quinta-feira, 29 de janeiro de 2009

Mutantes Parte III

Antes da saída dos Mutantes, Rita ainda registrou o compacto "Mande um Abraço pra Velha", uma das melhores composições do grupo, que infelizmente ficou reservada à relíquia de colecionadores. Nela, Arnaldo introduz com seu órgão uma sessão calma, bem lenta, onde a banda começa a narrar a história de suas partcipações em festivais, contando que "já faz tempos pacas que eu não vinha aqui cantar num festival ...". A música muda de ritmo, virando um sambão onde o conjunto canta "manda um abraço pra velha e diga pra ela se catar". Uma hironizada na letra da marchinha "Cachaça" (aquela que diz: "se você pensa que cachaça é agua ...") e a música entra, após o refrão, em um climão super psicodélico, com o baixo de Liminha participando forte enquanto Arnaldo delira nos teclados. Enfim, a faixa termina de forma harmoniosa, com os três integrantes originais cantando o refrão e a tecladeira comendo solta. Uma jóia do cancioneiro Mutante.
Incursão ao progressivo com O A E O Z

Rita partiu dessa pra uma melhor (seguindo carreira com o Tutti Frutti), enquanto os quatro integrantes restantes trancaram-se no estúdio para a realização de uma obra conceitual, o álbum "O A E O Z", que originalmente era para ser um álbum duplo com um dos LPs sendo totalmente preenchido pela faixa "O A E O Z". Porém, o disco acaba não sendo lançado devido ao fato de a gravadora da banda considerá-lo anti-comercial (detalhe, o Yes fez o mesmo com "Tales From Topographic Oceans" e se tornou o disco mais vendido dos ingleses).
Sérgio Dias, Manito, Liminha e Dinho

Era o ano de 1973 e Arnaldo então saía dos Mutantes, cansado principalmente dos seus abusos, com problemas de saúde, e foi lançar o maravilhoso "Lóki?", onde levou consigo Liminha e Dinho. Por um tempo Liminha e Dinho permaneceram com Serginho e o novo tecladista, o multi-instrumentista Manito. Dinho foi o primeiro a sair, sendo substituído por Rui Motta, enquanto Manito não durou muito também, sendo substituído por Túlio Mourão. A banda entrou em estúdio para a gravação de um novo LP, mas, no meio destes, Liminha saiu, sendo substituído por Antônio Pedro de Medeiros.
Tudo Foi Feito Pelo Sol: inspiração em Yes
Com essa formação, lançam em 1974 o álbum "Tudo Foi Feito Pelo Sol". Totalmente inspirados por Yes, o álbum já traz de cara uma bela capa, além de músicas muito mais elaboradas e longas. O disco abre com a pesada "Deixe Entrar Um Pouco D'água no Quintal", com todos os integrantes cantando tal qual um "Close to the Edge", do Yes, enquanto Serginho, dono da banda, mostra todo seu talento na sua guitarra Fender. Segue a instrumental "Pitágoras", com um show do tecladista Túlio e Serginho mandando ver no violão. O lado A fecha com a progressivíssima "Desanuviar", com muitas "viagens" e uma letra mais doida ainda.


Túlio Mourão, Liminha, Sérgio Dias e Rui Motta

O lado B traz de abertura um rock and roll mais calmo, "Eu Só Penso Em Te Ajudar", onde Túlio participa bastante no piano, mas mesmo assim existem intervenções bem progressivas, com o moog entrando em certos momentos de forma brilhante. O clima volta a ficar pesado com "Cidadão da Terra". A introdução mostra o trabalho de harmonia que a banda desenvolveu, com teclado, guitarra e baixo duelando forte, enquanto Rui segurava as pontas. Aliás, Rui é um dos grandes bateristas do rock nacional e merece todo o respeito da nação rockeira. Um belo solo de teclado também chama a atenção nessa faixa. 


O rock simples de "O Contrário de Nada é Nada" dá espaço para mais uma viagem, a faixa-título "Tudo Foi Feito Pelo Sol". Bem no clima de" O A E O Z", a banda constrói uma bela canção em quase nove minutos de uma excelente harmonia, improvisos e técnica, terminando em um quase jazz que, regado a um bom uísque, conquistou inúmeros fãs por todo o Brasil, mas desagradou aos mais tradicionais, que preferiam o humor de Rita e a genialidade de Arnaldo.


O grupo então passou a dedicar-se mais a shows, os quais, talvez pelo sucesso do progressivo em nossas terras, estavam sempre lotados de fãs ardorosos, mesmo com o álbum não tendo vendido muito. Além disso, os Mutantes viraram uma referência nacional para diversas bandas que começavam a surgir, como Módulo 1000, Som Nosso de Cada Dia, O Peso e Terreno Baldio, sendo sempre convidados para o encerramento de grandes festivais, como o Hollywood Rock de 1975.
Último LP dos Mutantes
Em 1976 o grupo sofreu uma nova reformulação, agora contando com Luciano Alves nos teclados e Paulo de Castro no baixo, ambos, ex-membros do grupo Veludo Elétrico. Durante esse período, realizaram uma temporada de shows no Museu de Arte Moderna, onde foi registrado o primeiro álbum ao vivo, intitulado somente "Ao Vivo". Infelizmente, a gravadora novamente podou o disco, mas dessa vez lançou o mesmo, só que de uma forma diferente do que era previsto (uma versão simples ao invés da versão dupla) e contendo inúmeros cortes nas faixas, que, se no show duravam quase dez minutos, passaram a ter pouco mais de 3 ou 4 na versão final do LP, desagradando a todos. Mesmo assim, o álbum trás um ótimo material (servindo de base para colecionadores buscarem bootlegs dessa época), como "Sagitarius", "Esquizofrenia", "Tudo Explodindo" e a clássica "Rock'n'Roll City".


Luciano Alves, Rui Motta, Paulo de Castro e Sérgio Dias

Serginho seguiu com o grupo até 1978, passando por diversas reformulações. O último show, realizado na cidade de Ribeirão Preto, acabou sendo registrado no bootleg "Transmutation", cobiçado até mesmo na Europa. Serginho seguiu uma carreira solo de não muito sucesso, mas continuou a mostrar seu talento e a ser reconhecido, principalmente nos EUA e na França.

Na década de 80 inúmeros boatos de uma reunião do trio original surgiram, mas os graves problemas de saúde de Arnaldo, bem como o ego de Rita, nos privaram (e privam) dessa improvável reunião.



Nos anos 90 um revival Mutante ocorreu, devido a pessoas como Sean Lennon, Kurt Cobain e David Byrne, que levaram os álbuns dos Mutantes para o exterior, fazendo com que muitos brasileiros voltassem a ouvir o som do grupo novamente. O disco "O A E O Z" finalmente foi lançado, porém numa versão mais compacta, com metade das músicas, mas fica claro que o trabalho que a banda realizou no ano de 1973 era muito bom, em músicas como "Rolling Stone", "Ainda Vou Transar com Você" e as três partes da suíte "O A E O Z": "O A E O Z", "Hey Joe" e "Uma Pessoa Só", onde a idéia de um grupo unido é pregado de forma veemente, e o belo trabalho da banda é destaque certo para aquele fã que deseja conhecer o que de bom foi feito no Brasil . Até hoje espera-se o resto da obra, mas poucos sabem o que pode acontecer (ou na verdade o que aconteceu) com o material original.

O resgate do material gravado na França

O álbum gravado na França também foi lançado, no ano de 2000, com o nome de "Technicolor", trazendo as versões que saíram no "Jardim Elétrico" e mais diversas regravações em inglês para músicas como "Panis Et Circensis", "She's My Shoo-Shoo" ("Minha Menina"), "I'm Sorry Baby" ("Desculpe Baby"), "I Feel a Little Spaced Out " ("Ando Meio Desligado"), entre outras.

A volta do grupo em 2006
Em 2006 o grupo se reuniu para um show comemorando os 40 anos da Tropicália, contando com Serginho, Arnaldo, Dinho e mais Zélia Duncan nos vocais. Liminha e Rita infelizmente não quiseram participar da reunião, que acabou sendo registrada no CD "Live At Barbican Center" e que durante o ano de 2007 rodou nosso país, arrancando lágrimas de muitos fãs (inclusive quem vos escreve).

Atualmente Serginho mantém a banda, sem Arnaldo e sem Zélia, mas ainda ao lado de Dinho Leme e com a vocalista Bia Mendes. Lançaram o single "Mutantes Depois" em abril do ano passado, o qual se tornou a primeira composição dos Mutantes a ser gravada depois de trinta anos.

Os Mutantes mostraram ao Brasil e ao mundo como era possível fazer um som excelente em um país tão precário em termo de apoio à cultura, sendo reconhecidos de forma unânime como a maior banda do rock nacional e uma das principais bandas do mundo.

E que a cidade do rock and roll prossiga andando a favor do tempo!!
 

 

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