Continuando as Maravilhas Prog criadas pelo King Crimson, temos agora o momento crucial para a sobrevivência do grupo. A saída de McDonald e Giles pouco depois da turnê de divulgação de In the Court of the Crimson King (contendo a Maravilhosa "Epitaph") colocou a casa da banda em um tremor de quase 8.9 graus na escala Richter, danificando muito as estruturas internas, levando posteriormente Lake a aceitar o convite de Keith Emerson e fundar o Emerson Lake & Palmer.
Porém, o guitarrista e líder da banda Robert Fripp tinha a companhia inseparável do amigo Peter Sinfield, e com ela, apostava que podia seguir em frente. O primeiro passo foi avaliar os danos e tentar construir rapidamente uma base que sustentasse suas ideias. Sinfield decidiu aprimorar seus conhecimentos sobre sintetizadores e aprendeu a tocar mellotron, instrumento que Fripp também se especializou no período.
Mel Collins |
Porém, faltava um substituto para Ian McDonald. Os instrumentos de sopro haviam sido o principal destaque no álbum de estreia, caracterizando o som Crimsoniano (junto do mellotron) e sua ausência era impensável para o projeto dar certo. Resultado, Fripp seduz o saxofonista Mel Collins a fazer parte da banda. Mel havia feito participações em shows e também em algumas gravações do The Animals, e estava consolidando-se como integrante do grupo Circus. Tocar no King Crimson foi um passo natural, revelando um músico fantástico.
Com uma visão de mudar um pouco a direção sonora, deixando-a mais acústica, o pianista Keith Tippett é integrado ao grupo (apesar de não ser apresentado como um membro oficial). Também pensando no futuro, Fripp chamou um ex-colega de infância para testar seus vocais. Gordon Haskell é o nome da pessoa em questão, e ele frequentou os estúdios de gravação entre os meses de janeiro e abril de 1970, período no qual foi registrado o segundo álbum do King Crimson.
No dia 15 de março, o King Crimson apresentou-se (pela única vez) no programa Top of the Pops da BBC, interpretando a inédita "Cat Food", e com a formação tendo Fripp, Lake, Tippet e os irmãos Giles.
Peter Giles, Keith Tippet, Greg Lake e Michael Giles (acima); Robert Fripp (sentado) |
Lançado em 15 de maio de 1970, In the Wake of Poseidon manteve o mesmo estilo de som que encantou o mundo com In the Court of Crimson King. Lá estão o mellotron, os instrumentos de sopro, a voz aveludada de Lake e passagens sonoras arrepiantes. Até a sequência musical parece ser a mesma, o que levou a imprensa a cair de pau na banda, dizendo que o grupo era pouco criativo e sem inspiração, chegando ao ponto da revista Rolling Stone acusar a banda de ser uma plagiadora dela mesma.
O fato é que as semelhanças com o primeiro disco existem, mas o segundo não perde em nada sua qualidade por conta disso. Pelo contrário. Os problemas internos parecem não ter afetado a composição final das faixas, e o que ouvimos é um álbum talvez superior ao seu antecessor. Ainda mais com sua abertura, a maravilhosa "Pictures of a City" (contendo no subtítulo a frase 'including 42nd and Treadmill"), para muitos, a irmã-gêmea de "21st Century Schizoid Man", porém muito mais madura (e por que não, gostosa). No início, "Pictures of a City" chegou a ser batizada de "A Man, A City". É assim que podemos encontrá-la na caixa Epitaph, citada no artigo anterior.
Nossa maravilha surge após a vinheta "Peace - A Beginning", a qual é apenas um breve poema entoado por Lake entre sons de pássaros, e já detona as caixas de som com o rufar e viradas da bateria, enquanto saxofone, baixo e guitarra executam as mesmas notas, para apresentar o jazzístico tema central da canção, em um andamento cadenciado de Giles.
Uma virada de Giles traz a voz de Lake, entoando palavras soltas e rasgando a voz no final de cada frase, com o peso comendo ao fundo principalmente na guitarra de Fripp. O tema central é repetido, trazendo a sequência da letra, com a mesma pegada da primeira estrofe, e dela, entramos na viajante sessão instrumental, através de rasgadas notas da guitarra.
É Fripp quem abre a sequência de solos com um tema estupidamente cavalar e quebrado, acompanhado por viradas excelentes da bateria, uma escala fabulosa do jazz e a marcação do saxofone. A velocidade das notas da guitarra é estonteante, mostrando todo o virtuosismo de Fripp, e claro, as bases jazzísticas ao fundo são de fazer qualquer cidadão vibrar com tamanha perfeição. Ainda somos apresentados a uma série de notas que vão diminuindo suas frequências, para Fripp repetir seu solo, com o baixo e a bateria imitando o ritmo de suas notas em uma marcação soberba.
Depois de toda a velocidade do solo de Fripp, baixo e bateria acalmam os ânimos, e Fripp desliza seus dedos pelo botão de volume, fazendo um solo muito leve, com tímidas notas, utilizando-se bastante de escalas de grandes músicos do jazz, como Django Reinhardt e Wes Montgomery. A medida que a bateria aumenta seus rufos, as notas da guitarra vão se misturando esquizofrenicamente, explodindo na última estrofe vocal, para Lake rasgar sua voz, e a guitarra, carregadíssima de distorção, encerrar essa maravilhosa mistura de jazz com o rock em uma barulheira infernal, com destaque para Giles, que simplesmente detona a bateria.
Depois da pancada de "Pictures of a City", somos apresentados a voz grave de Gordon Haskell na balada "Cadence and Cascade", uma espécie de irmã (porém não-gêmea) de "I Talk to the Wind", e encerra-se com a faixa-título, outra Maravilha, com os mesmos dotes e talentos de "Epitaph".
No lado B, a vinheta "Peace - A Theme" dá espaço para "Cat Food", o único single desse álbum, lançado em 13 de março de 1970, trazendo no lado B a estranha "Groom" (que ficou de fora do vinil), seguindo com as três partes de viagens insanas de "The Devil's Triangle" ("Merday Morn", "Hand of Sceiron" e "Garden of Worm"), inspiradas no movimento "Mars: Bringer of War", da suíte "The Planets", composta por Gustav Holst, para encerrar o LP com "Peace - An End", assim como as demais, outra rápida vinheta para Lake despedir-se dos fãs Crimsonianos e fazer fama no Emerson Lake & Palmer.
Vale a pena ressaltar a arte de In the Wake of Poseidon. A obra, pintada por Tammon de Jongh em 1967, recebeu o nome de The 12 Archetypes, e também ficou conhecida como The 12 Faces of Humankind. Essas doze faces representam composições dos quatro elementos naturais (Ar, Água, Terra e Fogo) interagindo entre eles através de personagens, seis femininos e seis masculinos. Assim, temos as faces representadas como:
i) O Idiota (Fogo e Água): Homem sorrindo com uma barba rala;
ii) A Atriz (Água e Fogo): Menina egípcia com lágrimas nos olhos;
iii) O Observador (Ar e Terra): Cientista careca com óculos redondos sobre da testa;
iv) A Mulher Adulta (Terra e Ar): Mulher com rosto enrugado e protegendo-se do frio;
v) O Guerreiro (Fogo e Terra): Homem com capacete de aço e chifres, além de vasta barba preta;
vi) A Escrava (Terra e Fogo): Mulher negra com grandes brincos de Ouro;
vii) A Criança (Água e Ar): Menina com sorriso doce e cabelos presos em laços no formato de borboleta;
viii) O Patriarca (Ar e Água): Idoso de rosto comprido e longos cabelos brancos;
ix) O Lógico (Ar e Fogo): Cientista de rosto comprido, com a mão esquerda cercada por estrelas;
x) O Coringa (Fogo e Ar): Espécie de Harlequim sorridente com chapéu de ouro no formato do chapéu de Napoleão.
xi) A Encantadora (Água e Terra): Menina triste com olhos lacrimejantes e cabelos esvoaçantes;
xii) A Mãe Natureza (Terra e Água): Silhueta de um rosto coberto por uma camada de gramas e cercado por flores e borboletas.
Essa é uma das capas mais belas da carreira do King Crimson, ao lado da sua sucessora, representando o álbum Lizard. Lançado em 1971, ele veio ao mundo após mais uma série de turbulentas colisões internas, e novamente, com todas as dificuldades, Robert Fripp e sua mente brilhante proporcionaram mais uma Maravilha Prog, a terceira em sequência, e que carrega justamente o nome do álbum em que foi lançada. Contaremos sua história em quinze dias, aqui no Maravilhas do Mundo Prog.
O fato é que as semelhanças com o primeiro disco existem, mas o segundo não perde em nada sua qualidade por conta disso. Pelo contrário. Os problemas internos parecem não ter afetado a composição final das faixas, e o que ouvimos é um álbum talvez superior ao seu antecessor. Ainda mais com sua abertura, a maravilhosa "Pictures of a City" (contendo no subtítulo a frase 'including 42nd and Treadmill"), para muitos, a irmã-gêmea de "21st Century Schizoid Man", porém muito mais madura (e por que não, gostosa). No início, "Pictures of a City" chegou a ser batizada de "A Man, A City". É assim que podemos encontrá-la na caixa Epitaph, citada no artigo anterior.
Capa interna (autografada) de In the Wake of Poseidon |
Nossa maravilha surge após a vinheta "Peace - A Beginning", a qual é apenas um breve poema entoado por Lake entre sons de pássaros, e já detona as caixas de som com o rufar e viradas da bateria, enquanto saxofone, baixo e guitarra executam as mesmas notas, para apresentar o jazzístico tema central da canção, em um andamento cadenciado de Giles.
Uma virada de Giles traz a voz de Lake, entoando palavras soltas e rasgando a voz no final de cada frase, com o peso comendo ao fundo principalmente na guitarra de Fripp. O tema central é repetido, trazendo a sequência da letra, com a mesma pegada da primeira estrofe, e dela, entramos na viajante sessão instrumental, através de rasgadas notas da guitarra.
É Fripp quem abre a sequência de solos com um tema estupidamente cavalar e quebrado, acompanhado por viradas excelentes da bateria, uma escala fabulosa do jazz e a marcação do saxofone. A velocidade das notas da guitarra é estonteante, mostrando todo o virtuosismo de Fripp, e claro, as bases jazzísticas ao fundo são de fazer qualquer cidadão vibrar com tamanha perfeição. Ainda somos apresentados a uma série de notas que vão diminuindo suas frequências, para Fripp repetir seu solo, com o baixo e a bateria imitando o ritmo de suas notas em uma marcação soberba.
Depois de toda a velocidade do solo de Fripp, baixo e bateria acalmam os ânimos, e Fripp desliza seus dedos pelo botão de volume, fazendo um solo muito leve, com tímidas notas, utilizando-se bastante de escalas de grandes músicos do jazz, como Django Reinhardt e Wes Montgomery. A medida que a bateria aumenta seus rufos, as notas da guitarra vão se misturando esquizofrenicamente, explodindo na última estrofe vocal, para Lake rasgar sua voz, e a guitarra, carregadíssima de distorção, encerrar essa maravilhosa mistura de jazz com o rock em uma barulheira infernal, com destaque para Giles, que simplesmente detona a bateria.
Depois da pancada de "Pictures of a City", somos apresentados a voz grave de Gordon Haskell na balada "Cadence and Cascade", uma espécie de irmã (porém não-gêmea) de "I Talk to the Wind", e encerra-se com a faixa-título, outra Maravilha, com os mesmos dotes e talentos de "Epitaph".
No lado B, a vinheta "Peace - A Theme" dá espaço para "Cat Food", o único single desse álbum, lançado em 13 de março de 1970, trazendo no lado B a estranha "Groom" (que ficou de fora do vinil), seguindo com as três partes de viagens insanas de "The Devil's Triangle" ("Merday Morn", "Hand of Sceiron" e "Garden of Worm"), inspiradas no movimento "Mars: Bringer of War", da suíte "The Planets", composta por Gustav Holst, para encerrar o LP com "Peace - An End", assim como as demais, outra rápida vinheta para Lake despedir-se dos fãs Crimsonianos e fazer fama no Emerson Lake & Palmer.
Vale a pena ressaltar a arte de In the Wake of Poseidon. A obra, pintada por Tammon de Jongh em 1967, recebeu o nome de The 12 Archetypes, e também ficou conhecida como The 12 Faces of Humankind. Essas doze faces representam composições dos quatro elementos naturais (Ar, Água, Terra e Fogo) interagindo entre eles através de personagens, seis femininos e seis masculinos. Assim, temos as faces representadas como:
i) O Idiota (Fogo e Água): Homem sorrindo com uma barba rala;
ii) A Atriz (Água e Fogo): Menina egípcia com lágrimas nos olhos;
iii) O Observador (Ar e Terra): Cientista careca com óculos redondos sobre da testa;
iv) A Mulher Adulta (Terra e Ar): Mulher com rosto enrugado e protegendo-se do frio;
v) O Guerreiro (Fogo e Terra): Homem com capacete de aço e chifres, além de vasta barba preta;
vi) A Escrava (Terra e Fogo): Mulher negra com grandes brincos de Ouro;
vii) A Criança (Água e Ar): Menina com sorriso doce e cabelos presos em laços no formato de borboleta;
viii) O Patriarca (Ar e Água): Idoso de rosto comprido e longos cabelos brancos;
ix) O Lógico (Ar e Fogo): Cientista de rosto comprido, com a mão esquerda cercada por estrelas;
x) O Coringa (Fogo e Ar): Espécie de Harlequim sorridente com chapéu de ouro no formato do chapéu de Napoleão.
xi) A Encantadora (Água e Terra): Menina triste com olhos lacrimejantes e cabelos esvoaçantes;
xii) A Mãe Natureza (Terra e Água): Silhueta de um rosto coberto por uma camada de gramas e cercado por flores e borboletas.
Essa é uma das capas mais belas da carreira do King Crimson, ao lado da sua sucessora, representando o álbum Lizard. Lançado em 1971, ele veio ao mundo após mais uma série de turbulentas colisões internas, e novamente, com todas as dificuldades, Robert Fripp e sua mente brilhante proporcionaram mais uma Maravilha Prog, a terceira em sequência, e que carrega justamente o nome do álbum em que foi lançada. Contaremos sua história em quinze dias, aqui no Maravilhas do Mundo Prog.
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