segunda-feira, 8 de julho de 2013

War Room: Arnaldo Baptista - Lóki? [1974]


Por Bruno Marise

Convidados: Adriano "Groucho" KCarão e Mairon Machado

O War Room desse mês presta homenagem para Arnaldo Baptista, que completou sessenta e cinco anos na data de 06 de julho. Um dos maiores gênio da música mundial, ele lançou seu primeiro álbum solo em 1974. Lóki? foi totalmente incompreendido na época, por ser gravado praticamente ao vivo o estúdio, com Arnaldo ao piano tendo a companhia de Dinho Leme (bateria), Liminha (baixo) e Rita Lee (vocais). Hoje, é tido como um dos mais ousados e emocionantes discos da história.

O Consultoria do Rock então segue sua série de postagens em nome de Arnaldo, a qual começou no sábado, com a inclusão da rara faixa "O Suicida" no Consultoria do Rock Apresenta O Rock Nacional dos Anos 60, e seguirá no próximo domingo, com a Discografia Comentada do músico.

Vamos as canções e as impressões de nossos colaboradores sobre Lóki?.


1. Será que eu vou virar bolor?

Bruno: Essa é um clássico. Uma das minhas músicas preferidas de todos os tempos. Abertura com um piano maravilhoso e Arnaldo canta com uma melancolia que chega a doer.

Adriano: Não sou tão conhecedor de Mutantes e de seus membros. Nunca imaginei que a Rita Lee tivesse participado desse disco! Jurava que ele tava cantando essa letra pra ela. Essa música é linda! Adoro Alice Cooper, mas prefiro o Arnaldo dizendo que não gosta. hahaha.

Mairon: Se essa canção fosse somente com voz e piano, já será uma maravilha, mas o conjunto completo dessa obra é um momento de incredulidade jamais ouvido na música nacional. Aranldo Baptista rasgando seu coração para Rita Lee, fazendo uma declaração de amor sofrida, auto-destruindo sua imagem em busca de um perdão por suas atitudes. Um rock simples que se tornou clássico

Bruno: Uma faixa que a princípio parece uma balada tristíssima, desemboca num rocão ala Jerry Lee Lewis
Mairon: Vocês sabem o por que de ele "não gostar de Alice Cooper?"
Bruno: Não, mas sempre tive curiosidade.

Adriano: Sei lá, HOMOFOBIA???

Mairon: Porque a Rita traiu o Arnaldo com o guitarrista do Alice Cooper quando a banda da Tia Alice teve no Brasil pela primeira vez.

Bruno: Orra, está explicado.

Adriano: Putz! Conheço historia parecida com pessoas menos ilustres. hahaha

Mairon: Sonzeira. Adoro os esquecimentos na letra, o sofrimento no final, enfim, canção maravilhosa para nos introduzir a um disco maravilhoso.

Bruno: Arnaldo espanca o piano sem dó, destilando toda sua amargura nas teclas.

Adriano: A que mais ouvi do disco foi essa. Será que o resto do disco mantém o nível? Vamo vendo..

Bruno: Destaque também para a linha de baixo de Liminha.

2. Uma Pessoa Só

Adriano: O que é isso? 14-Bis?

Bruno: Mais uma introdução belíssima ao piano, quase erudita.

Mairon: Durante muitos anos, preferi a versão dessa canção que saiu no álbum O A E O Z, e ainda hoje, prefiro a mesma. Mas mesmo assim, a simplicidade gravada aqui é bela, quase que erudita, e com Arnaldo novamente muito emotivo.

Adriano: Eu conheço essa música no A e o Z. Acho que lá é melhor ...

Mairon: Essa entrada da banda, e as vocalizações do Arnaldo, mostram como o clima no estúdio estava bem tenso. Destaque também para as inserções orquestrais de Rogerio Duprat.

Adriano: Na verdade, acho que já ouvi essa versão algumas vezes também.

Bruno: Gosto como a música mescla piano clássico com frases jazzísticas e psicodelia, tudo num clima extremamente introspectivo e claustrofóbico. Incrível como o estado emocional do Arnaldo reflete nas composições

Mairon: Sua letra trata do momento em que o Mutantes viveu em uma comunidade na Serra da Cantareira, todos por um, como se fossem Uma Pessoa Só.

Adriano: Quase um forró psicodélico, né, Maresia?

Bruno: Sim.

3. Não Estou Nem Aí

Mairon: A primeira a contar com a presença dos vocais de Rita, e com o arranjo de metais de Duprat fazendo presentes. Não gosto muito dessa faixa, acho a mais fraquinha do LP.

Adriano: Estou ouvindo a Rita nessa faixa três.

Mairon: Por outro lado, o talento de Arnaldo ao piano é incontestável. Como ele toca bem!

Bruno: Eu já gosto bastante, principalmente do refrão forte "Não to nem aí pra sorte, não tô nem aí pra morte".

Adriano: Esse piano parece Supertramp!!! (Essa foi pro Gaspari).

Bruno: os metais também são muito bem encaixados.

Adriano: Eu acho legalzinha essa faixa.

4. Vou Me Afundar na Lingerie

Mairon: Linda faixa. Balada dançante, com uma letra confusa e com a participação de Rita novamente nos backing vocals. O andamento jazzístico é o grande destaque.

Adriano: Não sei vocês, mas não estou tentando entender essas letras. Fico só aguardando o Mairon trazer as informações sobre os chifres e surubas...

Bruno: Letra bizarríssima, mas gosto muito da parte instrumental

Mairon: A letra aqui é uma crítica de Arnaldo ao Serginho. Como se dissesse assim: "Não preciso do Mutantes para sobreviver, viva meu irmão com seus pensamentos, que eu irei viver do meu jeito, mas sem você! Eu acho essa letra do caralho

Adriano: Eu sei que o Maresia vai implicar com o que vou dizer, mas uma das vantagens que sempre vejo no rock argentino dessas épocas é o vocal. Primeiro que é em espanhol, então se o cara tiver dizendo alguma tosqueira tipo "xuxu beleza" eu talvez nem vou entender; segundo, que os argentinos cantavam melhor, a meu ver.

5. Honky Tonk (Patrulha do Espaço)

Adriano: OLHEM AS COISAS MELHORANDO!!!

Mairon: Arnaldo exalando virtuosismo ao piano. Genial é pouco para essa peça clássica inspiradíssima em Liszt

Bruno: Toca pouco piano esse rapaz? É a faixa mais progressiva do disco até então, com as influências eruditas aparecendo mais uma vez

Adriano: Aposto que ele tá fazendo uma colagem de vários temas pré-existentes, estilo Keith Emerson, embora eu não consiga nomear nenhum...

Mairon: Tanto que depois, no álbum "Faremos uma Noitada Excelente ...", Arnaldo gravou "Arnaldo Solizta", em homenagem ao músico húngaro.

Adriano: Mistura de erudito com jazz, o segredo pra me conquistar. CASA COMIGO ARNALDO.

Bruno: Isso.

Adriano: Basta lembrar das Rapsódias Húngaras.

Bruno: Liszt é monstro. Gosto demais.

6. Cê Tá Pensando Que Eu Sou Lóki?

Bruno: E de repente vem uma bossa nova.

Mairon: Bossa-Nova tapa-na-cara do Serginho. Arnaldo despeja sua mágoa com o irmão, em frases como "a gente andou, a gente queimou muita coisa por aí, ficamos até mesmo todos juntos reunidos numa pessoa só". Musicalmente pode ser sôfrega, mas liricamente, é genial, e o arranjo de Duprat, para mim, deu um charme todo especial para essa ótima canção.

Bruno: Confesso que nunca parei pra prestar atenção nas letras desse álbum. Sempre fiquei brisando com o instrumental maravilhoso.

Adriano: Pode ser o que for, musicalmente não consigo gostar dessa.. Parece tema do André Abujamra. E, claro, sou totalmente alheio à letra.

Mairon: Em termos de letra, o Arnaldo dava um banho em qualquer um aqui no Brasil (menos o Elomar, esse é top dos tops).

Bruno: Mesmo bossa nova não sendo minha praia, gosto bastante dessa.

Mairon: Ouvir Lóki? sem compreender o significado das letras não é a mesma coisa.

Adriano: Prefiro João Gilberto.

7. Desculpe

Bruno: Rapaz, essa música é de uma agonia desesperadora.

Adriano: Cara, essa música... Me lembra... O quê???

Mairon: Arnaldo volta a pedir perdão para Rita. Uma balada incrível, com Arnaldo praticamente chorando ao microfone. O baixo de Liminha, o hammond em destaque, as intervenções do moog e o andamento quebrado do Dinho fazem desse som uma viagem prog anormal para o disco. Agonizante e LINDA!!

Adriano: Isso é trip-hop!

Bruno: Ia falar o mesmo, Mairon. O Arnaldo chega quase a chorar. Dá pra sentir a tristeza do cara. Música lindíssima!

Adriano: Isso não é um mellotron ou um órgão???

Bruno: Destaco mais uma vez a linha de baixo do Liminha.

Mairon: Na segunda parte da letra ele está realmente chorando, só pode ser!

Bruno: O cara é um baita instrumentista.

Adriano: Ou os dois???

Mairon: É moog e hammond Adriano, e o Liminha está tocando muito. Concordo fortemente contigo Bruno!

Bruno: Se eu não me engano ele toca em um dos discos psicodélicos do Ronnie Von, e as linhas de baixo são de cair o queixo.

8. Navegar de Novo

Mairon: A melhor canção da carreira de Arnaldo. Comentarei depois, agora vou ouvir esse som dos anjos.

Adriano: MPB total essa! Ele tá cantando como a Maria Bethania aquela LIMDA.

Bruno: Mais uma canção de chorar. Piano e voz com Arnaldo entregando uma interpretação inacreditável de tão doída.

Adriano: Mas o acompanhamento é lindo, bem peculiar..

Bruno: "Por que não ter esperança num Brasil que ainda é criança e que um dia, eu espero, ainda vai se abrir, conquistar o espaço (...)" fiquei arrepiado com esse trecho.

Mairon: "Navegar de Novo" é o início da fase Singin Alone de Arnaldo, e como canta. Emoção exalada por cada sílaba de uma letra-manifesto de fazer chorar. Cinco minutos e trinta segundos agonizantes, só com voz e piano, e este piano, não é só um piano, é um arranjo arrepiante.

Adriano: Seu ufanista.

Mairon: A letra é belíssima.

Bruno: O falsete do Arnaldo também lembra o Ney Matogrosso em alguns momentos.

Adriano: O que ele disse no final? cri cri?

Mairon: Incrível é o que ele diz

Bruno: Isso. Como é bom reouvir esse disco.

9. Te Amo Podes Crer

Mairon: Mais uma canção pedindo perdão para Rita. O começo alone, ao piano, nos leva para uma tímida viagem prog, com a participação do moog fazendo o solo central. E como o piano brilha junto do baixo. Que canção! E bota choradeira para a Rita ...

Bruno: Imaginei que fosse mais uma canção pra Rita

Adriano: Reparem que as letras soam autobiográficas. Jamais ouvi isso em disco algum. Depois vem me dizer que Beatles é que era genial! O uso do moog acompanhando lembra mais bandas mais recentes de prog. Na época, os clássicos acho que usavam o moog mais pra solos.

10. É Fácil

Adriano: Eita. Bluegrass!

Bruno: Isso é violão mesmo?

Mairon: Arnaldo aqui demonstra seu talento e virtuosismo ao violão. Além de exímio pianista, ele capricha em um complicado solo no violão de doze cordas, e ainda nos deixa uma pulga na orelha com uma frase bem simples: "Eu me amo, como eu amo você?". E daí vem a resposta. "É Fácil!". Um tapaço na carinha magra da Rita, e pronto, encerra-se o disco mais amargo que o rock nacional já ouviu.

Bruno: Depois de um álbum todo calcado no piano, temos uma performance impecável de Arnaldo no violão de 12 cordas

Adriano: Ouçam o disco de 73 do Tanguito e verão que a Argentina não ficava atrás, amigos.

Bruno: Canção que encerra de forma bruta o disco

Adriano: Mas realmente essa faixa final encerrou MUITO BEM o disco! Genial!

Mairon: Para se comparar Adriano, ouça Artaud, do Pescado rabioso.

Adriano: ARTAUD DE CÚ É ROLA! Artaud acho menos autobiográfico e menos louco que o Tango, do Tanguito.

Considerações Finais

Mairon: Um disco único no Brasil, quiçá no mundo. Arnaldo mostrando que mesmo sem o Mutantes, ele podia sobreviver. Uma pena que poucos entenderam Lóki?, e Arnaldo caiu na obscuridade. Mesmo a criação do Patrulha do Espaço anos depois não ajudou ele a reerguer sua carreira, culminando com a tragédia do hospício posteriormente. Enfim, ouvir Lóki! é ter a certeza de que pelo menos uma vez o Brasil esteve na frente dos demais países em termos de música.

Adriano: Bem, como disse no início, não sou tão conhecedor de Mutantes e de seus membros em carreira-solo como poderia - e como deveria, já que fui fã de Mutantes na adolescência. O disco me parece bom, mas entender as letras e conhecer a história do Arnaldo certamente traria novas luzes sobre as músicas.

Bruno: Loki? está entre os meus cinco discos nacionais preferidos. Foi bom reouvir essa obra-prima maravilhosa novamente e prestar atenção em alguns detalhes que eu já nem lembrava mais. Além de uma performance impecável de Arnaldo tanto nas letras quanto ao piano e na interpretação, é impressionante ver o quanto o estado emocional de uma pessoa pode influenciar em sua obra. É um dos exemplos em que podemos sentir a tristeza e desespero do sujeito exalando pelos sulcos do vinil. Pouco tempo depois Arnaldo sofreria de seu colapso psicológico, do qual tem sequelas até hoje. Loki? é o registro do artista em seu limite de sanidade. Um disco lindíssimo e que chega arrepiar de tão inacreditavelmente bom.

Adriano: Qualquer disco inspirado em um par de chifres tem de trazer no mínimo um clássico, como é o caso de "Será que Eu Vou Virar Bolor?".

Mairon: Beleza pessoal, valeu pela companhia na audição desse disco. Obrigado Bruno pela escolha, e até a próxima

Bruno: Valeu!

Adriano: VALEU!

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