Muita gente já ouviu "O Vira", "Sangue Latino" e "Rosa de Hiroshima" e ficou pensando como o Secos & Molhados pode durar tão pouco. Na realidade, o Secos & Molhados que muitos conhecem gravou apenas os dois discos mais conhecidos, mas João Ricardo reformulou a banda por diversas vezes, registrando diversos outros álbuns, porém sem nunca atingir o sucesso que havia obtido com Ney Matogrosso. Mesmo assim, temos no mínimo dois excelentes discos e que devem ser ouvidos e admirados por todo fã da banda e até mesmo por quem não gosta da fase Ney Matogrosso.
Após a saída de Gerson Conrad e Ney Matogrosso, João Ricardo (violões de 12 e 6 cordas, gaita e voz) decidiu partir para uma carreira solo, lançando dois álbuns que não fizeram muito sucesso, João Ricardo e Da Boca Pra Fora. Fracassado financeiramente, João ganha os direitos sobre o nome Secos & Molhados e resolve reviver o grupo. Para isso, convoca o guitarrista e vocalista Wander Taffo (que fez sucesso em carreira solo e também como fundador do Rádio Taxi, além de ser integrante da clássica formação do Made in Brazil), o baixista João Ascensão e o vocalista Lili Rodrigues. Com a participação de Gel Fernandes (bateria), Lazy (teclados) e Rubão (percussão), em maio de 1978, quatro anos após o fim prematuro da primeira formação do Secos & Molhados, a chama voltava a ser acesa. Porém a proposta era diferente.
Apesar de seguir uma linha similar aos primeiros discos e de Lili ter uma voz tão aguda quanto a de Ney, João decidiu parar com a androginia, e, de cara limpa, lançou o excelente álbum Secos & Molhados (também conhecido como A Volta dos Secos & Molhados). O disco abre com um clássico. A gaita de João dá espaço para as vozes entoarem o nome da canção de abertura, "Que Fim Levaram Todas as Flores?", a qual foi um sucesso nacional, dando direito à banda de participar de inúmeros programas de televisão. A semelhança com faixas como "Flores Astrais" e "Assim Assado" não pode ser evitada, e Lili mostra que estava na banda para substituir, e bem, Ney. Muita festa curti ao som dessa canção, onde 99% das pessoas achavam que o vocalista era o próprio Ney Matogrosso, mas não era, e isso já se torna evidente na faixa seguinte, "Lindeza", onde os violões introduzem a canção com o baixo característico das músicas mais rápidas dos primeiros álbuns, além de trazer um belo arranjo de cordas, o que era novidade no som dos Secos.
Segue uma canção totalmente diferente do que já havia sido feito pela banda. Após flertar com o blues em "Primavera nos Dentes", o flamenco em "Primer Mundo" e o fado de "O Vira", o Secos & Molhados invadia o funk, com uma bateria marcando o ritmo, seguida na sequência por uma ótima linha de baixo, guitarras e teclados, dando espaço para os vocais cantarem "De Mim Pra Você", uma das faixas mais dançantes da banda e que merece espaço em qualquer festa anos setenta que você pense em fazer, ao lado dos clássicos de Village People, Bee Gees, Gloria Gaynor entre outros.
Após a sacudida no esqueleto de "De Mim Pra Você", temos a bela balada "Minha Namorada", onde Lili está fenomenal, mostrando sua simpatia (a qual contava nos créditos do álbum). O violão de 12 cordas de João leva a canção, que ainda trás um belo solo de Taffo (conhecido no álbum como Wander Tosh). O lado A encerra com a fraca "Anônimo Brasileiro", que apesar da bela melodia e do arranjo de cordas e metais, traz os vocais graves de João Ricardo, não combinando com o clima proposto na canção.
O lado B começa com "Última Lágrima", que lembra muito "Sangue Latino", principalmente pela levada do violão e do baixo. Segue "Insatisfação", uma pedrada na orelha de quem achava que o lado B seria lento, contando com as vocalizações dos três integrantes, com destaque maior para a voz de Lili. Temos aqui uma boa letra de João, bem auxiliada por uma sessão instrumental de teclados e guitarras. Os arranjos de cordas se fazem presente em "Oh! Canção Vulgar".
Segue uma sessão acústica (antes mesmo dos acústicos terem sido inventados), com a belíssima "Como Eu, Como Tu". Com João Ricardo liderando as vozes, temos aqui uma das mais belas e comoventes letras da banda, a qual trata sobre a dor de uma pessoa que recorda os poucos momentos de um amor entre dois amigos que não deu certo. De chorar! A animada "Quadro Negro" resgata o clima leve do álbum, contando com boas participações dos integrantes nas vocalizações, que também possui João no vocal principal. Essa é uma canção perfeita para adolescentes cantarem em um luau.
Por fim, "Cobra Coral Indiana", introduzida pelo piano elétrico e baixos que lembram bastante "Flores Astrais". A pequena letra, narrando a história de milhares de brasileiros que entram e saem de filas enormes para pagar suas contas, dá espaço para um longo tema instrumental com cordas e guitarras, encerrando o álbum tão bem quanto os demais discos da banda, e revivendo os grandes momentos da fase 1973-1974.
Porém, nem toda flor cheira bem, e João acabou tendo diversos problemas com os integrantes dessa formação, lançando seu terceiro trabalho solo, Musicar, em 1979. Em meados de 1980 tenta mais uma vez resgatar o Secos & Molhados, contando agora com os irmãos Roberto Lampé (violão), César Lampé (voz) e Carlos Amantor (percussão), lançando mais um álbum homônimo.
O disco seguiu a mesma linha dos anteriores, contando na abertura com a faixa "Quantas Canções é Preciso Cantar", com aquela levada a la "Que Fim Levaram Todas as Flores", destacando a voz aguda do novo cantor. "Roído de Amor" é uma balada semelhante as do disco com Lili, porém com César e João alternando-se nos vocais. "Meu Coração Não Pode Parar", apesar do nome, é uma faixa bem rock'n'roll, com muito baixo, guitarras e vocalizações ao melhor estilo Secos & Molhados. "Sem as Plumas, Numas" traz novamente a gaita e o baixo como destaques. Segue "Homenzarrão", a qual possui uma letra bem agressiva, mostrando que nem só de doces e agrados vivia a cabeça de João. O lado A encerra, e muito bem, com "Pão João", outro rock estilo Secos & Molhados.
Temos no lado B a gaita introduzindo "Muitas Pessoas", a qual conta com várias vocalizações. Depois do blues, funk, flamenco e fado, surge o jazz anos trinta na faixa "Você Faz Amor Engraçado", a qual lembra as faixas cabaré dos álbuns do Queen, com destaque para baixo e piano. "Pelos Dois Cantos da Boca" retoma os rocks do grupo, seguida pela pequena "Aja", revivendo os momentos de canções curtas como "El Rey" e "As Andorinhas", do primeiro disco. "Contudo" é uma canção sombria, contando com muito piano e vocalizações. O álbum encerra-se com "Vira Safado", que, como o nome diz, relembra a letra de "O Vira" em mais um fado e tentativa de resgatar o antigo sucesso.
Com o fracasso comercial do disco, João partiu para o exterior, tentando esquecer de vez a banda que o havia revelado e seguir finalmente em uma carreira solo. No ano seguinte retorna ao Brasil, por onde fica na obscuridade até 1987, quando conhece o cantor Heitor Abujamra (Totô Braxil), o qual o incentiva a resgatar o Secos & Molhados. Com a participação de Edinho França (guitarras), Jean Eduardo (baixo), Gilberto Ninho (bateria) e Wilson (teclados), volta a fazer shows com o nome Secos & Molhados e, com apoio da Rede Bandeirantes, lançam, em 1988, o oitentista A Volta do Gato Preto, o qual possui poucos momentos de inspiração, como "Sem Rei Nem Rock", "Eu Estou Fugindo de Casa" e o medley "Final Jam", resgatando os clássicos "Assim Assado", "Flores Astrais" e "O Vira".
Em 1999 João lançou Teatro? com o nome Secos & Molhados, onde ele é o único membro da banda, e em 2000 lança Memória Velha, com canções feitas no período entre 1986 e 1990.
E feitas de papel machê, as flores se encontraram entre muitas pessoas que cantavam engraçado em uma fila indiana.