little Rain”, “Black Wings” e “Who Are You this Time”, mas a maioria das faixas é cheia de ruídos e altamente fragmentada. Não é o tipo de coisa que me agrada.
Davi: Toda vez que escuto um disco desse cara tenho a sensação de que ele está tirando uma com a minha cara. Pelo menos, serviu para ressaltar que os Ramones eram mesmo geniais. Os caras pegaram uma brincadeira de mau gosto, nesse caso “I Don't Wanna Grow Up” (me recuso a acreditar que ele fez aquele trabalho vocal a sério) e transformaram em uma ótima faixa punk rock em seu álbum de despedida ¡Adiós Amigos! (1995). O trabalho vocal dele soa como o de um bêbado raivoso (esse cara não canta, ele grunhe), os arranjos são piores do que os da Yoko Ono (achei alguém que conseguiu a proeza). Meu Jesus cristinho. Papai do céu, se assim me permitir, quando tiver um tempinho, por favor, me explique o culto em cima de Tom Waits. Amém!
Diogo: Há de se admirar Tom Waits em pelo menos um aspecto: o cara faz o que quer. Vai pro estúdio, convida uma penca de gente e os une em prol de sua música maluca e peculiar. Ainda por cima sustenta-se muito bem, obrigado, com sua arte e tem uma grande quantidade de admiradores, muitos dele o considerando um verdadeiro gênio musical. Da minha parte, Bone Machine não é algo que escuto ou pretendo começar a escutar em casa, mas não consigo achar seu trabalho ruim ou qualquer coisa do tipo. Tom tem estilo próprio, faz seus experimentos parecerem muito naturais e de vez em quando sai alguma coisa da qual eu até consigo gostar, como "Who Are You", "A Little Rain"e "Whistle Down the Wind", honestamente melancólicas.
Fernando: Toda vez que ouço Tom Waits eu fico me perguntando se existe mesmo alguém que chega em casa e pensa em ouvir alguma coisa dele. Sinceramente, eu duvido. Diz muito sobre um disco de um cantor e compositor quando as melhores partes são as que não têm voz, não é? Algumas partes me lembraram o Morphine. “Who Are You” me parece uma música cantada por alguém com uma forte dor de barriga. Fico me imaginando o cara se sentindo um gênio enquanto compunha um troço chamado “In the Colosseum”. Uma coisa que ficou na minha cabeça é que se Bruce Springsteen um dia perder a voz e gravar um disco com uns 90 anos soaria desse jeito. Sei que vai ter gente aí que vai citar um bar enfumaçado e um copo de whisky, mas, sinceramente, esse é um bar em que eu nunca iria.
Flavio: Tom Waits, reaparecendo cinco anos depois de seu disco anterior, traz em Bone Machine uma mistura forte de elementos percussivos e sons processados (vocais, guitarras) para "experimentalizar" o tradicional blues rock, modernizando-o para os anos 1990. Novamente, é uma mistura para os adeptos do rock alternativo e suas vertentes.  Para mim, ao realizar essa mistura há a perda do vocal e da base natural blues, descaracterizados pelos efeitos aplicados. Em alguns momentos, há o aparecimento de elementos de forma mais natural, como em "Who Are You" e "Jesus Gonna Be Here", mas essa não é a tônica da bolacha.  Enfim, o restante do experimentalismo todo não ajuda a tornar o estranho vocal de Waits agradável ou o álbum em si como interessante para a edição abordando 1992.
Mairon: Tão de brincadeira. Isso aqui é música? Achei que esta nova parte da série fosse para os discos bons que faltaram aparecer, e não os álbuns que ainda bem que não apareceram. Que coisa bem horrorosa, não se aproveita nada, nem o Keith Richards cantando em "That Feel", que tô para dizer, é uma das coisas mais terríveis que já ouvi neste ano. Tem louco para tudo...
Ronaldo: Algo capaz de estragar a semana de qualquer um.
Ulisses: Tom Waits trafega por caminhos tortuosos e indefiníveis, e em Bone Machine isso não é diferente. Acho as baladas "Who Are You" e "A Little Rain" até bem aceitáveis, porém o restante do álbum é uma espécie de blues primitivo e percussivo assombrado que causa grande estranhamento. Louvo a criatividade bizarra de Waits, mas o som é avant-garde demais (ou talvez nem isso) para meus ouvidos frescurentos. Até agora, das vezes em que a Consultoria me obrigou a ouvi-lo, ele só me agradou naquele álbum de 1985 (Rain Dogs), quando seu som era mais de boteco e menos de pesadelo monolítico.

Nick Cave and the Bad Seeds - Let Love In (1994)
Bernardo: E pra fechar, Let Love In, a magnum opus de Nick Cave lançada em uma crescente qualitativa em que combinou ambição artística com acessibilidade midiática, se tornando um ícone dos “cults” e “independentes”. O australiano alcançava a maturidade musical incorporando o mais sombrio dos blues do delta do Mississippi ao seu característico pós-punk gótico. Indo fundo em temas sombrios e desconfortáveis, pega pesado em “Jangling Jack” e “Thirsty Dog”, evoca uma atmosfera legitimamente soturna e assustadora em “Red Right Hand” (uma música para te fazer acreditar no sobrenatural), explode em intensidade em “Do You Love Me” e na ambiciosa letra e interpretação rasgada de “Loverman” e cheio de lamentos à beira da melancolia em “Nobody’s Baby Now”, “Ain’t Gonna Rain Anymore” e “Lay Me Low”. Se quer saber, este pode não ser o disco “raiz” de Nick (aí você tem que ouvir a porrada desgovernada que é Your Funeral… My Trial, de 1986), mas é o seu maior clássico para o público ao lado de Tender Prey (1988) e Henry’s Dream (1992). Quem acha que década de 1990 se resumiu a Seattle ou L.A. não sabe o que está perdendo: um dos maiores compositores do século XX, com seu universo todo próprio à volta com fé, amor, luto, sexo e violência… E às vezes tudo isso de uma vez só.
Alexandre: Bem melhor que o outro disco do projeto Cave e banda que ouvi, The Boatman’s Call, de 1997. Aquele entrou na lista final, este não. Se eu pudesse, trocava. O que não gosto são dos timbres mais bêbados de Nick. Quando ele se mantém nos registros graves e tem como aliadas boas melodias, a coisa funciona. Ao vivo é outro assunto, muito mais delicado, portanto vou me ater ao que ouvi aqui. Acho interessante o começo do álbum, com "Do You Love Me?" e "Nobody’s Baby Now". A versão de "Loverman" é melhor no Metallica, mas não chega a comprometer e tem o mérito de ser a original. "Right Red Hand" poderia ter um solo de órgão menos óbvio ou então com menos espaço dentro da canção, mas de resto funciona. A acelerada "Thirsty Dog" também passou bem. "Ain’t Gonna Rain Anymore" talvez seja a que mais me agradou, em especial a orquestração sutil no refrão em contraponto aos timbres graves de Nick. No fim do álbum, em especial em "Lay Me Low", o vocal passou dos níveis alcoólicos desejáveis e parece que estamos ouvindo um cantor de karaokê que "encheu o pote". Nesta lista, Let Love In não é nenhuma maravilha, mas se salva.
André: Ufa, finalmente uma banda da qual gosto, pensei que ficaria restrito ao Kinks. Gosto dos teclados deste disco, dos ótimos arranjos e da doce voz de Nick Cave, como em "Nobody's Babe Now". É uma banda que sabe possuir a atmosfera de "exótica" ao mesmo tempo que produz faixas em que usa essa estranheza a favor do ouvinte, embora não seja lá fácil de digerir logo de primeira. Bem, fico aliviado que pude elogiar mais de um disco nesta edição ou eu me sentiria o mala da rodada.
Christiano: Denso, mas muito interessante. Nick Cave é uma figura soturna, e isso fica muito evidente em boa parte dos discos que lançou. De fato, Let Love In está entre os melhores que já escutei de sua longa carreira. As músicas são densas, mas possuem uma beleza melancólica. As faixas mais interessantes são justamente as mais introspectivas, que são a maioria neste bom disco. Pessoalmente, prefiro o álbum posterior, Murder Ballads (1996), mas gostei da indicação.
Davi: Lembro de ouvir a bacaninha “Red Right Hand” no filme "Débi e Lóide" (1994), estrelado pelo hilário Jim Carrey. Por algum motivo, a música acabou não entrando na trilha do filme, assim como aconteceu com a faixa do The Cowsills e a do Apache Indian. "Bacaninha" também é um termo que serve para definir o disco. Sua audição não é uma tortura, mas também não é algo emocionante e inesquecível. Além da já citada “Red Right Hand”, colocaria como destaque as simpáticas “Nobody's Baby Now” e “I Let Love In”. Interessante, nada mais.
Diogo: Estivesse eu vivendo uma fase mal resolvida em relacionamentos amorosos, talvez gostasse muito mais de Let Love In. Como não estou, a identificação é menor e a apreciação também, mas isso não me impede de destacar o bom trabalho levado a cabo por Nick e seus asseclas. Faixas como "Do You Love Me?" (as duas partes), "Nobody's Baby Now", "Loverman" e "I Let Love In" são bem interessantes e interpretadas com honestidade, algo que faz muita diferença nesse tipo de canção. Assim como Tom Waits, Nick desenvolveu um estilo muito peculiar e trafega bem sobre esse terreno, oferecendo obras únicas, que não remetem a esse ou aquele artista. Isso sempre é um mérito. Talvez a médio prazo dedique um tempo a explorar melhor sua discografia.
Fernando: O vozeirão de Nick Cave nunca me agradou muito. Mas logo de cara, com a faixa “Do You Love Me”, rompi essa premissa e achei legal. “Nobody's Baby Now” também surpreendeu com seu piano bem evidente. Pelo que eu lembro de outros discos, achei este um pouco diferente do habitual. Não é algo pelo qual morri de amores, mas posso voltar a ouvir de novo sem problemas.
Flavio: Pra finalizar, Nick Cave and The Bad Seeds trazem em Let Love In um disco de rock básico sem muitas novidades, porém às vezes lento demais. Podemos destacar a produção simples e limpa que mantem o som básico cozinha+guitarra/piano bem ajustadinho. Encontrei músicas interessantes como "Do You Love Me" e "Nobody's Baby Now", mas quando Nick foge da linha vocal mais calma ou mesmo limitada e se aventura ou a abrir um falatório ou cantar de forma mais vigorosa, percebe-se que há muitas limitações no seu vocal, que começa a fugir da afinação ou trazer desagradáveis timbres, como em "Jangling Jack" e "I Let Love In", muitas vezes cobertos com backing vocals na tentativa de salvar a evidente falha. Apesar da banda ser ajustadinha, o resultado começar a "ir para o vinagre" nesses momentos. Novamente, não vou aprovar o trabalho como uma boa escolha.
Mairon: Clássico álbum da década de 1990, regado a muita psicodelia e sonoridades envolventes na linha que vai de Bowie a Joy Division. Nick Cave é um nome que ou me agrada ou me provoca ódio, e este álbum em especial gostei de ouvir. Adorei escutar as canções acessíveis, que são a balada "Nobody's Baby Now", linda por sinal, a sutil "I Let Love In", com uma bela performance vocal de Nick, o rock pegado de "Jangling Jack" e "Thirsty Dog" e a forte explosão de emoção de "Lay Me Low". Mas foi nas faixas mais incomuns que me encontrei em Let Love In, seja na voz sofrida e explosiva durante o refrão da primeira parte de "Do You Love Me?", o andamento arrastado de "Red Right Hand" e a pancadaria ignorante do refrão de "Loverman". Mesmo não tendo apreciado algumas músicas, no caso a segunda parte de "Do You Love Me?" e "Ain't Gonna Rain Anymore", este álbum teria feito uma bela parceria com Grace (Jeff Buckley) e eliminado pelo menos uma das várias absurdices que inventaram na edição abordando 1994, mas não votaria nele de jeito nenhum.
Ronaldo: Nick Cave tem uma voz de cantor country de raiz, o que dá um tempero bem interessante para o pop rock esquentado de sua banda. Algumas passagens são climáticas e mais pesadas, outras vão ao ponto direto demais e se tornam esquecíveis. Mas há momentos em que a banda casa belas linhas vocais com arranjos espertos e o resultado fica bastante apreciável.
Ulisses: Tenho um problema com os chatérrimos momentos em que o cara dá uma de roqueirão agitado ("Jangling Jack", "Thirsty Dog" e partes de "Loverman") mas, tirando coisas assim, o restante do álbum revela-se banhado em arranjos lentos, sensuais e blueseiros, que demonstram efetividade em tragar o ouvinte nesse clima. É interessante o suficiente para não se tornar uma audição tão cansativa quanto parecia ser. O registro tem seus méritos e entrega sua mensagem com solidez, mas ainda não estou nem um pouco mais próximo de me interessar, em geral, pela música de Nick Cave.
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