quinta-feira, 5 de dezembro de 2013

Maravilhas do Mundo Prog: Yes - Close to the Edge [1972]



1972, o ano da mudança. A geração flower-power despedia-se, através do último álbum dos californianos do Jefferson Airplane, o essencial Long John Silver. David Bowie assassinava Ziggy e o Glam Rock em pleno palco, e o Wishbone Ash fazia surgir uma geração de seguidores com o exemplar Argus, que influenciou nomes como Iron Maiden anos depois. O Pink Floyd havia acabado de apresentar-se em Pompeia, acabando também com uma era de psicodelia londrina, e o Krautrock mergulhava para uma nova direção, através do Kraftwerk e seu experimental Kraftwerk 2.

Nesse fervor de ideias, o rock progressivo crescia ardentemente ao mundo. O já citado Pink Floyd começava suas experimentações que levaram à Dark Side of the Moon, Emerson Lake & Palmer lançou Trilogy, Gentle Giant a dupla Three Friends / Octopus, Ian Anderson dizia ao mundo que o Jethro Tull não era progressivo com Thick as a Brick, e tantas outras formações clássicas consolidavam o rock progressivo como O ESTILO a ser cultuado nas casas, bares e arenas. Mas o Yes faria mais, lançando Close to the Edge.

Esse incrível LP foi eleito pelos Consultores aqui do site como o Melhor Álbum de 1972, e teve sua história contada por mim ano passado, quando completou quarenta anos. Os caminhos trilhados pelo genial quinteto, formado na época por Jon Anderson (vocais, flautas, percussão), Steve Howe (guitarra, violão, voz, steel guitar, Danelectro Sitar), Chris Squire (baixo, vocais, harmônica), Bill Bruford (bateria, percussão) e Rick Wakeman (teclados) havia começado um ano antes, com Fragile, um disco marcante, tendo como destaque a Maravilhosa "Heart of the Sunrise".
Steve Howe, Chris Squire, Bill Bruford, Jon Anderson e Rick Wakeman, durante as gravações de Close to the Edge

Registrando apenas três longas canções, o maior destaque fica por conta da ambiciosa faixa-título. Divida em quatro movimentos, "Close to the Edge" ocupa todo o lado A do vinil, e foi concebida naqueles raros momentos da história da humanidade. "Quando começamos a gravar, começamos com um pedaço de uma música, a qual foi desenvolvendo-se de tal forma que não conseguíamos imaginar como seria o seu fim" falou Bill Bruford anos depois sobre as gravações da canção, que exigiu uma quantidade enorme de trabalho nos estúdios da Advision, entre abril e junho de 1972, gravando diversas partes que acabaram sendo mixadas em um complexo processo de edição de fitas master, trabalho do brilhante produtor Eddie Offord.

A ajuda de Offord foi essencial para que o produto final apresentado ao grande público pudesse ser absorvido e admirado com todo o esplendor de sua grandeza, enaltecida pela genialidade que é a suíte. O produtor, que havia mudado o som do Yes a partir de Fragile, conseguiu traduzir e condensar a nata das estupefantes criações do quinteto. A letra, escrita por Anderson, foi inspirada no livro Siddharta, de Herman Heese, que narra as viagens espirituais do auto-descobrimento, um momento marcante para Anderson e para o Yes, pois ali eles começaram a viver uma fase vegetariana, além de inspirações em religiões orientais.
Chris Squire

"The Solid Time of Change", a abertura de "Close to the Edge", aparece nas caixas de som trazendo barulhos de água e pássaros, com um crescendo dos teclados de Wakeman, estourando no longo solo de Steve Howe. Durante os próximos três minutos, acontece muita coisa para um ouvido despreparado conseguir captar, mas com o passar das audições, o ouvido fica treinado para admirar-se das incríveis linhas de baixo feitas por Squire, em um subir e descer de escalas com uma velocidade incrível, solando em um mundo a parte que por vezes encontra um alucinado Howe fazendo diabruras com a guitarra, mostrando como encaixar notas rápidas sem soar exibicionista.

Falarei de Howe daqui há pouco, já que ele é o homem principal nesse trecho da canção, que também possui uma participação importante de Wakeman, martelando os teclados com notas muito velozes, as quais parecem ter saído de uma programação feita por um computador, tamanha a perfeição da sequência de escalas. E Bruford? O que esse gigante da bateria faz durante todo o solo é sobrenatural. A marcação inventada pelo baterista privilegia apenas leves toques no bumbo, uma agitada batida nos pratos e, quando seu cérebro permite, batidas na caixa e viradas esquisitas, impossíveis de serem reproduzidas ao vivo.

Voltando para Howe, simplesmente o guitarrista destrói. Para muitos, esse é o melhor solo de sua carreira, o que de fato, não deixa de ser correto. Howe inicia seu solo subindo e descendo escalas utilizando de uma série de arpejos, acompanhado apenas por baixo e bateria. A série repete-se duas vezes, e com breve série de arpejos, entra os teclados de Wakeman para Howe soltar seus dedos, abusando de escalas jazzísticas e misturando melodia em velocidade por inúmeras vezes, criando um solo mágico, interrompido brevemente por vocalizações feitas por Anderson.
Steve Howe

O baixo acompanha Howe em um pequeno trecho pós-vocalizações, que surgem novamente para levar Howe ao final de seu solo com uma série de acordes de jazz e notas ainda mais veloz, encerrando magistralmente com bends afiados, dilacerando o cérebro, até chegar na sequência de notas entre baixo, bateria e guitarra, trazendo as vocalizações do trio.

A clássica melodia da guitarra então aparece, repetida por quatro vezes e acompanhada pelos teclados e o leve acompanhamento de baixo e bateria, para então surgir a letra dessa Maravilha, cantada ao mesmo tempo por Squire e Anderson, enquanto Howe debulha sua Danelectro Sitar, Wakeman alterna acordes e Bruford inventa um novo jeito de tocar bateria. Duas estrofes e somos apresentados pela primeira vez ao momento principal da letra de "Close to the Edge", a sequência "Down at the Edge, round by the corner, ... close to the edge, down by the river".

O ritmo muda, tornando-se mais alegre do que a tensa sessão inicial, permitindo que Anderson abrilhante a canção com sua voz, cada vez mais melodiosa e perfeita, logo após um breve solo de Howe. A marcação de Wakeman parece um código morse, e bateria e guitarra fazem o ritmo para Anderson desfilar sua voz, ao mesmo tempo que Squire acompanha atravessando escalas, em um mundo a parte.

Anderson canta sobre a fuga do homem em busca de um futuro, livrando-se dos pensamentos e do seu passado, e nos apresenta outra importante frase de "Close to the Edge", no caso "I get up, I get down", que encerra "The Solid Time of Change" e nos leva para a segunda parte da suíte.
Jon Anderson

"Total Mass Retain" retoma a tensão do início da letra de "The Solid Time of Change", só que tendo ritmo totalmente quebrado por baixo e bateria, além de intervenções dos teclados. Anderson canta agressivamente e sozinho, mostrando que o homem está prestes a encontrar-se com o bem eterno, e lamentando a vida daqueles que não buscam pelo mesmo, e após duas estrofes, voltamos a sequência "Down at the edge, close by a river, close to the edge, round by the corner", com mais intervenções dos teclados para as frases citadas.

O ritmo alegre aparece novamente, e Anderson exalta que os problemas não podem prejudicar sua vida, sempre com a harmonia para cima do ritmo da Danelectro Sitar e as batidas de Bruford, e então, o refrão surge novamente, cantado por todos, encerrando a letra de "Total Mass Retain" com o "I get up, I get down", trazendo uma pequena vinheta instrumental, na qual o Danelectro se sobressai com uma série de escalas, feitas ao mesmo tempo com o baixo e permitindo que Wakeman execute um breve tema no órgão.
A letra dos quatro movimentos de "Close to the Edge"

Mergulhamos então no viajante tema de "I Get Up, I Get Down", um dos momentos mais belos da música mundial, apenas com os teclados executando longos acordes, Howe pisando o pedal de volume com uma suavidade angelical, e Squire colocando distorção em seu baixo, mas sem agredir a espetacular experiência sonora propiciada pelo Yes. Entre os instrumentos, barulhos de gotas serpenteiam a canção, e levemente, dois acordes de teclados vão crescendo seu volume, trazendo as vozes de Squire e Howe na caixa direita, cantando um pequeno trecho da canção, enquanto na caixa esquerda, Anderson canta o nome do trecho da canção.

Anderson agora fica sozinho, falando sobre as pessoas insatisfeitas, as mulheres que observam a mulher chorando, e as enganações diárias da sociedade. Então, as vozes de Howe e Squire sobrepõem-se com a de Anderson, em um magnífico arranjo vocal, sempre acompanhados pelos acordes de Wakeman e uma espacial sessão instrumental ao fundo.

Após o nome do trecho ser exalado por Anderson, um majestoso momento somente com o órgão mostra como Wakeman era capaz de encantar audiências com notas tão sutis, e retornamos então para o ritmo dos dois acordes, para Anderson mais uma vez espalhar ao mundo o nome do trecho de "Close to the Edge", e de novo, Wakeman solar com o órgão de igreja, encerrando esse magistral momento do rock progressivo com uma veloz subida de escalas no moog e no órgão.
Rick Wakeman

Um longo acorde inicia "Seasons of Man", o mais perturbador movimento de "Close to the Edge", com um ritmo insano feito pela marcação no chimbal e bumbo, enquanto Squire pisoteia o wah-wah e Howe e Wakeman repetem os mesmos acordes, ao mesmo tempo, criando um tema especial, que nos leva ao imponente solo de Wakeman nos teclados, comprovando mais uma vez como o jovem músico (na época com apenas vinte e dois anos) sabia tocar com a mesma qualidade qualquer tipo de teclado.

As notas de Wakeman facilmente são capazes de levar o ouvinte as lágrimas, tão o fascínio causado pelas mesmas. Velozes e melódicas, elas invadem o cérebro com muita facilidade, e voltamos então aos vocais de Squire, Howe e Anderson, cantando as últimas estrofes da suíte, quando o homem finalmente descobre seu caminho para a luz eterna, misturando os dois principais ritmos de "The Solid Time of Change", e sabiamente, encerrando com a série "I get up, I get down", após um belíssimo crescendo instrumental e vocal, permitindo apenas que os barulhos de pássaros e rio concluam uma obra-prima, como o ciclo natural pelo qual todos passamos de estar por cima, por baixo, mas sempre buscando o bem, o melhor, e que é pregado nessa Maravilhosa canção.
Bill Bruford

O famoso logo do Yes, criado por Roger Dean
O LP ainda conta com mais duas obras-primas, "And You And I", e "Siberian Khatru", ambas distintas entre si, com a primeira explorando bastante o lado acústico e orquestral do Yes, enquanto a segunda é uma paulada fulminante estabelecida pelos riffs e acordes de Steve Howe, que consagrava-se cada vez mais como o principal guitarrista do rock progressivo. 

É a partir daqui que o logo do Yes, desenvolvido por Roger Dean, virou marca registrada do grupo, sendo abandonado apenas no retorno do grupo durante os anos 80.

Close to the Edge atingiu a terceira posição nos Estados Unidos, e foi quarto no Reino Unido. No auge da carreira, quando parecia que o Yes era uma banda imbatível, eis que Bruford anuncia sua saída do Yes, por divergências musicais. O fato pega todos de surpresa, e mais surpreendente ainda é a escolha do substituto de Bruford, o baterista da Plastic Ono band, Alan White. 

A estreia de White ocorre no ano seguinte, com Tales from Topographic Oceans, um dos discos mais amados e odiados pela imprensa e fãs, e detentor de quatro Maravilhosas suítes, das quais, com muita dificuldade, selecionei apenas uma delas para narrar sua história na semana que vem, no caso, "The Revealing Science Of God (Dance of the Dawn)".

3 comentários:

  1. A primeira vez que ouvi essa música só consegui prestar atenção no baixo do Chris Squire. As linhas de baixo dele nessa música são hipnóticas principalmente na segunda parte onde o baixo e a bateria fazem uma "cozinha" sensacional. E ainda tem um belo solo do Rick Wakeman, que eu considero top 5 de melhores solos de teclados da história do rock. "Close to the Edge" (o álbum), na minha opnião, só fica atrás do "Tales from Topographic Oceans" na lista de melhores albuns do Yes.

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  2. Concordo Axl. TFTO é o melhor disco do Yes, com CTTE em segundo. Obrigado pelo comentário. Abraços

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  3. A verdade é que CTTE não é o melhor disco do Yes, é o mais superestimado de sua discografia. Por isso que hoje em dia não vejo mais tanta graça neste quinto álbum deles.

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