Dale Peters, Jim Fox, Roy Kenner e Tommy Bolin
A saída de Domenic Troiano não afetou a personalidade do quarteto, que foi buscar na ensolarada Miami o novo dono das seis cordas, o exímio e novato Tommy Bolin, indicado pelo formador Joe Walsh. Com apenas 21 anos, o músico vinha de uma passagem soberana no obscuro grupo Zephyr, e assumiu a guitarra da James Gang com tanta personalidade que muitos fãs até desconfiam que houve uma carreira pré-Bolin com a banda.
Foram apenas dois álbuns, o suficiente para chamar a atenção do mundo, principalmente do Deep Purple, que o levou para substituir nada mais nada menos que Ritchie Blackmore, e que trarei agora, encerrando a segunda parte com os últimos lançamentos oficiais dessa gloriosa banda do hard setentista.
A estreia de Bolin é um disco acima do comum, e na minha opinião, o melhor disco da carreira do James Gang. Tendo na formação além de Bolin o vocalista Roy Kenner, o baixista Dale Peters e o baterista Jim Fox, é o gurizão das roupas coloridas que toma conta, chegando com tudo ao anotar oito das noves composições de um LP sensacional. Quem conhece a curta carreira do guitarrista americano, ou apenas o álbum Come Taste the Band (gravado por ele junto ao Deep Purple em 1975), irá descobrir que as linhas de guitarra e os efeitos que tanto marcaram suas performances já se faziam presentes por aqui, seja na viajante introdução de "Standing in the Rain", utilizando diversos efeitos na guitarra, ou no espetacular solo de "From Another Time", onde ele desossa os dedos em uma faixa percussiva que deve ter agradado e muito ao chicano Carlos Santana. Bolin traz para a banda o uso do moog sintetizado, que abrilhanta o petardo setentista "Ride the Wind". Dois fatores a mais para a entrada de Bolin é que a James Gang ganhou mais um incrível vocalista, pois poucos tinham a capacidade de colocar tanto açúcar na voz quanto Bolin, que derrete calcinhas na lindíssima "Alexis", por incrível que pareça, ainda mais malemolência, como no sensual embalo da versátil "Must Be Love", com Bolin estraçalhando com o slide na introdução e fazendo um solo de tirar o fôlego. Quem procura algo da James Gang dos discos anteriores, encontrará no embalo acústico de "Got No Time For Trouble", na verdade uma canção muito mais Zephyr do que James Gang. Aqui comprovamos que Bolin levou suas características para o grande grupo inglês, com uma personalidade exclusiva de um dos poucos gênios da guitarra que apareceram na década de 70, e que acabou indo curtir outras bandas muito cedo. Exemplo maior dessa influência James Ganguiana no som do Purple está no riff de "The Devil is Singing Our Song", pois duvido que você não imagine os vocais de David Coverdale ou Glenn Hughes. A única composição sem a mão de Bolin, "Rather Be Alone With You (Song for Dale)" é uma maravilhosa criação vocal de Kenner, sem a participação de nenhum instrumento, apenas vozes e palmas mandando ver em um soul sensacional. O melhor ficou para o final, onde segurar as lágrimas com o lindíssimo arranjo de cordas de Jimmie Haskell na linda "Mystery" é missão impossível, ainda mais com os dedilhado do violão de Bolin fazendo cada molécula de seu corpo vibrar. Música linda, que encerra um álbum raro na história da música, pois afinal, desconheço outro onde um novato chegou com tanta personalidade em um grupo veterano e simplesmente assumiu a posição de maior destaque. Nota 11 em 10, e um dos melhores discos da história fácil fácil.
A influência e importância de Bolin para a James Gang foi tamanha que sua cidade Natal foi responsável por batizar o sétimo álbum do grupo, o qual revela ainda mais a capacidade de um agora cobiçado Bolin, já que suas performances em Bang e no incrível Spectrum, lançado por Billy Cobham no outono americano de 1973, chamaram a atenção de todo o mundo. O disco possui de tudo um pouco, sendo bem mais versátil que Bang. Apreciadores de Deep Purple coloquem a agulha direto em "Do It", e se apavorem com o que o guri faz na guitarra, despejando peso, velocidade e rifferama como poucos, ou então, chame a sua garota para mais uma vez derreter sua calcinha na bela "Spanish Lover", uma das canções marcantes da carreira do guitarrista colorido. Outra baladaça, "Sleepwalker", destaca a arrepiante interpretação de Kenner e o magistral slide guitar de Bolin, numa das peças mais bonitas do grupo, enquanto "Cruisin' Down the Highway" mistura elementos southern com pesadas passagens de slide, presentes também em "Summer Breezes", na qual eu diversas vezes penso ser uma faixa do Trapeze de Glenn Hughes que está saindo das caixas de som. Como sempre, temos espaço para canções mais swingadas, com "Wildfire" sendo a principal pepita a brilhar com essa característica, e se você quer curtir uma viagem, delire com as escalas jazzísticas de "Praylude", pequena peça instrumental que é acompanhada pela pesadíssima e maluquete "Red Skies", outra na qual Kenner mostra todos os seus dotes vocais. Para encerrar, temos a participação de Albhy Galuten com o sintetizador em "Head Above the Water", canção suave que encerra outro belo disco, taco-a-taco com Bang candidato a melhor da banda. A capa é a versão negra de Rides Again, o que acabou marcando entre os fãs o apelido de "Disco Preto".
Bolin acabou desiludindo-se com os problemas de drogas e álcool de seus companheiros - quem diria -, e foi gravar com Alphonse Mouzon, passeando pelas gélidas terras do Canadá na maravilhosa estreia do Moxy, fazendo Teaser, seu essencial álbum de estreia de 1975, e parando no Deep Purple para gravar o já citado Come Taste the Band. O James Gang deu uma pequena pausa, e em 1975, retornava com uma nova formação, tendo Fox, Peters, Bubba Keith (vocais e guitarras) e Richard Shack (guitarras).
Newborn [1975]
Para muitos esse é o disco mais fraco do James Gang. Não consigo concordar com essa opinião, mas concordo que a sonoridade da banda mudou bastante com a saída de Bolin, fugindo inclusive do que foi produzido na era Walsh ou no período Troiano. O interessante é que assim como aconteceu com Bolin, dessa vez o estreante Bubba anotou dez das onze canções do LP, sendo sete em parceria com o também novato Richard Shack, o que me faz pensar onde foi parar a criatividade de Peters e Fox. Independente disso, a voz de Bubba é agradável de ouvir, principalmente na linda "All I Have", balada acústica onde o vocalista destaca-se com sobras, e na emocionante "Come With Me", apresentando George Ricci no violoncelo e Donny Brooks na harmônica. Acredito que a cisma dos fãs com esse álbum é por que a guitarra de Shack não brilha como a de Bolin ou Walsh. O guitarrista é tímido e por poucas vezes consegue se destacar, como na pesada "Earthshaker", grande canção que é fácil a melhor do disco, na pegada "Shoulda' Seen Your Face", sonzeira para balançar o pescoço sem dó, e na hardeira "Watch It", onde o quarteto soa como o grande grupo que os fãs esperam. Gosto bastante do rockzão "Red Satin Lover", onde o grupo rememora os arranjos vocais que se destacavam no início da carreira, mas não me agrada o ritmo country de "Cold Wind", com a participação da steel guitar de Al Perkins e do piano de Tom Dowd. Falando em country, o pianista e organista David Briggs deu uma cara southern na leve "Gonna Get By" e em "Merry-Go-Round", canção que abre o LP com o órgão sendo o destaque. Fox também usa o órgão como um dos instrumentos centrais de "Driftin' Dreamer", tendo o baixo de Fox estourando as caixas de som, assim como na pesada recriação do clássico "Heartbreaker Hotel", imortalizada na voz de Elvis Presley. A formação não durou muito tempo, com Bubba e Shack dando lugar a Bobby Webb (guitarras e vocais) e Phil Giallombardo (teclados, vocais e piano).
Jesse Come Home [1976]
A despedida da James Gang não é um grande álbum, infelizmente. O retorno de Giallombardo (que havia feito parte do grupo no início da carreira da banda) gerou um LP pouco inspirado e carregado de sacarose, trazendo baladas em excesso, como "Love Hurts", carregada na orquestração, ou a derretida "Peasant Song", onde o piano de Giallombardo nos faz lembrar Guilherme Arantes em sua fase Global, mas pelo menos o bonito arranjo orquestral a salva. Webb lidera os vocais em "Another Year", linda faixa comandada pelo bonito dedilhado de violão, e na qual a voz do tecladista casa muito bem com a suavidade que sai das caixas de som, e "Stealin' the Show", mais uma balada, só que essa bem viajante, com um brilhante hammond e muitos efeitos na guitarra. Outros bons momentos surgem na pegada rocker de "Hollywood Dream", a ótima instrumental "Pick Up the Pizzas", com seu riffzão pesadíssimo e a percussão de Nelson Flaco Pedron em destaque, o delírio hippie de "Feelin' Alright", última composição de Peters e Fox com a banda, os embalos funky de "I Need Love", e na trabalhada "When I Was a Sailor", mais uma balada trazendo cordas, metais, vocalizações e muitas variações de andamento.
O James Gang reuniu-se várias vezes após seu término oficial em 1977, mas infelizmente, nunca mais registrou algo novo. Porém, sua curta discografia mostra que grandes bandas não necessitam de muitos álbuns para fazer história. Espero que os fãs da banda tenham gostado das descrições aqui apresentadas, e para quem não conhecia, que as matérias os tenham feito buscar os álbuns de um grandioso e praticamente desconhecido grupo, principalmente os clássicos da era Walsh e Bolin.