terça-feira, 29 de junho de 2010

Ginger Baker's Airforce


Após o término da Blind Faith, Winwood, Baker e Rick permaneceram com uma amizade forte, mantendo ensaios e encontros regularmente. Winwood já havia decidido lançar-se em carreira solo, enquanto Baker passava a aprender sobre a cultura africana e se aprofundar em técnicas e acompanhamentos de jazz. Rick perambulava entre bares e estúdios atrás de alguns trocados, e foi o primeiro a aceitar a participação em um ambicioso projeto que Baker começa a construir em sua mente.

Durante todo o mês de novembro de 1969, Baker influenciou-se demais pelo jazz de big bands como Count Basie, Duke Ellington e Buddy Rich. Logo, formou a ideia de construir um grupo que extrapolasse a música da época, indo em novas direções totalmente diferentes aquelas da Blind Faith e do Cream, misturando jazz, rhythm & blues, folk, blues e ritmos tribais africanos.

Rick adorou a ideia, e ressaltou que a presença de Winwood seria a alma R & B que Baker estava procurando. Baker foi atrás de Winwood, que agora já estava ensaiando com Jim Capaldi e Chris Wood, em uma tentativa mascarada de volta do Traffic. Winwood relutou por alguns dias, mas ao entender o projeto e suas extensões, topou a participação.

Assim, a Blind Faith agora estava reunida, mas sem Clapton, e algumas peças ainda estavam faltando. Rick tinha o blues, Baker os ritmos e Winwood era o R & B em pessoa. Faltavam o jazz e os ritmos africanos. A saída encontrada por Baker foi voltar ao passado novamente, e chamar o cara que revelara ele ao mundo. Assim, Graham Bond (sax, órgão, piano e voz) entrou na parte jazzística, trazendo com ele o lendário baterista de jazz Phil Seamen e Harold McNair, um fantástico saxofonista eflautista jamaicano que havia participado de shows com Quincy Jones e também fez parte do quarteto de Charles Mingus, se tornando então o que Baker chamou de "a inspiração".

Mente aberta, Baker aceitou ainda a sugestão que Winwood fez para Chris Wood entrar no naipe dos metais, e assim, com Bond, Wood e McNair, formava-se um dos maiores naipes de metais da história do rock.

Para a percussão africana, Baker folheou seus contatos pelo continente, e acabou optando pelo nigeriano Remi Kabaka. Com a adição de Jeanette Jacobs aos vocais e do amigo Denny Laine (que participou da primeira formação do Moody Blues e também do grupo Balls) na guitarra e vocais, Baker fechava seu projeto, que batizou com um nome sugestivo e que traduzia o que realmente aquela multidão de pessoas eram: a Ginger Baker's Air Force.
Primeira geração da Air Force em ação
Diferente de tudo o que já havia sido feito por Baker, a Ginger Baker's Air Force foi sem dúvida nenhuma o ponto alto das realizações do baterista, mesmo com as virtudes e importantes passagens pelo Cream, Blind Faith e Graham Bond Organisation. Na Airforce, Baker expandiu seus horizontes, dominando ainda mais a bateria e também o processo de composição e conjunto.

Logo após o anúncio da criação do novo grupo em dezembro de 1969, Baker agendou duas datas para a banda se apresentar na Inglaterra durante o mês de janeiro. A princípio, a união daqueles monstros da música não passaria dessas duas apresentações, mas após o primeiro show da Airforce em Birmingham, no dia 12 de janeiro de 1970, a reação positiva tanto da imprensa quanto do público fez com que Baker começasse a viajar mais alto, tanto que o segundo show, realizado na data de 15 de janeiro, no Royal Albert Hall em Londres, foi registrado, culminando no primeiro e espetacular álbum da Air Force.
Um dos melhores álbuns ao vivo de todos os tempos
Lançado em fevereiro de 1970, Ginger Baker's Air Force registra um momento histórico na história da música. Para mim é um dos três melhores álbuns ao vivo de todos os tempos, e em seus sulcos, está toda a efervescência criada por uma maravilhosa cozinha percussiva, recheada com todo o esplendor do naipe de metais e com o talento de Winwood no órgão e vocais. Logo na primeira audição, o LP mostra todo o seu poder de vôo, fazendo com que o ouvinte delire desde o começo.

Ginger Baker's Air Force abre com "Da Da Man", onde percussão, baixo e bateria puxam o ritmo dos metais, que surgem com o tema principal. Winwood faz intervenções no órgão. Bond faz um segundo tema, acompanhado por vocalizações que cantam o nome da canção, retornando ao tema inicial e começando a sequência de solos com Winwood.

O acompanhamento latino de Baker e Seamen tem toques de metais com notas muito pesadas, enquanto Winwood viaja no órgão. O tema principal é repetido, com Laine fazendo as intervenções que indicam de quem será o próximo solo. Uma boa sequência de notas feitas por Laine, esbanjando vigor e feeling, é acompanhada pelo impecável andamento da cozinha percussiva formada por Baker, Seamen e Kabaka, que fazem uma melodia grudenta.

O tema principal surge de novo e Bond assume a ponta das intervenções, para solar fantasticamente antes de encerrar a faixa de forma primorosa, levando a segunda e última faixa do Lado A, que é "Early In The Morning".

Começando com uma percussão lenta, tipo ritmo tribal, Rick faz a melodia vocal no violino. Winwood começa a cantar em cima da melodia, acompanhado pelos vocais de Laine e Jeanette. Os metais vão dando peso a canção, e Baker solta o braço, levando a sequência de solos, a qual começa com Rick no violino, repleto de distorção e com uma ótima levada do baixo e da cozinha percussiva, lembrando Allman Brothers.

Os metais participam com bons temas de intervenção, e é a vez de Wood solar na flauta, primeiro de forma lenta, e depois, crescendo junto com o andamento da cozinha, até retornar ao tema principal. Finalmente, McNair executa seu solo de flauta, e a pauleira pega entre o naipe de metais, percussão e bateria. Os aplausos insandecidos da plateia crescem junto com o solo e a faixa encerra o lado A com o violino de Rick novamente fazendo a melodia dos vocais.

"Don't Care" abre o lado B em grande estilo, com os riffs dos metais apresentando os vocais de Jeanette e Winwood. Após alguns versos, entramos na sequência de solos, começando com Winwood no órgão, que não esbanja notas, tocando apenas longos acordes sem muita inspiração.

O riff dos metais retorna, e a pressão aumenta, com Bond, McNair e Wood fazendo uma marcação forte enquanto Winwood faz um solo magistral. Baker e Seamen estão incansáveis, travando uma batalha única contra a percussão de Kabaka, e o palco incedeia, com o órgão de Winwood defendendo seu terreno contra o ataque sonoro dos metais. Laine e Rick apenas observam, marcando o tempo para a loucura geral no palco.

McNair ganha espaço e passa a solar. Assim como Winwood, o solo no início é lento, aumentando com a sequência da canção, levando então para o solo de Wood, que entre microfonias e aplausos, manda ver com o pulmão.

O riff principal volta e percebesse que a empolgação de Baker e Seamen passa dos limites, cometendo um erro na volta do riff, mas mesmo assim, conseguem acertar o tempo e voltar a repetição da letra, encerrando a faixa com a repetição do riff principal, e o ouvinte com as pernas totalmente estrupiadas de tanto dançar com a canção.

A prova de resistência é ainda maior na faixa seguinte, uma re-edição para a clássica "Toad". Rick, Baker, Seamen e Kabaka fazem a marcação do ritmo tradicional da faixa, enquanto o trio de metais sola independentemente. Winwood e Laine passam a acompanhar o ritmo, fazendo os acordes para a aeronave levantar vôo em uma espetacular jam session comandada pelos metais, onde Kabaka destrói as mãos na sua percussão.

Baker então começa a solar na sua forma tradicional, onde de forma monstruosa usa todo o seu kit, apresentando rufadas, batidas nos pratos e bordas das caixas e tons e monstrando um domínio que poucos tem. Uma violenta sequência nos dois bumbos surge antes de variações impossíveis de serem reproduzidas, e Seamen passa a duelar com Baker.

A partir de então, os dois esgotam as possibilidades e maneiras de tocar o instrumento. Pancadas violentas nos pratos e bumbos são constantes, e o efervescente final do solo é uma pressão percussiva de tirar o fôlego. Ambos retornam com o ritmo da canção, trazendo baixo, órgão e os metais, para encerrar a faixa e o lado B com todos reproduzindo o tema principal e muito barulho, além da plateia aplaudindo e assoviando incrédula com o que acabou de ver e ouvir.

Percussão e bateria abrem "Aiko Biaye", faixa de abertura do lado C, onde Jeanette entoa o nome da canção enquanto Kabaka canta em um dialeto africano, tendo intervenções de Jeanette e Laine. Os metais fazem um determinado tema junto com o baixo, que passa a fazer a melodia dos vocais e acompanhar a letra de Kabaka, até os metais repetirem o tema inicial, com a cozinha comandando a pauleira para os solos.

Wood é o primeiro a se aventurar no sensacional andamento dos metais, que repetem o mesmo tema enquanto Wood gasta seu fôlego no sax. Laine surge solando na guitarra, e o andamento continua hipnotizando o ouvinte. McNair entra na festa, solando a la Coltrane dos tempos free-jazz, com Baker e Seamen destruindo seus kits. Os metais ganham força, e estamos à beira da loucura, até Baker avisar que é hora de voltar a realidade.

O grupo faz o tema inicial e Kabaka retorna a letra, repetindo o início da canção até começar o solo de Baker, Seamen e Kabaka. Jeanette fica repetindo o nome da canção e soltando gritos, enquanto os três fazem um longo e espetacular duelo entre bateria e percussão, que termina com batidas nos pratos e o encerramento da canção com o tema principal e muito barulho.
Compactos de Man Of Constant Sorrow
"Man Of Constant Sorrow" encerra o lado C em uma leve balada guiada pela guitarra de Laine, que também comanda os vocais na linha Bob dylan, onde Rick sola ao violino em uma canção que destoa das demais, apesar do bonito arranjo folk.

O lado D retorna a pauleira com o clássico da Blind Faith, "Do What You Like". Baker apresenta a canção e já puxa o ritmo, com os metais fazendo o riff junto do baixo. Winwood surge com a letra, e os metais fazem o riff acompanhando o órgão e o baixo. Após as primeiras frases, Winwood começa seu longo solo no órgão, enquano Jeanette repete o nome da faixa entre temas marcados dos metais e baixo.

Winwood abusa de escalas e notas características de seus solos, improvisando sobre as camadas de percussão e metais. Baker aumenta o ritmo das batidas, com os metais repetindo o tema da canção, abrindo espaço para mais um longo e monstruoso solo de Baker.

Marcando o tempo no cymbal, Baker re-monta seu kit, para então destruí-lo novamente, de uma forma totalmente diferente do que havia sido feito em "Toad". Alternando batidas nos tons e bumbos, Baker usa muito pouco da caixa, tendo como destaque a incrível sequência nos dois bumbos, enquanto com os braços quase quebra os pratos com pancadas violentíssimas.

Uma bela sequência de rufos na caixa e bumbo levanta o público, que assovia e aplaude as peripécias de Baker. O solo encerra com um espetacular ataque aos bumbos, pratos e caixa, solando com fúria e mostrando ao mundo por que nada mais nada menos que John Bonham era um de seus maiores fãs, retornando então ao ritmo da canção que encerra-se com os instrumentos fazendo muito barulho entre aplausos e assovios.
O monstro Ginger Baker

O álbum encerra com uma jam session fantástica conduzida por Rick e Baker, onde o baterista apresenta primeiramente a banda e puxa o ritmo do que foi chamado "Doin' It". Rick faz a marcação junto com Baker, para Laine e Bond executar pequenos solos. Winwood faz um tema específico, e Wood passa a solar junto com os demais, em um clima totalmente final de festa.

O baixo faz a base junto com os metais, enquanto Wood e Winwood solam livremente. A doideira pega na cozinha percussiva, com sequências fantásticas de caixa, prato e viradas nos tons que aumentam o ritmo da improvisação, com Wood solando muito, encerrando a faixa com a repetição do tema de "Do What You Like" e saindo ovacionados!

A apresentação no RAH causou estardalhaços tanto na Inglaterra quanto nos Estados Unidos. A imprensa exaltou a força sonora do grupo e começou a especular sobre o andamento da carreira do novo bibelo da música britânica. Ginger Baker's Air Force acabou sendo lançado mesmo com a banda tendo feito apenas dois shows, alcançando a posição 33 nos EUA e 37 na Inglaterra.

Porém, o estrondoso e meteórico sucesso da Air Force barrou dentro do grupo, provando que nem sempre muitas estrelas formam uma constelação. Winwood não estava mais afim de viver no estrelato, e acabou saindo do projeto logo após o lançamento do primeiro álbum, voltando para a sua carreira solo. Para o seu lugar, o baterista e pianista Alan White (Plastic Ono Band, Yes) foi chamado, formando então um trio de bateristas.

Wood também partiu, e foi trabalhar com Winwood, trazendo o Traffic das cinzas junto com Jim Capaldi e lançando o fabuloso LP John Barleycorn Must Die (1970), e então, Colin Gibson foi chamado para o saxofone. Os vocais femininos também sofreram mudanças, com Jeanette dividindo-os com a namorada de Bond, Diane Stewart.

Essa formação durou apenas dois meses, de março a maio de 1970, e fez exatas 13 apresentações. O grupo ainda possuia uma data marcada para o Madison Square Garden em 20 de junho, mas acabou cancelando por problemas internos.
O poderoso naipe de metais da Air Force
De fato, Rick não estava mais entusiasmado com o projeto, e White foi participar do grupo de Yoko Ono. Assim, Baker reformulou novamente a Air Force, tendo agora como braço direito o velho amigo Bond. Ele foi o responsável por chamar Steve Gregory (sax, flauta) e Bud Beadle (sax) para re-agrupar o naipe de metais, que havia perdido Wood e McNair. Para os teclados, Bond chamou Ken Craddok, e lançou a namorada para o posto de primeira voz do grupo, dividindo-as com Aliki Ashman, contratada especial de Baker, o qual também recrutou o novo percussionista, o ganês Neemoi "Speedy" Acquaye.
A gigante segunda formação da Airforce

Com a nova formação tendo 11 membros, Baker foi para os estúdios, sendo um bandleader no estilo de Count Basie e Buddy Rich. Vez por outra, Rick e Layne apareciam no local e participavam das gravações. De junho a outubro, muito material foi realizado, e depois de uma seleção rigorosa, acabou sendo agrupadas as canções que fariam parte do segundo álbum da Air Force.
O segundo e último álbum da Airforce
Ginger Baker's Air Force 2 foi lançado em 1970, e abre com a cover para "Let Me Ride", de Roebuck Staple, com Rick no baixo e Laine nas guitarras. Os metais apresentam a canção trazendo a voz de Bond acompanhada pelos vocais femininos e um delicioso andamento feito por teclados, piano, guitarra e baixo, além claro dos metais e de Baker. Bond faz um interessante solo no órgão, com Laine solando ao fundo, em uma encantadora sobreposição de sons.

O clássico do Cream "Sweet Wine" vem a seguir, também com Rick no baixo e tendo Rouki Dzidzornu na percussão. A flauta faz a melodia do refrão acompanhada pelo tímpano, e então Baker surge, com flauta e vozes fazendo o tradicional riff da canção. Aliki comanda os vocais acompanhada por Diane e Catherine, em uma poderosa faixa que conta com um enlouquecido solo de sax feito por Bond, com diversas intervenções de flauta e guitarra.

Gibsons é o responsável pelo baixo em "Do U No Hu Yor Phrenz R?", a qual começa com a percussão de Rouki, tendo nos vocais Aliki, Diane, Bond e Baker, em uma leve jazz-waltz que lembra canções de bandas como The Band, com um belo solo de Bond.

O lado A encerra com a linda "We Free Kings", onde a percussão de Rouki é seguida pela bateria. Rick marca o ritmo no baixo enquanto flautas e teclados fazem o bonito tema da canção. Aliki e Diane fazem vocalizações acompanhando os metais, e então Aliki começa a cantar sozinha, com Diane acompanhando-a na frase final da estrofe.

Beadle faz o primeiro solo, enquanto Aliki e Diane fazem as vocalizações. Os metais trazem o tema para a segunda estrofe, e é a vez de Gregory solar acompanhado pelas vocalizações femininas. Mais uma vez, o tema dos metais leva a terceira estrofe da letra, com Bond assumindo a posição de destaque nos solos, mandando ver em um alucinante improviso, que leva ao final da canção com a repetição do tema princcipal.
A dupla feminina Aliki e Diane
O lado B abre com a balada "I Don't Want To Go On Without You", de Bert Berns e Jerry Wexler, onde flauta e sax fazem a melodia da letra, que é cantada por Laine e tem a participação de Aliki, Diane e Catherine, e assim como no álbum anterior, é uma faixa que passa despercebida, apesar dos bonitos temas de flauta.

Porém "Toady" recupera o alto nível. Baker colocou letra em cima de mais um clássico do Cream, que aqui começa com piano, baixo e flauta sendo acompanhados por Baker enquanto fazem improvisações. Aliki e Diane começam a cantar sobre a cadência criada pela bateria e pela percussão. Gregory faz o solo acompanhado pela viajante sessão instrumental feita por metais, piano, baixo, flauta e percussão.

A doideira pega fogo, com Bond e Gregory solando juntos, sobrepondo-se de forma espantosa e dando uma aula de improvisação, até os vocais retornar. Após a repetição do nome da canção, começa o solo de Baker e Neemo, que desta vez não vou comentar os detalhes, apenas apague a luz, deite e ouça cada segundo. Baker retorna o ritmo inicial, e os metais trazem o tema para a repetição da letra e o encerramento de outro grande clássico.

"12 gates Of The City", composta por Bond, trás o corpulento saxofonista e seu vozeirão acompanhado pelos vocais femininos. Destaque para o arranjo vocal e para a participação dos metais, tendo todo o tempero que somente Bond conseguia dar as suas canções.

"Let Me Ride", "Sweet Wine" e "I Don't Want To Go On Without You" foram gravadas em maio, "12 Gates Of The City" em setembro e "Do U No Hu Yor Ohrenz R?", "We Free Kings" e "Toady" em outubro, todas em 1970. Ginger Baker's Air Force 2 foi lançado com outras músicas na Alemanha. A ordem do vinil alemão é "We Free Kings", "Caribbean Soup", "Sunshine Of Your Love" (onde os metais dão uma aula de como re-criar um clássico), "You Wouldn't Believe It", "You Look Like You Could Use A Rest", "Sweet Wine", "I Don't Want To Go On Without You" e "Let Me Ride".
Show de despedida da Airforce
Após o lançamento do segundo álbum, os problemas começaram a aparecer. Mesmo sendo um bom disco, não atingiu vendagens expressivas, e isso tornava o ambiente complicado, afinal, o dinheiro que entrava era dividido entre onze pessoas. Big bands como a de Count Basie e Duke Ellington possuiam patrocínios para trabalhar e também agentes que mantinham o dinheiro certo para cada instrumentista, além de que o dinheiro recebido pelo "catálogo patenteado" de cada um deles era muito bom, mas isso não ocorria na Air Force.

A turnê de divulgação do segundo álbum foi agendada para grandes locais, com as imprensas britânica e americana taxando o grupo como sendo um Blind Faith reformulado. Porém, a venda dos ingressos foram muito baixas, e assim, o grupo encerrou as atividades em março de 1971, tendo realizado apenas 41 shows em dois anos de uma carreira curta.

Baker foi trabalhar com músicos africanos no projeto Stratovarius, tocando com Guy Warren (bateria), Fela Ransome-Kuti (órgão, voz, percussão), Bobby Gass (baixo), Sandra Danielle (voz) e Alhaji Jk Brimar (percussão) e lançando o álbum Stratovarius (1972). Baker tocou no disco do baterista Graeme Edge (ex-Moody Blues) chamado Kick Off Your Muddy Boot (1974). Formou a Baker Gurvitz Army, com quem lançou 5 LPs, e ainda fez parte de uma das formações da Hawkind.

O baterista ainda participou de vários outros grupos, como o Wings (tocando no álbum Band On The Run), PIL (onde gravou o álbum Album), Nutters, John Mizarolli e Master Of Reality, além de ter lançado vários álbuns solo e também feito parte da banda solo de Jack Bruce, com quem em 1994, formou, ao lado de Gary Moore, o BBM, que durou pouco tempo e gravou apenas um disco.
Junção dos dois álbuns em um único CD
Voltando a Air Force, no final dos anos 80, a Polygram relançou o primeiro LP em cd, e posteriormente o segundo álbum também em cd. No ano de 1998, ambos foram condensados em um cd duplo chamado Do What You Like, e que trás ainda raridades de estúdio com o projeto Stratovarius, sendo uma boa pedida para os bolhas de plantão.

A Ginger Baker's Air Force lançou ao mundo um dos melhores álbuns já gravados ao vivo e outro que é base para as misturas entre música africana, jazz e rock, e infelizmente, apesar de todo o talento atribuído para o grupo, hoje são lembrados mais como sendo um dos super-grupos dos anos 70 que não deu certo.

terça-feira, 22 de junho de 2010

Blind Faith


Como sair da depressão após largar uma grande banda? Simples,montar outra grande banda! E foi isso que os três ex-integrantes do Cream fizeram após o término do grupo em 1968. Nesta e nas próximas três edições do Baú do Mairon, vamos acompanhar como se desenvolveram a carreira de cada um dos membros pós-Cream, concentrando-se nas bandas em que formaram e nos álbuns lançados pelas mesmas.

Começamos então com os que não brigaram entre si, Eric Clapton e Ginger Baker. Guitarrista e vocalista multi-conceituado, Clapton teve seu início de carreira nos Yardbirds, tendo uma passagem pelos Bluesbreakers de John Mayall e vindo a alcançar o estrelato dentro do Cream. Já o baterista Baker vinha de uma estrondosa passagem pela Graham Bond Organisation (onde Bruce também fazia parte), e tinha como vantagem o fato de ser o único a aceitar as megalomanias de Clapton dentro do Cream, apesar de não aceitar as de Bruce.

Com o término do Cream, Clapton partiu para a formação um grupo onde tentaria esconder as brigas e o ego. Além disso, Steve Winwood (teclados, voz, guitarras) estava com problemas desde o término prematuro do Traffic, sendo que já havia saído da Spencer Davis Group (onde era o vocalista líder) justamente em busca de um som um pouco mais diferente.

Desta forma, Clapton convidou Winwood para algumas jams, e então, viram que a coisa estava ficando boa, mas precisavam de um baterista. Clapton recorreu ao amigo e ex-companheiro de Cream, no caso, Baker. Em maio de 1969, chamam o baixista do Family Rick Grech para acompanhá-los e então, fecham a formação clássica de um grupo que ainda não tinha nome!
Raro LP com registros da Powerhouse

Clapton e Winwood já haviam tocado juntos no grande projeto Powerhouse, que entre 1965 e 1966 contou com Paul Jones (vocais, Manfredd Mann), Jack Bruce (baixo, Cream) e Pete York (bateria, Spencer Davies Group), além de Clapton e Winwood, mas que infelizmente deixou como registro apenas três faixas no raro LP What's Shakin (a saber "Crossroads", "Steppin' Out" e "I Want To Know"). Este contato anterior tornou o processo de composição do novo grupo ainda mais rápido, e em poucas semanas, estavam com material suficiente para um álbum.

Logo, o quarteto foi intitulado pela imprensa como super-grupo, e assim, passaram a ensaiar e cômpor material para apresentações. Obviamente, o sucesso em torno dos nomes dos membros levou a Polydor a fechar um contrato para a gravação do LP, já que tanto Clapton quanto Baker ainda estavam sob o nome da gravadora.

Primeira apresentação da Blind Faith
Enquanto isso, a excitação dos fãs tanto de Cream como do Traffic em torno do novo grupo era grande, tanto que alguns apelidaram carinhosamente o grupo de Super Cream. Toda a expectativa criada foi matada com o agendamento de um show para o Hyde Park de Londres, o qual ocorreu em 7 de junho de 1969, onde apenas os nomes dos integrantes da banda era divulgado. A adrenalina gerada no palco, bem como a suavidade nas notas, mostrou a Winwood que o projeto tinha tudo para dar certo. Claro, o retorno do público foi extremamente positivo, o que permitia a ele sonhar ainda mais alto.

Mas Clapton era relutante, e tinha em mente que tudo não passava de aplausos em torno do nome dos membros do grupo, e não por causa do grupo em si. Além disso, Winwood era contratado da Island Records, criando mais um empecilho para a gravação do álbum.
Bolachinha com o primeiro registro do Super Cream
O jeito foi o lançamento de um single por ambas as gravadoras. Intitulado Change of Adress from 23 June 1969, a rara bolachinha de 45 rotações foi lançada como divulgação somente na Inglaterra, trazendo a gravação em apenas um lado de uma jam instrumental feita pelo grupo ainda sem Rick. No rótulo, o logotipo e telefone da Island e um novo endereço para a gravadora, sem mencionar o nome da banda. A tiragem da bolachinha foi de apenas 500 cópias, e se você encontrar uma, belisque-se para ver se não está sonhando.

Voltando ao andamento do super grupo, ainda sem nome de batismo, conseguem convencer a Island a "emprestar" Winwood para a Polydor, e então, passam a gravar aquele que seria o único registro do grupo, ao mesmo tempo em que finalmente surge um nome, graças a arte encomendada para a capa do LP, como veremos a seguir.

Agendam uma excursão pela Escandinávia com o nome de Blind Faith (nome dado a arte da capa do futuro LP), e após passar pela terra das lindas loiras, fazem shows por Estados Unidos, onde estreiam tocando para 20.000 pessoas no Madison Square Garden no dia 12 de julho, e encerram a turnê em 24 de agosto, tocando no Hawai, sendo altamente aclamados. Nesta turnê, tiveram como bandas de abertura alguns iniciantes como Taste, Free e Delaney Bonnie & Friends.
Registro do incidente no MSG
Um fato negativo acabou acontecendo no show do Madison Square Garden. Durante uma determinada canção, Baker perdeu sua baqueta, que ficou parada na beira do palco, próxima a um fã, que rapidamente tentou subir ao palco para pegá-la. Os seguranças do local acabaram agredindo o fã diante dos músicos. Indignado, Baker saltou da bateria e pulou nas costas de um dos seguranças que agrediam o fã. A pancadaria entre banda e seguranças tomou conta do local, interrompendo o show de forma abrupta enquanto o público levantava os dois dedos no tradicional sinal de paz e amor.

Enquanto a turnê rolava pelos EUA, em agosto é lançado pela Polydor o primeiro e único álbum da banda, intitulado Blind Faith, com a arte para a capa tendo sido criada por Bob Seidemann (famoso por fotos de Janis Joplin e Grateful Dead). Seidemann batizou a arte desta forma por que "era a forma de representar o amadurecimento de uma fruta através da transformação, e isso só poderia ser feito com uma menina transformando-se em uma mulher, estimulando a esperança e o desejo de um novo começo, inocentemente chamado de Fé Cega".
A polêmica arte que deu nome ao grupo

Falaremos mais da famosa capa daqui a pouco, mas agora, vamos nos prender no que está contido nos sulcos de Blind Faith. Gravado quase que ao vivo, o LP abre com "Had To Cry Today", com Winwood e Clapton fazendo o riff nas guitarras. Winwood solta seu vozeirão, em um maravilhoso som regado com as típicas notas de Clapton e comandado por uma leve cadência de Rick e Baker, além dos dedilhados de Winwood.

O solo de Clapton é feito sobre o riff que é repetido por Winwood e Rick, enquanto Baker solta o braço, voltando aos vocais e com Winwood soltando-se um pouco mais na guitarra. Winwood rasga a voz entoando o nome da canção, enquanto Winwood e Clapton acumulam notas, solando individualmente sobre o mesmo tema, partindo para a viajante sessão de encerramento, onde Winwood sola no canal esquerdo e Clapton no direito. Dois solos sensacionais ouvidos ao mesmo tempo, sem embolar, com Rick e Baker acompanhando a loucura dos dois de forma alucinada. De tirar o fôlego! A canção encerra-se com a repetição do tema principal, e só ela já vale a pena o vinil, mas ainda tem mais.

A clássica "Can't Find My Way Home" surge com os violões de Winwood e Clapton acompanhados pela percussão de Baker. A voz doce de Winwood trás a bela letra, enquanto os violões fazem os acordes para um belo arranjo.

"Well All Right" surge com um tema e melodia que lembram canções do Traffic, principalmente pela levada ao piano de Winwood. Clapton e Winwood dividem os vocais, em uma canção animada e bem diferente das anteriores, e tendo um belo solo de piano de Winwood.

O lado A encerra com outro clássico, "Presence Of My Lord", uma linda balada comandada pelo piano e pela guitarra de Clapton. A leve cadência de Rick e Baker emociona, e os vocais de Winwood estão em ótima apresentação. A canção muda com a entrada do solo de Clapton, onde com muitos efeitos solta os dedos em um acompanhamento vibrante de Rick, Winwood e Baker, voltando a balada após o solo, com Winwood cantando e Clapton solando ao fundo.
Versão americana de Blind Faith

O lado B abre com "Sea Of Joy", onde o órgão de Winwood apresenta o primeiro riff, e depois puxa o violão, em uma música que lembra clássicos flower-power. Outra bela canção, com um belíssimo arranjo vocal de Winwood, mostrando por que é um dos melhores vocalistas de todos os tempos. A faixa ainda conta com um bonito solo de violino de Rick, e é apenas o aquecimento das turbinas para a viajante "Do What You Like".

A canção já começa com Winwood cantando na cara do ouvinte, com um acompanhamento singelo da bateria, onde teclado, guitarra e baixo fazem apenas dois acordes, e tendo uma parte um pouco mais pesada quando o nome da canção é cantado. Após algumas estrofes, entramos na longa sessão instrumental, com Winwood solando no órgão de forma magnífica, sempre tendo como base o acompanhamento dos demais membros da banda. O som psicodélico do órgão de Winwood lembra canções do prog californiano, e assim como o solo de Winwood, a canção vai ganhando corpo.

Clapton então começa seu solo, com escalas bem diferentes das que ele costuma usar. A canção vai ganhando pique com o belo solo de Clapton, e Winwood faz os acordes do acompanhamento no órgão com muita técnica e precisão, acompanhado por Rick e Baker. Algumas vocalizações aparecem, até Rick começar seu solo, acompanhado apenas pelo cymbal de Baker e as vocalizações ao fundo.

Baker então fica sozinho no cymbal e no bumbo, começando a solar de foma simples. Aos poucos, vai adicionando batidas e viradas, sempre com o cymbal ditando o ritmo das mesmas. Alternando batidas na caixa e nos tons, Baker entra em uma uma sequência de rolos e viradas dos bons tempos de Cream, até demolir o kit de forma única, usando os dois bumbos impecavelmente.

As vocalizações reaparecem, e então, Baker trás o ritmo da canção novamente, com Winwood encerrando a letra, com uma viajante sequência de barulhos estando presente no final entre vozes agonizantes, cacarejos de galinhas e guitarras desafinadas.
Pôster de divulagação da mini-turnê americana
A arte Blind Faith causou polêmica, já que trazia uma menina adolescente com os seios nus segurando uma aeronave que para alguns lembrava um pênis ereto. Como sempre, a versão americana do álbum saiu com uma capa diferente, tendo apenas uma foto dos quatro integrantes. A saber, a menina da foto chama-se Mariora Goschen, e na verdade, quem era para ter posado era a irmã de Mariora, mas como ela ja tinha 14 anos, a transformação proposta pelo artista não seria mais válida. Mariora na foto está com 11 anos, e a menina exigiu um cavalo para fazer a foto. Com a autorização dos pais, Mariora não ganhou o cavalo, mas sim 40 libras e o status de ser uma das garotas mais famosas do ano de 1969.
Blind Faith

Blind Faith alcançou o número 1 na parada da Billboard americana dos discos pop, e a posição 40 da mesma Billboard nos álbuns de música negra. Na Inglaterra atingiu o posto número 1 em setembro de 1969, tornando-se um êxito comercial, atingindo a marca de um milhão de cópias vendidas em menos de um mês de lançamento.

Porém, após o lançamento de Blind Faith, o stress começou a bater em Clapton (de novo). Chiliquento, Clapton estava indignado de ter que colocar músicas do Traffic e do Cream para completar os shows do grupo, já que o material composto e mesmo as longas improvisações tinham um total de pouco mais de uma hora.

O grupo voltou para a Inglaterra com os rumores de que tinham terminado suas tarefas. Em outubro, Clapton anunciava o fim de uma das melhores e meteóricas bandas de todos os tempos, alegando problemas internos (de novo!) e tendo feito apenas 28 shows na sua curta carreira.

Caixa de Steve Winwood - The Finer Things


Recente registro de Clapton e Winwood

Em julho de 2007, Clapton e Winwood reuniram-se para tocar durante a segunda edição do Crossroads Guitar Festival, realizado no Toyota Park Center de Bridgeview (Illinois), onde tocaram várias canções da Blind Faith. Este encontro levou a dupla a realizar uma série de três noites no Madison Square Garden, nas datas de 25, 26 e 28 de fevereiro de 2008, tendo Willie Weeks no baixo, Ian Thomas na bateria e Chris Stainton nos teclados. A performance, com várias canções da Blind Faith, foi registrada no emocionante LP/DVD/CD Live from Madison Square Garden.

Clapton e Winwood em show no mês passado
No verão de 2009, Clapton e Winwood fizeram 14 datas na cidade de New Jersey, tendo Abe Jr no lugar de Ian Thomas, além de duas backoing vocals (Michelle John e Sharon White), e recentemente, encerraram uma excursão pela europa, a qual começou em 18 de maio e terminou no dia 13 de junho, tendo Steve Gadd na bateria.

Após a Blind Faith, Clapton partiu para trabalhar com a Plastic Ono Band (1970) e os amigos Delaney & Bonnie and Friends. Posteriormente, formou outra mega-banda, como veremos na terceira sequência de matérias sobre os membros do Cream pós Cream. Já Baker, Rick e Winwood seguiriam juntos, como veremos na próxima edição do Baú do Mairon.


Em 1986, a Polydor lançou Blind Faith em CD, trazendo mais duas canções: "Exchange and Mart" e "Spending All My Days", as quais originalmente foram gravadas para fazer parte de um álbum solo de Rick, o qual nunca foi lançado. Ao que parece, nenhum dos outros membros da Blind Faith participou dessas gravações. Duas faixas gravadas no concerto do Hyde Park surgiram na caixa de 4 Cds de Steve Winwood, chamada The Finer Things, a qual foi lançada em 1995. Em 2001, uma versão deluxe de Blind Faith foi lançada em CD duplo, trazendo muito material inédito, como ensaios e jams espetaculares, sendo o segundo CD somente com ensaios do grupo ainda como trio.


terça-feira, 15 de junho de 2010

Atahualpa Y Us Panquis


"A mais chinela banda do rock gaúcho". Essa é a definição dada por um dos membros da própria banda, Jimi Joe, que batizou o grupo homenageando um grande violonista argentino fazendo um trocadilho com o seu nome, Atahualpa Y Us Panquis.

O grupo surgiu em 1984, e era formado inicialmente por Jimi Joe (vozes, guitarras, samplers), Paulo Nequete (guitarras), Carlos Miranda (teclados), Castor Daudt (bateria) e Flávio Santos (baixo). Jimi já havia feitos incursões anteriores pelo grupo Quem Tem QI Vai, um bizarro grupo que se apresentava de forma escandalosa, com roupas e maquiagens, misturando rock, samba e chorinho.

Os demais membros do Atahualpa também possuiam seus projetos anteriores, mas realmente, a profissão de cada um não era a música, tanto que Jimi é (e foi) um reconhecido jornalista dentro do Rio Grande do Sul.

No tradicional Bar Marcelina, em Porto Alegre, os cinco se reuniram e formaram o grupo, que logo começou a ensaiar e cômpor, mantendo uma linha punk rock jamais vista nos padrões gaúchos dos anos 80. Rapidamente o nome Atahualpa Y Us Panquis começou a pegar, e o grupo passou a frequentar locais famosos da cena rockeira de Porto Alegre, como o Bar Ocidente, o Teatro de Arena e tendo inclusive apresentações nos Ginásios Tesourinha e Gigantinho.

O grupo ensaiava no pátio da avó de Miranda, e ali, pintavam nomes que se tornariam posteriormente famosos e conceituados como Edu K, Wander Wildner e Frank Jorge. Com Edu K, Jimi e Miranda formaram o grupo 3 Almas Perdidas, que não durou mais do que algumas semanas.

O tempo passou e o Atahualpa foi angariando muitos fãs, e graças ao talento de Miranda e Jimi, passaram a revelar bandas de abertura que sempre se tornavam sucesso, como é o caso de Engenheiros do Hawaii e Os Replicantes. Porém, o apelo pouco comercial do som da Atahualpa não possibilitava a assinatura de um contrato para gravação de um LP, e assim, a banda começou a se desestabilizar.
O raro k7 Zona Mortal

Antes, deixam suas participações no disco Rock Garagem II (1985), onde tocam a faixa "Todo Mundo Saca", um poderoso punk cantado de forma agonizante por Jimi com viajantes participações de samplers, e na rara fitinha Zona Mortal (1986), gravada ao vivo, onde tocam uma alucinante versão para "Revolution" (Beatles), com muita microfonia e barulhos esquisitos e uma mulher gritando "chega! chega! chega!" ao fundo, e também "Atahualpa Y Us Panques", outra ao vivo, mostrando todo o poder da guitarra suja de Nequete. Nesta fitinha também estão preciosidades de de Miranda ("Ao Lado Esquerdo do Meu Ombro"), 3 Almas Perdidas ("Terminal") e também da Urubu Rei ("Pin Up"), além de outros artistas como Júlio Reny E Km 0, Cóccix, Anomalia e Cascavelettes.

Nequete abandonou o projeto, e como um quarteto, tendo Miranda nas guitarras, o grupo acabou gravando em quatro dias do rigoroso inverno de 1988 o que chamou no encarte de "merda", mas que está longe de ser isso, sendo sim um símbolo do rock contra-cultura feito pela gurizada dos anos 80.
O unico registro oficial da Atahualpa

A gravação acabou sendo engavetada, e somente 4 anos depois, com cada membro saindo para outros projetos, foi parar nas mãos de Luiz Carlos Calanca, o dono da Baratos Afins, que condensou os pouco mais de 25 minutos do registro no excepcional LP Agradeça Ao Senhor, lançado em 1993 pelo selo Baratos Afins.

O disco abre com "Rê Rê Rê Rê I", onde samplers, vozes programadas e risadas tipo o personagem pica-pau ficam se repetindo por alguns segundos, levando a paulada "Escola Na Maldade", onde o baixo de Flávio vai apresentando pequenos acordes de guitarra e batidas nos pratos. Um arroto (!) seguido por notas barretianas tornam por aumentar o volume da canção, apresentando a voz distorcida de Jimi, cantando a fantástica letra que foi encontrada rabiscada em um pedaço de jornal dentro de uma sarjeta.

O ritmo psicodélico da faixa é comandado pelos estranhos acordes de Miranda e pelas viradas de Daudt, além da marcação precisa de Flávio. A letra é repetida diversas vezes, com a música tornando-se uma overdose de riffs ácidos e microfonias, parecendo sair dos anos 60, mudando em um poderoso e sujo punk na faixa "As Putas".

Outra paulada comandada pela guitarra de Miranda, "As Putas" fala contra a prostituição e aqueles que buscam essa saída sexual para alimentar seus instintos. As batidas de Flávio e Daudt formam uma delirante vinheta onde Miranda rasga sua guitarra em riffs despojados e acordes totalmente impensáveis.

O lado A encerra-se com "Lá Lá Lá", uma hilária faixa que começa com harmônicos da guitarra puxando um samba, enquanto o baixo tenta executar um determinado riff. Com a ajuda da guitara, finalmente Flávio acerta o riff, e assim, fica repetindo o mesmo enquanto Miranda delira em feeds e microfonias. Um coro formado por nada mais nada menos que Edu K, Wander Wildner, Frank Jorge e mais os quatro membros do grupo faz o "lá-lá-lá" que dá nome a canção, enquanto um indignado marido pergunta para a esposa uma frase que está eternizada nos anais do rock de Porto Alegre: "Querida, onde você pôs meu aparelho de barba?".

Daudt surge na bateria, fazendo um funk setentista, e assim a faixa ganha ritmo, com o marido cada vez mais doido com a esposa, parecendo querer bater na mesma. A irritação vai tomando conta do marido, até ele explodir em raiva, com mulheres cantando um samba tradicional onde a letra é apenas os "lá lá lá" que dá nome a faixa.

A faixa-título abre o lado B, com a guitarra fazendo o tema da canção, seguido por uma percussão e pela letra, cantada pelo mesmo coro de "Lá Lá Lá" e na mesma melodia da guitarra. Sintetizadores dissolvidos entre camadas de gritos e palmas são o principal destaque, ao lado de uma macabra pregação evangélica que toma conta das caixas de som antes do encerramento da faixa, a qual ocorre com aplausos, microfonias e engasgos.

"Só Há Uma Maneira de Se Viver" é recheada de microfonias, com destaque para o baixo de Flávio. Miranda solta os dedos em um belo trabalho de escalas, abusando da alavanca, com a cozinha suja de Flávio e Daudt fazendo um ótimo punk para mais uma letra simples e direta cantada de forma única por Jimi.

A clássica "O Amor" dá sequência, com guitarra e baixo fazendo as mesmas notas até o surgimento da bateria e os vocais distorcidos de "Escola Na Maldade". Novamente, a guitarra psicodélica de Miranda está na frente do ouvinte, além de sintetizadores e de um sampler delirando junto com a guitarra. Jimi repete que "O amor é a praga do mundo" e a canção parece que acaba do nada, porém ela retorna com Jimi implorando para "ser odiado cada vez mais", e o pique da cozinha mandando ver em uma viajante mistura de microfonias e distorção, encerrando o álbum com "Rê Rê Rê Rê II", que é a mesma versão que "Rê Rê Rê Rê I", e que culmina o único registro dessa impecável banda de fazer barulho.
Carlos Eduardo Miranda

Miranda tornou-se um monstro na produção e revelação de bandas pelo país afora. Tendo passagens por grupos obscuros como Urubu Rei, A Vingança de Montezuma e Taranatiriça, Miranda virou jornalista da extinta revista Bizz. Ao lado do grupo titãs, criou o selo Banguela, e depois os selos Excelente Discos e Matraca. Graças ao Banguela, revelou aquele que talvez seja o maior nome já criado na sua carreira, os Raimundos.

Além do grupo de Brasília, também é responsável por descobrir outros grandes nomes como a Graforréia Xilarmônica, Virgulóides, Mundo Livre S/A, Little Quail & The Mad Birds, Skank, Maskavo Roots, Party Up, Língua Chula, Maria do Relento e outros, e foi o precussor em gravações de gigantes como Os Replicantes e DeFalla. Miranda também criou e dirigiu o site Trama Virtual, responsável pela distribuição de artistas independentes. Participou de programas na TV e ainda está na ativa trabalhando como jornalista e crítico musical.
Daudt tocando em Maceió (2009)

Daudt, que havia passado pelos grupos Caminhão Honesto, Chamborraia, Os Bonitos e Urubu Rei, substituiu Biba Meira no DeFalla, onde tocou bateria até a saída de Edu K. Com a saída do mentor e criador do grupo em 1995, Daudt assumiu as guitarras, e o grupo passou a se chamar D-Fhala. Abandonou o grupo com a volta de Edu K, e hoje trabalha com comunicaçao, morando em Maceió e fazendo um barulho de vez em quando.
Segundo CD de Flu

Flávio também passou pela Urubu Rei e fez sucesso no DeFalla, ao lado de Daudt. Abandonou o grupo junto com Edu K e seguiu carreira solo, adotando o nome de Flu e lançando pela Trama de Miranda dois álbuns: ... E A Alegria Continua (1999) e No Flu do Mundo (2003). Voltou ao DeFalla em 2004, e hoje vive em São Paulo, participando do grupo Banda Leme.
Jimi Joe em show na capital gaúcha

Já Jimi seguiu sua carreira no jornalismo, morando em São Paulo até 1994. Voltou ao Rio Grande do Sul nesse mesmo ano, e passou a trabalhar com grupos como A Cretinice Me Atray, Les Johnson e Justine, além de participar de discos de Júlio Reny e Wander Wildner. Formou o grupo Os Daltons, adotando o nome de James Dalton e ao lado de Júlio Reny (Julius Dalton ), Cristiano Varisco (Cris Dalton) e Wolney Campos (William Dalton), permanecendo com o grupo por 6 anos.
Disco solo de Jimi Joe

No final de 2005, lançou seu primeiro disco solo, Saudade do Futuro, com produção de Astronauta Pingüim, e ainda segue fazendo shows e eventos culturais pela capital gaúcha, além de ser tradutor de vários livros e também de ser coordenador de programação e conteúdo na rádio Unisinos FM.

E segundo próprio Jimi, o Atahualpa deixou um acordo que o grupo pode surgir em qualquer lugar do planeta, bastando apenas um dos integrantes originais estar presente e adotar o nome da banda. Esperamos que os quatro um dia possam retornar e mostrar toda a loucura dos anos 80 novamente.

terça-feira, 8 de junho de 2010

The Doors sem Jim Morrison


Poderia uma banda sobreviver sem o seu principal artista? Essa pergunta pode ser respondida com um sim para diversas bandas. Pink Floyd, por exemplo, alcançou o status de maior banda do rock progressivo após a saída do seu líder e fundador, Syd Barret. O Uriah Heep, com a saída de Ken Hensley (principal letrista e compositor do grupo) manteve-se entre altos e baixos nas costas do guitarrista Mick Box. Deep Purple e Black Sabbath são outros bons exemplos de bandas que mesmo perdendo seu principal membro (Ritchie Blackmore no Purple e Ozzy Osbourne no Sabbath) se mantiveram com relativo sucesso.

Porém com o The Doors, o processo não funcionou da mesma forma, apesar de dois bons álbuns lançados pelo grupo pós-morte do vocalista Jim Morrison.

Formado em 1965 por Morrison, Robbie Krieger (guitarras), Ray Manzarek (teclados, voz) e John Paul Densmore (bateria), o The Doors foi um dos principais nomes da cena californiana do final dos anos 60. Com uma carreira meteórica, o grupo conquistou a América com clássicos como "Light My Fire", "Break On Through", "Touch Me" e as épicas "When The Music's Over" e "The End". 





Morrison após prisão em New Haven
 

Muito do sucesso do The Doors passava por Morrison, um tímido garoto que no palco, encarnava uma espécie de "índio selvagem", e ali pirava insanamente, com danças esquisitas, declamações de poemas estranhos e desafiando autoridades. Bonito, charmoso e inconsequente, Morrison arrebatava fãs assim como destruia a imagem do The Doors com suas atitudes imaturas, e com menos de dois anos de carreira, o The Doors saía do auge e entrava no fundo do poço.

Vários incidentes com a polícia fizeram parte da trajetória de Morrison, como a prisão em pleno palco de New Haven ainda em 1967, e o mais famoso caso de Morrison, o show em Miami no dia 5 de março de 1969, onde o vocalista mostrou o pênis para a plateia, além de simular sexo oral em Krieger, e novamente, saiu do palco algemado. Como consequência, Morrison foi condenado a seis meses de prisão, conseguindo liberdade condicional para realizar alguns shows e também gravar com seus colegas após pagamento de fiança estimada em 500 dólares. 





Morrison após condenação pelo Caso Miami
 

Com todas as atitudes despojadas e consequentes problemas tanto emocionais quanto financeiros, o The Doors afundava em um mar de drogas e loucuras, lançando álbuns considerados fracos como The Soft Parade (onde a faixa título foi gravada com Morrison recebendo um "trabalho-oral" de sua namorada, Pamela Courson) e o bluesístico Morrison Hotel. Cada vez mais gordo e sem condições físicas, Morrison deixou seu último registro com a banda no bom disco L. A. Woman (1971), e dias antes de se afastar do mundo da música, gravou vários poemas no estúdio da Elektra, os quais posteriormente foram musicados e lançados no emocionante An American Prayer (1978).

Após o lançamento de L. A. Woman, Morrison foi para Paris com Pam, em busca de novos ares e principalmente, para se afastar da imprensa e da polícia que o perseguiam de forma implacável e intolerante a invasão da privacidade do vocalista. Por fim, no dia 3 de julho de 1971, Morrison foi encontrado morto na banheira de sua casa em Paris. Nenhuma autópsia foi realizada, e muitos julgam que até hoje o vocalista está escondido nos campos franceses, e ele teria sido o principal incentivador de que Krieger, Manzarek e Densmore seguissem com a carreira do The Doors, já que sabidamente, os três eram ótimos músicos e compositores, não precisando mais da voz de Morrison para continuar em frente.

Lenda ou não, o fato é que após a morte de Morrison, a gravadora Elektra fez a proposta para os remanescentes gravarem mais um álbum com o nome The Doors. Ambos já estavam gravando material sem Morrison, em junho de 1971, com a finalidade (e esperança) de que com Morrison recuperado, o grupo pudesse voltar aos velhos tempos. Com a morte de Morrison, o grupo decidiu por terminar o material que já possuiam, com Manzarek e Krieger nos vocais.



O primeiro álbum sem Morrison
 

Então, em outubro de 1971, chegava as lojas o primeiro disco do The Doors sem Morrison, Other Voices, um bom álbum, com a maioria das composições tendo sido feitas ainda para o álbum L. A. Woman, mas que por razões desconhecidas, acabaram não entrando no mesmo. Other Voices é injustamente malhado por fãs e imprensa especializada, que acusam o grupo de usar a imagem e o nome de Morrison para ganhar dinheiro, uma grande mentira.

"In The Eye Of The Sun" abre a bolacha, apresentando Jack Conrad no baixo (isso agora viraria uma marca, a variação do baixista de faixa para faixa) introduzindo a canção junto com o órgão fazendo o riff principal. Os vocais de Manzarek surgem em um blues psicodélico tipicamente Doors, facilmente encontrado em L. A. Woman, com o órgão e a guitarra solando juntos. Krieger usa wah-wah em seu solo, deixando a canção ainda mais psicodélica e preparando o ouvinte para as faixas a seguir.

"Variety Is The Spice Of Life" também conta com Conrad no baixo, e tem Densmore comandando o ritmo desse grande rock cantado por Krieger, que faz um interessante solo misturando guitarra destorcida e limpa, com Manzarek ao piano.

A linda "Ships W/ Sails" surge, com Ray Neapolitan no baixo. Baixo e guitarra executam o riff principal, acompanhados pela percussão de Franciso Aguabella,além de Densmore e Manzarek. A guitarra faz o belo tema da faixa, com os vocais de Manzarek cantando a letra na mesma melodia. A canção vai ganhando corpo, e chegamos no bonito solo de baixo acústico, feito por Willie Ruff, o qual é acompanhado por um delicioso e contagiante ritmo latino.

Manzarek faz intervenções com piano e órgão, puxando o tema principal e fazendo o seu solo em uma jam espetacular, onde todos parecem improvisar sobre a levada de Neapolitan. A repetição do tema principal por Manzarek e Krieger deixa Aguabella sozinho por alguns instantes, voltando então os instrumentos e a letra. Aqui fica impossível não imaginar os vocais de Morrison, pois o estilo é bem apropriado para as linhas vocais do Rei Lagarto.

O solo de Krieger, com notas melodiosas e muito feeling, leva a sequência final, com uma hipnotizante levada rítmica que é mantida em toda a faixa, encerrando-a com vários acordes de guitarra e órgão.

"Tightrope Ride" encerra o lado A com Conrad no baixo, e a guitarra fazendo riffs com intervenções da bateria. Baixo, órgão e os vocais de Manzarek surgem, em outro bom rock, com uma letra fácil e grudante, e que homenageia os Rolling Stones e Brian Jones.




The Doors (1971)


O lado B abre com "Down On The Farm", trazendo Jerry Scheff no baixo e ainda Emil Richards na marimba, whimwams e rickshaws. O órgão faz a introdução acompanhado pela marimba, com os vocais de Manzarek e Krieger acompanhados pelos demais instrumentos em uma leve balada. Destaque para o interessante refrão, cantando em grande estilo pela dupla, transformando a balada em um fantástico blues, onde Krieger sola na gaita de boca recheado com os efeitos percussivos de Richards. A balada é retomada com a letra, assim como o blues, que encerra a faixa estourando nos alto-falantes. Essa faixa é uma das que haviam ficado de fora de L. A. Woman.

"I'm Horny, I'm Stoned" apresenta o piano como destaque central, acompanhado pelo baixo de Scheff, Densmore e Krieger. Após alguns versos da guitarra, imitando um trompete, Krieger começa a cantar nas tradicionais linhas vocais do The Doors, levando a outra linda canção, a balada "Wandering Musician". A leve introdução com o piano elétrico lembra o som de uma harpa, com Manzarek construindo a melodia da canção, seguido pelo baixo de Scheff e pela bateria. Manzarek canta sobre o belíssimo arranjo, com destaque para as intervenções da slide guitar de Krieger. Após a primeira parte da letra, Manzarek começa seu solo no piano, tocando no canal esquerdo, com Krieger solando junto no canal direito. Os solos vão crescendo em um ótimo pique, parando de forma surpreendente e retomando a letra e o ritmo inicial, com uma interpretação vocal muito emocionante.

O disco encerra com "Hang On To Your Life", contando agora com Wolfgang Meltz no baixo e ainda com a percussão de Aguabella, que introduz trazendo baixo e bateria. As notas latinas do órgão surgem acompanhadas pela guitarra, fazendo o tema principal. Manzarek divide os vocais com Krieger no refrão, que é o responsável pela mudança na sonoridade da canção, virando um som totalmente latino, com Manzarek e Meltz solando ao fundo enquanto a letra é cantada pelo tecladista. Finalmente, um rufar de bateria transforma a faixa mais uma vez, agora em um pesado som comandado por baixo, órgão, guitarra e percussão, com Manzarek e Krieger solando alucinadamente, com a canção encerrando em um estrondoso riff de guitarra.

Other Voices acabou atingindo a posição 31 na Billboard norte-americana, e o single de "Tightrope Ride" ficou na posição 71. Após o lançamento de Other Voices, os remanescentes decidiram encerrar as atividades. Porém, em janeiro de 1972, a gravadora Elektra lança a coletânea Weird Scenes Inside The Gold Mine, trazendo duas canções que só haviam sido lançadas em lados B ("Who Scared You" e "(You Need Meat) Don't Go No Further". A coletânea vendeu muito bem, e assim, surge a proposta de mais um álbum de estúdio. 



O derradeiro Full Circle

 

Então, durante março e abril de 1972, o trio se reune novamente para compor e gravar material. Em agosto, é lançado o derradeiro LP Full Circle. Trazendo uma belíssima capa desenhada por Joe Garnett, o disco mostra um The Doors cada vez mais próximo do jazz, com muitos improvisos e empregos de técnicas especificamente do estilo.

"Get Up And Dance" é a responsável por abrir os trabalhos, trazendo Chris Ethridge no baixo. O riff inicial seguido por viradas de bateria apresenta então o piano e palmas. Os vocais de Manzarek surgem, acompanhados por vocalizações feitas por Clydie King, Venetta Field e Melissa Mackay, as quais foram apelidadas de The Other Voices. Essa é a faixa mais dançante e diferente das demais.

"4 Billion Souls" comprova isso. Trazendo Jack Conrad no baixo, tem no início apenas violão e baixo acompanhado os vocais de Krieger, com aquele marcante som do órgão de Manzarek. O solo do tecladista, com as intervenções de Krieger, remetem novamente aos improvisos do álbum L. A. Woman, e a faixa encerra com um curto solo de Krieger.

A fantástica "Verdillac" vem a seguir, com Charles Larkey no baixo, percussão de Bobbi Hall e ainda uma espetacular participação de Charles Lloyd no saxofone. A faixa inicia com passagens de órgão, guitarra e bateria, em um interessante boogie que poderia estar dentro do álbum Morrison Hotel, seguido pelo ótimo tema feito pelo sax e baixo. Os vocais são divididos por Manzarek e Krieger, que comanda a canção abusando do wah-wah. A participação do baixo no maravilhoso solo de Lloyd é fundamental para termos um clima viajante, regado pelas intervenções do órgão de Manzarek e pela percussão de Hall. Krieger sola no canal esquerdo, enquanto Hall sola no direito, em uma viajante sessão instrumental que leva ao seguimento da letra e ao encerramento desta excelente canção.

"Hardwood Floor" é um ótimo rock cantado por Manzarek, com a participação das The Other Voices, além de Krieger tocando gaita de boca. O baixo ficou a cargo de Leland Sklar. Destaque para o piano, responsável por comandar o ritmo da canção, e para o belo solo de gaita de Krieger. O lado A encerra com a cover de "Good Rockin'", de Roy Brown, trazendo Conrad no baixo. A fala "take 3" e a contagem inicial levam a supor que esta faixa foi gravada ao vivo no estúdio, mas infelizmente não sei dizer se isso realmente aconteceu. Outro bom rock, na linha rockabilly cantado por Manzarek, com bons solos de piano e guitarra. 



The Doors ao vivo (1972)
 

A clássica "The Mosquito" abre o lado B, onde Krieger canta em espanhol acompanhado apenas por violão e o baixo de Sklar. Intervenções de piano surgem, dando início a uma sessão instrumental com um tema executado por guitarra, baixo e órgão levando ao ótimo solo de órgão, seguido pelo também ótimo solo de Krieger, com Densmore tocando muito. A faixa encerra com a repetição do tema que abre a sessão instrumental, enquanto Krieger e Manzarek solam nos canais esquerdo e direito.

A linda "The Piano Bird" vem a seguir, trazendo um levíssimo clima em uma longa sessão instrumental, apresentando a canção devagar, com pitadas de percussão feitas por Chico Batera e uma hipnotizante flauta tocada por Lloyd. Os vocais de Manzarek e Krieger surgem com a letra, e a flauta continua delirando entre as frases cantadas pela dupla. Manzarek executa o solo de órgão no canal direito, com temas de flauta e guitarra acompanhando-o no canal esquerdo, e o ritmo jazzístico ganhando acréscimos de diferentes efeitos, até o solo de flauta encerrar esta que para mim é a melhor canção dessa fase do The Doors.

"It Slipped My Mind" retoma o estilo da banda, com Krieger fazendo o riff principal, seguido pelo órgão, o baixo de Sklar e a bateria. Os vocais aqui são de Krieger, que faz um belo trabalho em seu solo. O disco encerra com a delirante "The Peking King And The New York Queen", contando com o baixo de Conrad, narrando a história dos amantes sol e lua, que vieram a Terra encarnados como o rei de Pequim e a rainha de Nova Iorque,e acabam brigando entre si pelas divergências de se localizarem em lados opostos dentro do planeta.

A faixa abre com o piano elétrico no canal esquerdo, comandando o ritmo da canção, com o baixo surgindo no canal direito, assim como a bateria e o wah-wah da guitarra. Manzarek é o responsável pelos vocais, e a canção é muito parecida com a clássica "L. A. Woman", novamente com a participação das The Other Voices, entoando o nome da faixa. Krieger executa temas orientais enquanto a letra se desenrola, com Manzarek e Krieger fazendo os papéis do Rei de Pequim e da Rainha de Nova Iorque respectivamente. A canção vira um jazz nova-iorquino em seu final, que tem o nome da mesma repetido por diversas vezes.

Após o lançamento de Full Circle, que ficou na posição 68 na Bllboard, dois singles foram lançados: "The Mosquito" (que ficou na posição 85) e "Get Up And Dance", que não teve uma venda expressiva, e ainda trazia no lado B a rara "Tree Trunk". O The Doors partiu para uma turnê, tendo Conrad efetivado no baixo e ainda Bobby Ray nas guitarras, ao lado de Krieger. Após alguns shows pela europa, com a baixa procura e ainda manifestações dos ardorosos fãs de Morrison, o grupo acabou de vez em 1973, deixando como registro ao vivo uma rara participação no programa Beat Club. 





The Doors - trio remanescente

Manzarek partiu para uma carreira solo, além de formar o grupo Nine City, ao lado de Nigel Harrison (baixo, que faria parte da Blondie posteriormente), Jimmy Hunter (bateria, vocal), Noah James (vocal) e Paul Warren (guitarras), com quem lançou os álbuns Nine City (1977) e Golden Days Diamond Night (1978).


O emocionante álbum póstumo de Morrison
Já Krieger e Densmore formaram o The Butts Band, tendo duas diferentes formações: uma com Phillip Chen (baixo), Roy Davies (teclados) Jess roden (voz) e Mick Weaver (órgão), e outra com Mike Berkowitz (bateria), Alex Richman (teclados, voz), Karl Ruckner (baixo) e Michael Stull (guitarras), além da dupla do The Doors. O grupo registrou os raros The Butts Band (1974) e Hear And Now (1975), cada um com uma formação diferente. Em 1978, o trio reuniu-se mais uma vez, para colocar músicas nos poemas de Morrison, feito este registrado no já citado An American Prayer.




The Doors e Eddie Vedder
 

O tempo passou e em 12 de janeiro de 1993 o trio novamente se reuniu, agora para uma apresentação ao vivo no California Center Plaza Hotel, como participação na homenagem do Rock And Roll Hall of Fame daquele ano, na mesma apresentação em que foram homenageados Cream, Creedence Cleawater Revival e Sly & The Family Stone. Tendo Eddie Vedder nos vocais, o grupo eomocionou aos presentes tocando as clássicas "Roadhouse Blues", "Break On Through" e "Light My Fire". 




DVD com Ian Astbury

Já em 2002, Krieger e Manzarek formaram o The Doors of the 21st Century, com Ian Astbury (The Cult) nos vocais, além de Angelo Barbera (baixo) e Stewart Copeland (The Police) na bateria, excursionando pelos EUA tocando clássicos do The Doors. Esta formação sofreu alterações, e em 2004, com Ty Dennis na bateria, gravou o DVD L. A. Woman Live





Riders On The Storm em Porto Alegre - 2008
 

Brigas na justiça entre Manzarek-Krieger e Densmore fizeram com que a dupla alterasse o nome do grupo, e então, batizados como Riders On The Storm, se apresentaram no Brasil em abril de 2008, tendo na formação Brett Scallions (vocais), Phil Chen (baixo) e Ty Dennis (bateria). O grupo permanece na ativa, fazendo shows agora com o nome de Manzarek-Krieger e tendo Miljenko Matijevic nos vocais. Já Densmore formou o grup TribalJazz, com quem também tem excursionado nos últimos anos.
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