O  guitarrista John Mclaughlin sempre foi conhecido pelo seu talento em  revelar grandes músicos, e também por ser um ídolo de gênios do calibre  de Eddie Van Halen, Steve Vai e até mesmo Frank Zappa. 
John  estreou na carreira musical com o excelente álbum "Extrapolation"  (1969), onde seu virtuosismo jazzístico, aliado à precisão de Tony Oxley  na bateria e Brian Odgers no baixo, bem como o talento de John Surman  nos sopros, pode ser considerado como as raízes do fusion e da world music. 
Nos anos seguintes, McLaughlin lançou "Devotion" (1970) e "My Goals Beyond" (1971), seguindo a mesma linha de "Extrapolation".
Nesse  meio tempo, John tentou realizar aquilo que sempre foi seu sonho:  montar um grupo que misturasse jazz, rock'n'roll, blues e música  clássica. O maior detalhe desta banda é que ela não deveria ser parecida  com outras da época que tentavam soar da mesma forma (o que veio a ser  chamado de progressivo), mas sim basear-se única e exclusivamente em  longas seções dedicadas ao improviso e à harmonização das canções. 
Surge  então em 1971 a Mahavishnu Orchestra, onde McLaughlin é apoiado nada  mais nada menos por Jerry Goodman (violinos), Billy Cobham (bateria),  Jan Hammer (teclados) e Rick Laird (baixo), entre outros menos  conhecidos. Isto na primeira encarnação da Mahavishnu. Na segunda  (1974), os  músicos eram Gayle Moran nos teclados e vocais, Jean-Luc  Ponty no violino, Ralphe Armstrong, no baixo e Narada Michael Walden na  bateria. 
Como  era esperado, a Mahavishnu se revelou uma grande banda, com excelentes  músicos, mas com egos muito complicados. Mesmo assim, o grupo fez  sucesso com excelentes discos como "The Inner Mountain Flame" de 1971 e  "Apocalypse" de 1974.Em 1974 John reencontrou um velho amigo indiano,  Lakshminarayanan Shankar (L. Shankar), o qual já tinha feito seu nome  tocando com Ornette Coleman e Jimmy Garrison durante o final da década  de 60. 
Em  um concerto de Shankar, McLaughlin ficou extasiado com a sonoridade que  vinha da percussão que acompanhava o violinista, a qual era formada  somente por instrumentos indianos.A partir de então, alguns contatos  foram feitos e, com poucos ensaios, Shankar e McLaughlin se uniram,  formando uma das mais espetaculares bandas da década de 70, a Shakti. 
Basicamente  na Shákti McLaughlin teria a oportunidade de fazer aquilo que não  conseguia na Mahavishnu: tocar sem compromisso, sem seguir regras,  apenas seguindo o sentimento e a própria vontade. Os outros integrantes  da Shakti eram Zakir Hussain (tabla), Thetakudi Harihara Vinayakram  (ghatam) e Ramnad Raghavan (mridangam), todos naturais da Índia. 
Para tocar com os músicos indianos, John encomendou com o luthier  da Gibson, Abraham Wechter, um violão especial, que trazia sete cordas  adicionais perpendiculares às seis cordas tradicionais do violão normal,  as quais davam um som parecido com o de uma cítara.
Logo  no primeiro lançamento, uma obra-prima. "Shakti with John McLaughlin"  foi gravado ao vivo em um concerto na sala de espetáculos do Colégio  South Hampton, em Nova Iorque. O lado A conta com "Joy", com um belo  trabalho de Hussain, e "Lotus Feet", que viria aparecer depois na turnê  de McLaughlin com Paco De Lucia e Larry Coriell. 
Já  no lado B temos a incrível "What Need Have I for This - What Need Have I  for That - I Am Dancing at the Feet of My Lord - All is Bliss - All is  Bliss", que, conforme seu nome, possui mais de 28 minutos de muita  improvisação e sentimento. Durante toda a faixa fica claro que os  músicos estão em êxtase em cima do palco, no auge da inspiração e  harmonia. Os duelos de ghatam  e tabla sobressaem em várias etapas. O clima indiano e a levada  diabólica da música com certeza irão fazer você viajar pra outro mundo,  mesmo estando no seu quarto. 
Isso  era o principal da Shakti, a viagem sem fim. Mesmo contando com um  guitarrista de renome, não era ele o destaque da banda, aliás o grupo  não tinha um destaque. Todos se encaixavam de forma a harmonizar cada  segundo da canção, tornando assim a música uma peça não só para ser  ouvida, mas também absorvida como um bom vinho.
Em  1976 a Shakti lança o fabuloso "A Handful of Beauty". Logo de cara, uma  inovação: os músicos introduzem a canção "La Danse Du Bonheur" com  vocalizações que imitam as batidas de uma tabla. Perfeito!  Após a  introdução, uma ótima sequência entre violão e violino dá início a uma  levada forte, com um solo de violino rápido e eficiente. "Lady L."  diminui um pouco o ritmo da faixa anterior, e traz mais um belo solo de  L. Shankar. É difícil não ouvir essa música e compará-la com a versão de  "Kashmir" do UnLeded. 
"India"  talvez seja a mais bela composição do grupo, o que mostra que a Shakti  havia evoluído em termos de organização, não detendo-se apenas em  evoluir em cima de improvisos. A canção começa com lentos dedilhados e  arpejos de John, os quais vão aumentando a cadência lentamente e servem  de base para que L. Shankar delire em cima de seu violino. Um longo  improviso se faz ouvir, e com certeza, o clima oriental preenche o  recinto em que você estiver ouvindo essa canção. Com o passar dos 12  minutos, temos uma pequena sequência de harmônicos executadas juntamente  com a percurssão e o violino fechando a canção. Simplesmente demais. 
O  lado B começa com a rápida "Kriti", onde temos várias sequências em que  o violão faz duelos com o violino e com a tabla. É importante destacar  que Zakir Hussain está em papel de destaque em todas as faixas,  executando a tabla como poucos. A faixa seguinte, "Isis", está no mesmo  nível de "India". Quinze minutos de uma sequência de solos de Shankar e  John, sempre intercalados por um riff principal onde ambos fazem algo típico do oriente. 
O  LP termina com "Two Sisters", um lamento super lento apenas com John no  acompanhamento e L. Shankar executando um solo triste, porém marcante,  que deixa um gosto de quero mais para o ouvinte.
Em  1977 é lançado "Natural Elements". O disco tentou abranger um lado mais  comercial, não possuindo nenhuma faixa com mais de sete minutos, e com  os instrumentos indianos sendo substituídos (ou melhor, superados na  audição) por instrumentos mais ocidentais como cymbals, triângulos e  bongôs. 
O  disco começa com a rápida "Mind Ecology", onde, mesmo com os novos  instrumentos, existe uma levada bem oriental. Na sequência, "Face to  Face" é a mais comercial de todas. Uma música que poderia ser encaixada  em qualquer disco dos anos oitenta. 
A  curta "Come on Baby Dance With Me" (olhem o nome da canção!!!) dá  início à bela "The Daffodil and The Eagle". Esta é a que mais se  assemelha aos sons anteriores da Shakti, até por que é a maior faixa do  álbum. O início lento, apenas com o violão e o violino, dá um clima bem  oriental, que se alterna depois entre um ritmo mais rápido, ou não. O  sincronismo de notas entre McLaughlin e Shankar é fantástico. A mistura  de escalas de blues feita por John com um acompanhamento oriental da  parte percussiva cria um sabor diferente para o ouvinte, dando realmente  um nó na cabeça daquele que não está acostumado com inovações. Essa  canção já vale o investimento do disco. 
O  Lado B é mais fraco, mas mesmo assim traz momentos interessantes como  as vocalizações à la "Danse ..." em "Get Down and Sruti", e também a  bela "Peace Of Mind".
John resolveu voltar para a carreira solo  após esse álbum, lançando o magistral "Electric Guitarist" em 1978.  Depois disso, alternou bons e maus momentos em sua carreira solo,  reviveu a Mahavishnu Orchestra nos anos oitenta e fez sucesso com o trio   ao lado deAl Di Meola e Paco De Lucia. Os demais integrantes da Shakti  seguiram suas carreiras independentemente, com Vynaiakram sendo o  primeiro músico indiano a ganhar um Grammy (isso já na década de 90).
Em  1997, John, Hussain e Vinayakaram, juntos com o músico convidado  Hariprasad Chaurasia nas flautas,  se reuniram para uma pequena turnê  chamada "Remember Shakti", a qual ficou registrada em CD duplo com o  mesmo nome. Infelizmente L. Shankar não pôde comparecer aos shows, mas  certamente o clima entre os músicos remanescentes era excelente, e o  destaque maior do disco fica por conta da faixa "Mukti", com seus mais  de 63 minutos (!!!) de muito improviso. Essa formação ainda lançou os  álbuns "The Believer" (1999) e "Saturday Night in Bombay" (2001),  mas  infelizmente acabaram por se separar.
De qualquer forma, a Shakti  deixou seu nome registrado na história musical, não somente por ser a  primeira banda a misturar sons ocidentais e orientais de uma forma  totalmente improvisional, mas também por suas belíssimas composições e  arranjos que ficam na cabeça por muito tempo.
 







 
 

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